A oposição política é condição fundamental numa Democracia madura.
Democracia essa que não sobrevive sem debate, sem contraponto político. O confronto de ideias, mais do que alimento democrático, é indispensável num quadro de apresentação de políticas alternativas junto dos cidadãos. Neste contexto, e considerando os quatro anos de liderança de Rui Rio como líder do PSD (maior partido português e principal partido da oposição), a possibilidade de renovar novo mandato não será apenas mau para o partido e para o país. Será essencialmente mau para a vitalidade da Democracia Portuguesa.
E é com base neste dilema que escrevo o presente artigo.
A deriva ideológica
Em 2015, por força do mau perder de António Costa e dos seus companheiros de route à esquerda, o espectro político mudou em Portugal.
O então derrotado e humilhado Secretário-geral do PS – por uma questão de sobrevivência política, acompanhada pela saciedade da extrema esquerda em inviabilizar um governo de direita – não derrubou o tal “muro ideológico”, como gosta de justificar. Apenas saltou para um dos lados do muro, trazendo partidos extremistas (contra a União Europeia e contra a NATO) para o arco da governação com a constituição da Geringonça.
E o que é Rui Rio faz quando assume a liderança do PSD em 2018? Vem afirmar que o PSD não é um partido de direita, mas de centro, ou centro/esquerda…. Ou seja, ao invés de o PSD se apresentar como alternativa à maioria de esquerda, procura disputar o mesmo espaço ideológico do PS, quando este havia acordado com radicais de esquerda outro rumo para o país. Música para os ouvidos de António Costa.
Não admira que nas últimas legislativas, 2 anos após a constituição do Iniciativa Liberal e no mesmo ano em que se fundou o CHEGA, estes partidos tenham ganho assento parlamentar. O tribalismo identitário promovido pelo Bloco de Esquerda em questões como o racismo e a igualdade de género e um modelo económico assente no consumo, fomentaram o abrir de portas para o espectro político não socialista abandonado pelo PSD de Rio.
A errática estratégia do desgaste
A estratégia de Rio nunca passou por oposição ao Socialismo de António Costa, como adiante se constatará. Apenas esperou que o governo cedesse por desgaste, caindo-lhe o poder nas mãos. Exige-se mais a um líder da oposição!
Exige-se mais a um líder da oposição quando o país caminha a passos largos para a condição de mais pobre da União Europeia, com visível degradação do Estado Social e das suas instituições públicas. Por duas razões essenciais:
- Quanto mais tempo o Partido Socialista se mantiver no poder, mais difícil será recuperar o país;
- O vazio da oposição deixada pelo PSD será naturalmente ocupado por partidos extremistas. É o que se verifica por essa Europa fora.
2015 / 2019 – uma legislatura perdida
O revanchismo da Geringonça não acabou com a reversão das medidas aplicadas pelo anterior governo, com vista ao cumprimento do acordo estabelecido entre o PS e os partidos radicais de esquerda.
Para além do fraco crescimento económico e maior carga fiscal de sempre – perante quatro anos de conjuntura financeira estável – outro dos legados da geringonça tem sido a manifesta divisão social que o tribalismo identitário levado a cabo pelo Bloco de Esquerda fomentou junto dos portugueses, em questões como racismo e a identidade de género.
A tensão social provocada tem sido danosa para a paz social até então estabelecida. São feridas que ainda se encontram por sarar numa sociedade sempre tida por tolerante, onde a unidade assenta na diversidade multiétnica e cultural que hoje nos identifica como um povo, com mais de 900 anos de história.
A montante, polémicas como o nepotismo do governo PS, Pedrógão, Tancos, Borba e um sem número de outros escândalos iam marcando a legislatura da Geringonça, sem oposição política.
No essencial – no que toca à melhoria da qualidade de vida dos portugueses – atente-se para a degradação do Estado Social nos últimos seis anos, essa grande bandeira que as esquerdas tanto gostam de reivindicar como seu património. Mais de 400 médicos abandonaram o SNS durante o presente ano e será necessária a contratação de mais de 30 mil professores até 2030. A pandemia não pode servir de desculpa para tudo.
PSD de mãos dadas com o PS
No início do presente ano a conceituada revista The Economist dava a conhecer a qualidade da Democracia no Mundo. Dois factores foram sublinhados pela queda do nosso país na categorização: o fim dos debates quinzenais com o primeiro-ministro no Parlamento e “a falta de transparência no processo de nomeação do presidente do Tribunal de Contas”. Em ambas as medidas, o aval do PSD.
Rui Rio chegou mesmo a afirmar que o Primeiro-ministro precisava de tempo para trabalhar, justificando assim a posição do partido para o fim dos debates quinzenais… Caro Rui Rio, é também trabalho do Primeiro-ministro prestar contas ao país junto da Assembleia da República.
Por outro lado, Rio não se opôs ao fim do mandato de Joana Marques Vidal – antiga Procuradora Geral da República que ganhou enorme reputação junto da opinião pública ao levar à barra da Justiça nomes poderosos conectados com o mundo da banca, política, mundo empresarial e do futebol.
Um perdedor nato
Não admira que desde a sua liderança o PSD tenha perdido as eleições regionais nos Açores, a maioria absoluta na Madeira, as Europeias em 2019, bem como as legislativas (onde o PSD teve o pior resultado de sempre) e as recentes autárquicas de 26 de setembro. Evidenciar ganhos como em Lisboa ou Coimbra carece de uma análise objectiva sobre o que realmente se sucedeu nestes concelhos.
No caso de Lisboa, o facto político é que em bom rigor foi Medina quem perdeu as eleições (teve menos 25 mil votos quando comparado com 2017). A coligação Novos Tempos teve apenas mais 3 mil votos. Não pretendo com isto desvalorizar a vitória de Carlos Moedas.
Tem o mérito de ter saído da sua zona de conforto e disponibilizado para combate político, justamente contra o delfim de António Costa e, na altura, seu putativo sucessor. Caso para se dizer: “A sorte protege os audazes”.
Ausência de alternativa pragmática a Costa e ao Socialismo
Hoje, ao fim de 6 anos de geringonça, paira o espectro de que a corrupção se encontra instalada em todos os organismos do Estado. Os portugueses têm sucessivamente perdido a confiança nas suas diversas instituições. Umas por desleixo – dada a partidarização socialista (junto dos aparelhos do Estado), outras por forte pressão ideológica do Bloco como é o caso das forças de segurança. As polémicas com as Forças Armadas, a extinção do SEF e a enorme coerção ideológica sobre a PSP são disso bons exemplos.
Em 4 anos de liderança de Rio o PSD não logrou nenhuma medida, nenhum chavão, nenhum cavalo de batalha que resultasse como imagem de marca de partido. Rui Rio nunca foi capaz de se desmarcar destes permanentes ataques às instituições, deixando o alimento político para o CHEGA.
Pouca legitimidade de Rio sobre a lealdade de Rangel
Os militantes do PSD sabem por onde andou Rui Rio quando no momento mais crítico da nossa jovem Democracia, com o PSD a governar o país em colete-de-forças – por força da bancarrota do governo de Sócrates -, este decidiu juntar-se em eventos promovidos pela esquerda contra Passos Coelho e seu governo. Na vida, como na política, é nos momentos de maior adversidade que o carácter de cada um vem ao de cima.
Promotor da Direita radical
Quando Rui Rio acedeu ao acordo com o CHEGA nos Açores, escancarou as portas do partido de André Ventura ao arco do poder. Tal como António Costa em 2015, Rio revelou-se pouco hábil politicamente. Bastava deixar nas mãos do CHEGA a decisão de viabilizar, ou não, um governo do PSD.
Fim de ciclo
Com a carga fiscal mais alta de sempre, fraco crescimento económico, degradação do Estado Social e das instituições públicas, para além de um sentimento generalizado do aumento da corrupção, é por demais evidente que a opção Geringonça não se revelou como alternativa para um Portugal próspero que os portugueses ambicionam. Foram os partidos de esquerda a chumbar o último Orçamento apresentado pelo PS. Ou, quando a realidade do país supera as ficções ideológicas partidárias.
Mesmo assim, Rui Rio ainda não se terá evidenciado que o PS de Antonio Costa não tem qualquer interesse na promoção de reformas estruturais e estruturantes que o país precisa. A ambição de Costa, desde 2015, é ser poder, nada mais. Seja com a esquerda, seja com a direita. Costa, enquanto houver dinheiro, não tem o mínimo interesse em reformas que ponham em causa a administração de poder do PS, enquanto “dono” do erário público, conforme afirmou Edite Estrela.
Este PSD de Rio limita-se a ser abono de família para o PS, CHEGA e Iniciativa Liberal, ao deixar de cumprir a sua missão reformista para o país, inscrito na sua matriz identitária.
Rui Rio manter-se como líder do PSD será mau para o partido, para o país e, acima de tudo, para a vitalidade da Democracia Portuguesa.
É tempo de o PSD assumir a sua missão identitária, enquanto partido reformista, de esperança, para Portugal e os portugueses.