Como os demais 49 deputados, a renúncia a 5% do meu salário, que desejo permanente, em benefício dos mais desfavorecidos resultou num dos mais importantes confortos morais e cívicos da minha consciência de estar na vida política, ou tão-só na vida, pela graça de fazer parte de um movimento social e histórico único, o «Chega!». Quem quiser arrancar este sentimento da minha alma, quem me rotular de «populista» por causa do meu ato consciente e voluntário, é um ser humano abjeto. Sei que a lista de tais sujeitos vai longa, basta consultar a comunicação social, porém espero deles atos de contrição, arrependimento, respeito mínimo pelo ser humano a começar pelos que mais sofrem e a terminar neles mesmos.

O que assistimos em Portugal desde sexta-feira, 29 de novembro de 2024, ultrapassa o ódio primário habitual aos deputados, militantes, votantes, simpatizantes do Chega. Fez sair do armário uma orgia pública de ódio visceral à moral humana.

Num país empobrecido pelo Estado, a discussão sobre a renúncia do Grupo Parlamentar do Chega deveria ser enquadrada num contexto de (quase) rotura da cultura cívica, e da consequente obrigação de todos os deputados, sem exceções, enfrentarem essa crise pelo seu exemplo. Para desfazer eventuais dúvidas, recomendo a visita a instituições que acolhem pessoas portadoras de deficiência, aquartelamentos de bombeiros, lares de idosos, serviços de proteção da natureza, entre outros. Esse tipo de instituições, e os seus profissionais, não se limitam a prestar serviços aos cidadãos como os demais serviços. Representam a agregação institucionalizada do que, enquanto sociedade, entendemos por moral social, pelo dever de cuidar dos vulneráveis, desprotegidos, desfavorecidos.

Ainda que me limitasse a pessoas com rendimentos mensais iguais ou superiores aos dos deputados, há interrogações morais que perturbam. Qual a percentagem de pessoas de cada comunidade ou concelho que, para citar um exemplo objetivo, é sócia da corporação de bombeiros que serve a sua área de residência? É seguramente ínfima. Qual o valor monetário mínimo das quotas exigidas? É seguramente (bem) inferior ao que habitualmente gastamos num único café diário, num país onde as zonas de restauração, praias e demais lazer não andam propriamente vazias.

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Após meio século de estatização mental dos indivíduos, o que resta à casta privilegiada dona do regime – políticos, jornalistas, comentadores, académicos, artistas e as restantes classes médias e altas que os suportam – será a agitação histérica permanente, iniciada logo na sexta-feira, para silenciar o assunto ou, no mínimo, desviá-lo do coração do problema, a crise profunda da autorresponsabilidade cívica de cada cidadão, em qualquer dos casos tentando impor à opinião pública que tudo se esgote na diabolização do Chega.

O motivo é cristalino. A casta dona do regime coage há décadas os portugueses comuns para que fixem a sua sensibilidade social em causas progressistas-globalistas. O ideal de consciência social e de autorresponsabilidade cívica foi compulsivamente afunilado, pela esquerda e direita fofinha, na defesa das minorias raciais e étnicas, causas dos imigrantes ilegais, comunidades LGBT, ativismos climáticos, sacralização dos animais para além do seu tratamento digno, entre outras distopias do género. Fora de tal cardápio, a sensibilidade dos cidadãos ao resto da vida social foi severamente castrada. O impacto na cultura cívica do último meio século é desastroso.

Daí que ali ao lado, na vizinhança de todos nós, se tornou moralmente «invisível» e, por isso, crescente a situação degradante da instituição que acolhe pessoas com deficiência, do lar de idosos, do quartel de bombeiros, entre outras instituições que garantem a viabilidade da vida coletiva. Essas instituições lamentam o desaparecimento dos beneméritos locais nas décadas recentes. Não é um problema financeiro, é um problema cultural politicamente instigado.

A renúncia de 5% do salário pelos 50 deputados do Chega surgiu como uma epifania capaz de despertar a genuína e secular sensibilidade social e autorresponsabilidade cívica dos portugueses. É uma pedrada moral que caiu de surpresa no pântano do regime, o Plenário da Assembleia da República, com o país a ver e ouvir em direto e a cores. Como afirma o político que cumpre como nenhum outro os seus deveres morais, sociais e cívicos, por isso o mais martirizado pela casta apodrecida dona do regime, vivemos num mundo ao contrário. André Ventura tem razão. Felizmente nem ele desiste de suportar a sua cruz, nem os portugueses comuns são estúpidos.