Em livrinho recente, o teólogo espanhol Luis Santamaria del Rio calcula que a pertença dos portugueses a seitas religiosas ronda os dois por cento, valor que é o dobro da média europeia. Ainda assim, a estimativa é baixa. Com certeza o dr. del Rio não considerou os membros das seitas “climáticas”, por aqui chamados de “activistas” para disfarçar e confundir teólogos estrangeiros. Se a semana que passou serve de amostra, eu diria que uns dez por cento dos portugueses frequentam cultos do género. O número deve subir para trinta por cento se considerarmos apenas os jovens.

Vamos aos factos. Num dia, os “activistas”, jovens e portugueses, invadiram uma conferência em que participava o ministro do Ambiente e pintaram o homem de verde. No dia seguinte, os “activistas”, portugueses e jovens, invadiram uma conferência sobre aviação na FIL e pintaram as portas de vermelho. Por fim, saiu a notícia de que seis “activistas”, naturalmente jovens e naturalmente portugueses, rumaram de bicicleta (estou a brincar: foram de comboio) a Estrasburgo, de modo a comparecer ao julgamento, no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, de uma queixa que haviam apresentado em 2020 contra 32 países da União Europeia. A queixa versa a “inacção” em matéria de “emergência climática” e os queixosos tinham, à data do início do processo, entre 8 e 21 anos.

A conclusão imediata a tirar é que, por cá, as manifestações ambientais não incluem cola. Por escassez de acervo digno, e o receio de andar durante meses com uma obra de Cabrita Reis agarrada às mãos, os nossos “activistas” evitam a adesão (digamos) a peças artísticas que faz furor lá fora.

A segunda conclusão é a de que os níveis de abandono escolar, ou pelo menos de absentismo, são preocupantes. Embora as aulas já tenham começado, constata-se que incontáveis meninos e meninas as trocam pela participação em números de circo. No meu tempo, faltávamos para conversar no café, actividade que, admito, não oferece tantas saídas profissionais. Agora, inspirados nos exemplos da pequena Greta e do pequeno Guterres, os jovens que não auguram futuro ao planeta ambicionam um futuro risonho em carreiras devotadas a não augurar futuro ao planeta. Ao que parece, emporcalhar lugares e pessoas enquanto se gritam slogans apocalípticos tornou-se uma espécie de ofício, para cúmulo um ofício que se pode desempenhar a partir de casa, naturalmente a dos pais. Se os jovens qualificados se sentem forçados a deixar o país, os jovens desqualificados lá arranjam maneira de ficar, excepto por ocasionais – e breves – viagens de trabalho a Estrasburgo.

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O problema não é geracional. Se é, a geração responsável é a dos progenitores dos jovens em questão, que assistem nos “media” às proezas dos filhotes e, suspeito, não os presenteiam com um arraial de pancada no regresso ao lar. Quando eu fugia às aulas em prol do café e da malandrice em geral, convinha manter o meu pai na ignorância: explicar-lhe que as minhas baldas decorriam de aflições com o ecossistema não teria mitigado a sova. Pelo contrário, o “argumento” só o convenceria de que, além de preguiçoso, o filho não regulava bem. Agora os jovens largam a escola para desfilar nas televisões, assaz orgulhosos por pintarem o que calha com uma demão tosca e sem primário. E aposto que os papás, enternecidos com a evidência de distúrbios psiquiátricos ou de uma enorme lata, gravam as imagens para rever em sucessivos jantares de família.

A propósito de distúrbios psiquiátricos, é importante notar que são os referidos jovens a confessar padecerem de “ansiedade climática”. Alguns fazem-no porque viram no Tik-Tok e acharam giro. Mas haverá quem leve a sério os alertas de que o mundo acabará anteontem. Aliás, logo após o cabelo azul e a argola no nariz, o principal critério de admissão numa seita milenarista é a propensão para engolir patranhas: os seguidores de Jim Jones, David Koresh ou Charles Manson não se distinguiam pelo cepticismo nato. Nem os fiéis do genro do dr. Louçã, cujo nome não recordo e que é o guru que o templo da Climáximo foi capaz de engendrar.

A verdade é que, na ausência de orientação paternal e de acordo com o grau de inimputabilidade, o “activismo” que incomoda terceiros devia merecer cadeia ou acompanhamento clínico. Por azar, recebe antena prolongada a meio dos telejornais, momento aproveitado pelos jovens para reclamar com urgência “a abolição dos fósseis” e pelos oportunistas para lhes aplaudir a “coragem” e a “dedicação” a uma “causa”. A coragem justificava-se se os seus actos tivessem consequências penais. A dedicação a infantilidades confunde-se com o ócio. E entrar em histeria a pretexto de desastres inventados ou hipotéticos não constitui a defesa de uma causa. Muito mais legítimo seria os contribuintes cobrirem governantes com alcatrão e penas para protestar o preço dos combustíveis, que ao invés dos cataclismos ecológicos é comprovável.

Brincadeiras à parte, consciente ou alucinadamente o “activismo” do clima possui objectivos claros: combater o capitalismo e instituir um retrocesso civilizacional sem precedentes. Todas as seitas têm as suas manias e, se contrariadas com firmeza, costumam acabar mal. A novidade é que desta vez o Ocidente em peso decidiu alimentar os delírios destes peculiares cultos e “compreender” os apelos ao atraso de vida. Ou seja, quem promete acabar mal somos nós.