Ilusionista, segundo o dicionário online da Porto Editora (infopédia), será “aquele que faz habilidades e truques por meio de movimentos ágeis que levam o espectador a acreditar em algo que não corresponde à realidade”.
Assim sendo, somos todos ilusionistas: ao termos aprendido a viver em democracia, logo beneficiámos das suas inultrapassáveis e incomparáveis vantagens, mas também imediatamente aprendemos a usá-la com ilusivos movimentos ágeis. Brandindo habilmente os resultados eleitorais, quaisquer que sejam, como uma varinha de condão, num sublime passe de mágica, levamos os outros e nós próprios, a acreditar que os vencedores ganharam as eleições com a percentagem que nos salta da cartola.
Vejamos, por exemplo, as últimas eleições: Marcelo Rebelo de Sousa ganhou as eleições presidenciais de 2021 com 60,70% dos votos. Ao ocultarmos rapidamente de que se tratam dos votos validamente expressos, deixamos de fora do campo de visão dos espectadores, no fundo da cartola, todos os que não votaram (a abstenção) ou votaram branco e nulo. Ora, os tais 60,70% dos votos, não fosse a prestidigitação brandida pela nossa varinha mágica, representaram, na realidade, apenas 23,33% do universo eleitoral (2.534.745 votos num universo de 10.864.327 eleitores inscritos)!(1) Com o mesmo truque, tirámos da cartola uns 41,37% para o PS, nas últimas legislativas. Não fosse a ilusão do rápido passe de magia, teríamos visto que isso representou apenas 21,27% do universo eleitoral (2.301.887 votos entre 10.820.337 inscritos). E os 27,67% do PSD foram, na realidade, 14,22% do universo eleitoral! (2) E por aí adiante. Ficaram de fora os mal inscritos e aqui não considerados, é certo, mas também todos os que não puderam votar ou optaram legitimamente por não o fazer e, de capital importância, aqueles que protestaram legitimamente por via do voto em branco ou nulo.
Como num passe de magia, fizemos desaparecer metade dos portugueses que não votaram validamente, assim levando os espectadores do nosso palco de ilusionismo, o país, a acreditar em algo que não corresponde à realidade. Ludibriados pela nossa própria ilusão, andamos há anos a tentar equilibrar os resultados nas margens das percentagens dos que votam! E assim, vamos engrossando os números dos que a nossa varinha mágica esconde.
E nestas eleições legislativas do próximo Domingo, dia 10 de Março de 2024? Quantas pessoas se esconderão na cartola da abstenção? Quantas pessoas se fecharão no seu próprio desinteresse, deixando que outros decidam por eles sobre matérias sobre as quais a seguir serão os primeiros a criticar? E dessas, quantas se abstêm porque têm esse direito e assim o querem expressar?
Está na altura de um novo truque de magia: fazer aparecer, das fileiras dos que antes fizemos desaparecer, muitos daqueles que não votam por desinteresse ou desistiram de votar. 10% de abstencionistas são 1 milhão de votos! 20%, 2 milhões! 30%, 30 milhões! Que força escondida, tão útil e tão desperdiçada! Que vigor se daria à mudança para um rumo melhor que Portugal merece! É também muito por aí que se joga o futuro! Recuperar e trazer para a democracia aqueles que se esconderam dela por cansaço de tantos truques de ilusionismo, ou por desilusão com as expectativas que os protagonistas antes lhes prometeram, ou por puro desinteresse cívico, ou por egocentrismo militante, ou por qualquer outro motivo que os afaste das decisões que também os afectarão a eles, aos filhos, aos netos, aos pais, aos avós, aos amigos, aos vizinhos, aos concidadãos! Que se escondem, mas depois opinam e queixam-se dela, a democracia, querendo aproveitar tudo o que o país tenha para dar, sem terem dado tudo o que deviam ter dado ao país! Não se dão só impostos sobre o que ganhamos. Dão-se votos para escolher quem melhor aplique os impostos que se dão. E dão-se votos para castigar quem não cumpriu o que prometeu. Não se pode dar o silêncio da abstenção a quem merece ser afastado do poder! Não se pode dar o silêncio da abstenção a quem quer trabalhar para um Portugal melhor! Trazer os abstencionistas de volta à participação democrática, isso sim, não seria ilusionismo, seria a verdadeira magia que faria andar este país em passo acertado e rumo ao futuro com a participação de todos.
Mas, “hélas”, a magia não existe! Ah, se existisse!
Pouco importaria se trouxesse votos de protesto ou de confiança, nulos ou brancos, a favor ou contra. Mas que todos os eleitores os expressassem, obrigando assim a serem contados e interpretados! Ficar em casa ou em mero gozo de lazer, abstendo-se de cumprir o dever cívico e obrigação para consigo e para com a comunidade, não pode deixar de ser um acto de desistência, de si próprio e para com os outros. Um acto de cobardia, em que se diz mal, mas de longe e sem participar na luta. Quem deixa de ir votar por motivos frívolos, egoístas e de puro desinteresse, comete um acto criminoso de omissão de auxílio ao país!
No próximo Domingo, dia 10 de Março de 2024, o leitor que chegou até aqui e que planeava ou planeia abster-se nas eleições legislativas, pense nisto. Pense no exercício da cidadania a que tem direito, mas à qual deve também a obrigação. Senão por si, pelos outros. Domingo, se puder, levante-se e grite, cante ou chore. Mas grite, cante ou chore no seu boletim de voto, na solidão da sua cabine de voto. Para que o que tem a dizer importe. E importa mesmo!
Se já não sabe como se faz, consulte o sítio https://eportugal.gov.pt/servicos/saber-onde-votar
Mas não deixe que outros decidam por si, que gritem por si, que protestem por si, que contribuam por si, que construam ou até destruam por si. Não deixe que eu ou ele ou ela decidamos por si. Dê a Portugal o esforço e o benefício do seu voto. Só assim conseguirá que Portugal volte a dar-lhe a atenção que lhe deve e o merecido valor a todos os cidadãos. Faça magia, em vez de deixar que façam presdigitação ou ilusionismos consigo! Venha daí! Vamos votar. Vamos fazer um Portugal melhor.