A esquerda detesta a propriedade. Ao longo dos anos sempre combateu a propriedade privada. Foi assim na reforma agrária e nas ocupações selvagens de herdades no Alentejo. Foi assim nas nacionalizações dos grupos económicos e nas expropriações sem indemnizações. Tem sido assim com grupos anarquistas de esquerda que ocupam casas desabitadas, sem permissão dos seus proprietários legais, simplesmente porque não respeitam a propriedade. E passou a ser assim com o governo português, quando na semana passada lançou o ataque mais violento contra a propriedade privada desde o verão quente de 1975.

O programa apresentado pelo governo no passado dia 16 de fevereiro é a confirmação que o governo socialista de António Costa não precisa de se aliar à extrema-esquerda para ser extremista, nem precisa de se coligar com radicais de esquerda para ser radical. O pacote sobre a habitação apresentado pelos socialistas revela, na sua essência, um governo desorientado, desfasado do tempo e com tiques autoritários a lembrar Caracas ou Havana.

No amontoado de erros, preconceitos ideológicos e propostas deficientemente preparadas, há três matérias que não podem deixar de merecer um reparo especial pela sua gravidade, iniquidade e injustiça: a isenção de mais valias no IRS na venda de imóveis ao Estado, a contribuição extraordinária sobre os imóveis do alojamento local e o arrendamento obrigatório de casas devolutas.

Comecemos pela venda de casas ao Estado e os respetivos benefícios fiscais associados. Desde logo a medida é errada porque promove ainda mais Estado, numa sociedade sobrecarregada com Estado. Depois é também errada porque o Estado é um péssimo proprietário, ao ponto de nem saber quantos imóveis detém atualmente. Mas, acima de tudo, esta medida é profundamente iníqua porque irá discriminar portugueses contra portugueses, proprietários contra proprietários.

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Sendo os recursos do Estado limitados, quais serão os critérios a utilizar pelo Estado e pelas autarquias para adquirir imóveis e atribuir isenções de IRS a cidadãos em particular?  Como é que alguns proprietários vão ser selecionados para venderem imóveis ao Estado e beneficiarem de um regime fiscal mais favorável que os restantes proprietários? Como é que os princípios constitucionais da generalidade, da igualdade e da legalidade vão ser respeitados nestas aquisições de imóveis? Num momento em que os casos de suspeição, promiscuidade e corrupção têm aumentado assustadoramente dia após dia, esta medida é perigosa, distorce o mercado e diminui a transparência dos atos praticados por políticos.

A segunda medida digna de nota, pela sua gravidade, é a criação de uma contribuição extraordinária sobre os imóveis detidos em alojamento local. A par da proibição de novas licenças de alojamento local e da reavaliação das atuais até 2030, a criação desta nova contribuição corresponde a puro terrorismo fiscal contra famílias que investiram as suas poupanças neste sector e, dessa forma, desempenharam um papel tão importante no incremento do turismo em Portugal e na reabilitação dos centros urbanos das nossas principais cidades.

Este novo ataque ao alojamento local, que floresceu desde as reformas de simplificação e de tributação reduzida aprovadas pelo governo PSD-CDS/PP, para além de injusto e profundamente ideológico, tenderá a empurrar outra vez este sector para a economia paralela e informal, com todas as consequências negativas que esse retrocesso representará.

Mas se as duas primeiras medidas são erradas e graves, a terceira é totalitária. Impor por lei o arrendamento obrigatório de casas devolutas é o pináculo do socialismo. Representa a intervenção radical do Estado em dois valores essenciais das democracias ocidentais: a propriedade e a liberdade.  Uma sociedade subjugada pela opressão do Estado é uma sociedade aprisionada e incapaz de construir e de criar riqueza.

Em vez da tentação de voltar a soluções de socialismo radical, que já fracassaram na 1º República e no PREC, o governo deveria estar focado em resolver verdadeiramente os problemas da habitação. Por um lado, aumentando a oferta e criando todas as condições para promover mais construção de imóveis, com simplificação dos licenciamentos e no quadro de uma sã concorrência entre promotores. Por outro lado, reduzindo a tributação sobre o imobiliário para facilitar a aquisição de casas por parte das famílias portuguesas, bem como aliviando os custos com o crédito à habitação, através da possibilidade de dedução no IRS dos juros pagos pelas famílias portuguesas. Finalmente, promovendo um mercado do arrendamento estável, flexível e moderno, de forma a incentivar os proprietários a arrendarem as suas casas.

Com este programa totalitário para a habitação, o governo socialista comporta-se como um verdadeiro okupa, sem respeito pela propriedade privada e pela liberdade das famílias. E sem propriedade e sem liberdade não há democracia. Nem há prosperidade económica, como demonstram todas as desastrosas soluções socialistas no passado.