Junte-se um quanto baste de sabedoria. A capacidade de construir uma história e de a contar com alma. Uma pitada de entusiasmo. Uma porção de magia, quando se trata de levar uma criança pela mão do escuro até ao deslumbramento de descobrir e de compreender. Mais um jeito – especial! – de juntar engenho a isso tudo e de remexer naquilo que se esconde debaixo dela até que tudo se encaminhe para a ponta da língua. Mais essência de escutador – e, até, de adivinhador – em pequenas porções, indispensáveis à medida que uma criança deixa as traquitanas que lhe entaramelam a cabeça e, de cabeça no ar, apanha o jeito e aprende. Misture-se tudo com delicadeza, com bondade e com paciência. Dê-se o tempo indispensável para levedar e apurar. Adicione-se perseverança e a sensatez de não querer que os resultados apareçam de rompante. Mais encantamento, aos pedaços. Dê-se a tudo isso anos de escola. Meios, formação e oportunidades. E ter-se-á construído um professor.

É por isso que não se entende que não se decrete o estado de calamidade quando nos deparamos com 40% dos professores a reformarem-se nos próximos 8 anos. E que não se pare e não nos alarmemos – depois de dois anos lectivos turbulentos, e quando seriam necessárias recuperações e mais recuperações curriculares – quando as reformas em curso de muitos professores, a falta de muitos outros e a greve às horas extraordinárias deixam imensos alunos sem aulas, e pareçam fazer de um professor um bem em vias de extinção. E que não se reflicta sobre o que foi faltando, ao longo dos anos, com responsabilidade de todos, para que, como saída de emergência, considerando aquilo que não se fez, se suponha que a solução para este estado de coisas passe pela reconversão de outros diplomados. Numa altura em que menos de 1% dos professores têm menos de 30 anos. Quando 90% dos professores manifesta a intenção de se reformar mais cedo. Quando, em 2019, dos 21 cursos de formação inicial de docentes lançados pelas instituições de ensino superior, em 12 houve menos de 10 candidatos. Quando o número de estudantes inscritos em cursos superiores de educação caiu cerca de 70%, desde o início do século. E quando os indicadores de desconsideração social dos professores e de mal-estar docente não param de aumentar.

Um professor leva anos a construir. Requer cuidado, atenção e carinho. Exige respeito e ponderação. Porque são os professores, todos juntos, que constroem a escola. E porque eles são os operários do futuro.  Por isso mesmo, não se entende que a escola não seja um imperativo de regime. E que aquilo que se passa com os professores – sobretudo depois deles terem dado provas inacreditáveis de compromisso e de missão para com a educação, durante a pandemia – não exija de todos a planificação e a urgência que faça com que a escola não morra. Porque sem professores a escola não existe. E sem a escola não há futuro.

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