A participação de Pedro Passos Coelho na Festa do Pontal, ainda que realizada no Calçadão de Quarteira, colheu de surpresa não apenas os militantes e simpatizantes do PPD/PSD presentes no evento. De facto, ao contrário do que é habitual na vida portuguesa, mesmo nos casos sujeitos ao segredo de justiça, não houve fugas – intencionais ou inadvertidas – de informação. Daí o mediatismo a que Passos Coelho teve direito. Uma atenção passível de ensombrar aquele que estava destinado a ser o protagonista da Festa: Luís Montenegro, o novo presidente do partido laranja.

Uma sombra que Passos Coelho foi lesto a afastar. Os elogios a Montenegro, ao considerá-lo bem preparado para vir a exercer o cargo de primeiro-ministro, deixaram claro que Passos Coelho não se perfila, tanto no curto como a médio prazo, como candidato a líder do PPD/PSD. Por isso, fez questão de explicar que a sua vinda ao Calçadão se destinava a mostrar, de forma explícita, o seu apoio ao novo líder.

Uma certeza bem mais segura do que aquela que se prende com a manutenção ad eternum da condição de “retirado” da vida política. A condição que também fez questão de admitir publicamente.

Pedro Passos Coelho sabe que quando se afastou da vida política ativa era a única personalidade capaz de federar a direita, como tinham provado as duas vitórias consecutivas nas eleições legislativas, mas também de unir as várias vertentes da esquerda, incluindo a radical e a extrema-esquerda, contra si. Porém, no decurso desse afastamento voluntário, a conjuntura mudou.

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De facto, mais do que o desaparecimento parlamentar do antigo parceiro da coligação e o surgimento da Iniciativa Liberal, a crescente afirmação do populismo do Chega constitui-se como condicionante de uma possível unidade da direita. Além disso, o desmantelar da geringonça, por conta da maioria absoluta com que os portugueses resolveram brindar o respetivo condutor, e, sobretudo, a forma desajeitada como o Governo está a lidar com a nova realidade voltaram a chamar à colação a omnipresença de António Costa nos mais recentes vinte anos de governação socialista, não só enquanto primeiro-ministro, mas também como personagem do pântano de António Guterres e do duplo consulado de José Sócrates, apeado do Poder numa conjuntura de pré-bancarrota.

Ora, esta revisitação do passado acaba também por trazer à memória a governação de Passos Coelho e as medidas económicas por si tomadas para satisfazer as imposições da Troika. Um período difícil para a grande maioria dos portugueses. Os cortes nos vencimentos e nas pensões saldaram-se num enorme custo social. A bancarrota foi evitada, mas as feridas sociais tardaram a sarar. Nessa altura, os portugueses esqueceram o real causador do problema, José Sócrates, e as dificuldades da conjuntura internacional. Passos Coelho foi visto como o único responsável pela austeridade.

Porém, meia-dúzia de anos foram suficientes para apenas a esquerda radical e a extrema-esquerda continuarem a manter essa visão. Um número crescente dos portugueses que se sentiram injustiçados por Passos Coelho começam a reconhecer que os sacrifícios foram necessários. Porventura excessivos, mas indispensáveis.

Esses portugueses reconhecem que Passos Coelho não usou o cargo de primeiro-ministro em proveito próprio. Por isso, com demasiada frequência, fez questão de ser o porta-voz das notícias desagradáveis e deixou ao seu vice-primeiro ministro, Paulo Portas, a divulgação das menos gravosas.

Ora, com São Bento fora do horizonte de Passos Coelho, parece estar em formação uma vaga com outro destino.

A História ensina que quando o Samorim de Calecut perguntou a Vasco da Gama o que ia fazer à Índia, foi um marinheiro que respondeu, elucidando-o que iam em busca de cristãos e de pimenta.  Em Quarteira, a voz da jovem militante que assumiu querer ver Passos Coelho como Presidente da República talvez seja a versão moderna da voz do marinheiro da armada de Gama.