Como decorre da vida habitual, todas as disputas partidárias internas resultam em clivagens de fações ou grupos que se concentram à volta das personalidades que, no caso de saírem vencedoras, podem vir a ter em boa conta os interesses dos seus apoiantes.

A experiência também ensina que, uma vez terminada a luta, é habitual que a parte vencedora e a parte vencida enterrem – raras vezes se alguma, de forma definitiva – o machado de guerra e falem da necessidade de unidade em torno do líder escolhido pelos militantes.

A recente luta eleitoral entre Rui Rio e Paulo Rangel não escapou a qualquer uma das regularidades enunciadas, embora com duas cambiantes.

A primeira decorrente do facto de Rui Rio ter logrado a vitória contra a fação que a opinião publicada designa como os barões ou os notáveis do PPD/PSD. Um caso a requerer análise muito cuidadosa. Importa perceber se a circunstância de Rio ter apostado numa estratégia que privilegiou o recurso às tecnologias de informação no contacto com os eleitores foi suficiente para deitar por terra o voto de cabresto ou se, pelo contrário, é a referida elite partidária que não dispõe efetivamente do poder que julga ter junto dos militantes das respetivas distritais e concelhias. Uma forma de dizer que não é coronel quem quer ou aparenta ser, mas quem pode.

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A segunda prende-se com o reduzido número de votos que separaram o vencedor do vencido. Num jogo de soma zero, ao vencido faltaram menos de 3% dos votos para ter sido declarado vencedor. Sendo certo que por um voto se ganha e por um voto se perde, não é menos verdade que a margem da vitória de Rio foi curta. Um dado que aponta para que o PPD/PSD se aproxime da imagem de uma laranja dividida em duas metades quase iguais. Com a agravante de ser mais fácil cortar a laranja ao meio do que pegar em duas metades e dar-lhes unidade. Uma realidade a ter em conta no curto prazo quando os portugueses forem chamados às urnas.

Face ao exposto, não se afigurava fácil a tarefa de Rui Rio no sentido de mobilizar o partido para as próximas legislativas. Porém, a dificuldade ainda se agudizou quando, no discurso inicial de vitória, Rio resolveu falar para dentro, num claro acerto de contas. Por isso, recusando ser hipócrita, não fez questão de esconder o seu ressentimento face a quem tem vindo a contestar, esporádica ou sistematicamente, a sua liderança. De facto, uma coisa é dizer que não é ingrato, ou seja, acenar com lugares elegíveis aos seus apoiantes de todas as horas, e coisa diferente é afirmar publicamente que “a porta da rua é serventia da casa” para quem identifica como inimigo interno.

Além disso, Rio deixou claro que perfilha a ideia de que um político tem de aliar a competência à lealdade. Uma forma de anunciar a não inclusão nas listas de deputados de alguns nomes sonantes que acusa de estarem no partido não por convicção, mas por uma questão de jogos de interesse pessoal.

Poucas dúvidas subsistem de que o discurso pós-vitória de Rui Rio colheu o aplauso dos seus indefetíveis apoiantes, mas não parece passível de unir as duas metades do partido laranja.

Nas múltiplas entrevistas que se seguiram à sua vitória, Rui Rio teve oportunidade de dizer que não acreditava que António Costa estivesse em condições de reeditar a defunta geringonça, no caso de perder as eleições. O problema que se coloca é que para o Partido Socialista ficar em segundo lugar é necessário que o PPD/PSD vença as próximas legislativas.

Será que meia laranja dá para desfolhar uma rosa que teimou até ao fim na manutenção de algumas pétalas ofensivamente descoloridas?