Tenho a sorte de ter muitos amigos portugueses. Amigos com os mais diversos tipos de trabalho, opinião, religião e de condição social. Consequentemente, tenho amigos com opiniões políticas muito diversas. Amigos que votam no PS, no PSD, no Bloco, no CDS, no PAN, na CDU e em alguns outros partidos. Entre todos esses meus amigos, só há uma coisa em comum: todos têm horror de imaginar Portugal administrado por alguém como Bolsonaro.
Uma das coisas que mais admiro nos portugueses é a sensatez. Pode-se pender um pouco mais para um lado ou para outro. Ser mais conservador ou mais liberal, mas é realmente raro encontrar alguém com ideias extremistas. Há divergências, acima de tudo, sobre os rumos da economia. Mas é muito raro ouvir alguém relativizar o respeito aos direitos fundamentais ou à dignidade da pessoa humana. Bom senso. Por aqui costuma haver bom senso.
Mas há um fenômeno que me deixa um pouco assustada. E este fenômeno não é o deputado André Ventura em si, nem seu partido, o Chega. O que me assusta é as pessoas não entenderem o que significa o fato de André Ventura e seu partido ganharem cada vez mais espaço no país. E o que me assusta ainda mais é o fato de muitos portugueses não entenderem a real semelhança que há entre os discursos desse senhor e aqueles que acontecem do outro lado do Atlântico.
Bolsonaro também era membro do poder legislativo brasileiro. “Um maluco”, diziam uns. “Mas que diz umas coisas engraçadas”, diziam outros. “Fala da boca pra fora”, “é só uma piada”, “esse cara nunca seria eleito no executivo, não se preocupe”. Enfim. Ninguém achou que aquele homem nanico, inculto e sem base, poderia crescer. Por isso continuaram rindo de algumas piadas e dizendo que não havia com o que se preocupar. O desfecho da história vocês já conhecem.
Não, eu não conheço nenhum português que admire Jair Bolsonaro. Mas, sim, conheço alguns portugueses que, apesar de não terem votado em André Ventura, riem de algumas de suas falas e repetem acerca dele exatamente as mesmas frases levianas que eu ouvia sobre Bolsonaro, enquanto ele ainda parecia razoavelmente inofensivo enquanto político.
Independentemente da opinião de cada um, uma coisa é certa. Não conheço nenhum português que quisesse ver seu país governado por uma extrema direita truculenta e caduca, que envergonha a nação em conferência internacionais e que demonstra sua mais profunda incapacidade de gestão. Todos viram o que vem acontecendo com a Amazônia, com o ensino público brasileiro, com a liberdade de expressão. Todos acompanham a vergonha internacional que vem se consolidando acerca do Brasil e seu governo.
Não, aparentemente não é a mesma coisa. Mas confesso que, às vezes, as semelhanças até assustam. O momento político que atravessamos no mundo pede limites sólidos na nossa opinião. Pedem um limiar rígido entre o certo e o errado. Entre o ético e o antiético. Entre aquilo que somos e aquilo que, em hipótese nenhuma, queremos ser. Que Portugal saiba com mais clareza do que o Brasil o que não quer ser, e que dirija seus passos numa direção segura, em vez de trilhar caminhos igualmente inconsequentes.