As Democracias estão numa competição em duas frentes que se estende desde a fronteira terrestre entre a Rússia e as Democracias Europeias até à região do Pacífico-Asiático. Consequentemente uma deterioração da posição das Democracias em qualquer um destes blocos pode acarretar um enfraquecimento simultâneo nas duas frentes em disputa, sobretudo se for colocada em causa a operacionalidade de alianças pré-existentes.

Ora segundo o relatório sobre as capacidades militares dos EUA, que o Pentágono elaborou em 2011, a pedido da Administração Obama, ficou demonstrado que os EUA – mesmo na sua condição de nação que mais recursos adjudica ao seu exército por ano – ainda assim só teriam capacidade para suportar um conflito de grande dimensão a cada momento. Consequentemente, mesmo os EUA não conseguiriam enfrentar uma campanha conjunta da China e da Rússia, salvo numa situação em que exista uma efetiva cooperação por parte dos aliados Asiáticos e Europeus, tendo sido este o conjunto de premissas que serviu de base à estratégia dos EUA nos termos fixados pelas “defence policy guides” de 2012.

É igualmente relevante ter em consideração as várias ações que a China e a Rússia adotaram com o propósito de fortalecer a sua relação, seja através de exercícios militares conjuntos, como os que decorreram junto ao Japão, ou através de declarações doutrinárias tais como a que antecedeu a invasão da Ucrânia. A atitude de agressividade que ambos os poderes antidemocráticos estão dispostos a assumir face a qualquer avanço dos regimes de democracia liberal ficou igualmente visível através das posições que tanto a China como a Rússia assumiram nas relações internacionais.

Enquanto a União Soviética e a China maoista adotavam a regra geral de só pretenderem formar alianças com regimes cuja rejeição da democracia envolvesse uma adesão à ideologia comunista, a Rússia de Putin e a atual liderança chinesa aceitam qualquer tipo de autoritarismo desde que o seu estilo antidemocrático possa ser utilizado para ganhos a nível estratégico. Consequentemente, a nossa dependência face a alianças com regimes democráticos fica incrementada na medida em que quaisquer regimes ou movimentos não democráticos são potenciais colaboradores da China ou da Rússia. A decisão americana de passar a concentrar mais recursos militares na região do Pacífico-Asiático, assim como a criação da aliança militar AUKUS, não diminuem, por agora, a importância estratégica das Democracias situadas na Europa ou na região do Atlântico Norte: é preciso ter em conta o modo pelo qual as duas frentes desta disputa com o autoritarismo comunicam entre si, sendo também relevante sublinhar que dois dos membros fundadores da AUKUS – os EUA e o Reino Unido – são também membros fundadores da NATO.

Os países que não tenham regimes democráticos só poderão participar na geoestratégia das democracias se for reconhecida uma distinção de natureza qualitativa no âmbito atribuído às duas alianças. Esta gestão das várias relações diplomáticas cria um efeito dissuasor de quaisquer erosões da ordem democrática e incentiva regimes híbridos ou de transição a completar a sua passagem para uma democracia. De igual modo, esta política de alianças deve também fazer uso da circunstância de grande quantidade de riqueza produzida a nível mundial ainda se encontrar no campo dos regimes democráticos, isto é, os subsídios e apoios ao desenvolvimento serão um mecanismo de negociação importante.

Será assim necessário criar uma nova frente internacional que, não obstante as suas potenciais contradições internas, represente a doutrina pró-democrática contra os antidemocráticos.

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