Os salários são baixos em Portugal? Sem dúvida, escandalosamente baixos. Vejamos porquê e como alterar. Antes de mais as políticas públicas têm de ser desenhadas pensando que o nosso País é apenas uma região numa economia mais vasta. O mercado único e o euro vieram tornar isso ainda mais evidente.
Muito se tem opinado sobre salários baixos, mas caímos sempre na baixa produtividade. Ou seja, uma explicação que já pouco acrescenta. E já agora, a baixa produtividade da economia portuguesa é o maior dos desperdícios. Com os mesmos fatores produtivos produziríamos o dobro se estivéssemos na Irlanda, por exemplo. Outras razões existirão certamente, mas a grande diferença é o (péssimo) funcionamento da administração pública e a (péssima) qualidade das leis e da administração da justiça em Portugal.
Mas voltemos à pergunta inicial. Os salários são baixos em Portugal, porquê? Vamos ser tão simples quanto possível e certamente que outros casos podem (só) aparentemente fugir aos exemplos que vou dar.
Pensemos que uma empresa tem, sinteticamente, três fatores produtivos: Trabalho, obviamente; Capital (incluindo a terra); Energia.
Os preços daquilo que as empresas produzem são, direta ou indiretamente, determinados nos mercados internacionais. Sobre esses preços a economia portuguesa não tem qualquer influência. Aquilo a que tecnicamente se chama “tomadores de preços” de bens e serviços na vasta maioria das empresas. Pensemos em três casos muito diferentes: Dielmar; TAP; Efacec. Não aguentaram sobreviver no mercado internacional, com os preços do mercado internacional não conseguiram ter lucros e entraram em falência.
O preço do que se produz é assim fixado internacionalmente para a maioria das empresas e terá de remunerar os três fatores produtivos. A remuneração do capital também tem um mercado internacional e o que é relevante para o investidor é a remuneração líquida de impostos. Como a tributação sobre os lucros —a remuneração do capital investido— é mais alta em Portugal, implica que o investidor requeira taxas de lucro brutas mais elevadas para ser competitivo com investimentos, por exemplo, na Alemanha ou na Irlanda. Caso contrário, investe noutro país.
Ou seja, se preço do bem ou serviço no mercado internacional é um dado, também o mercado internacional condiciona a parte que terá de ir para a remuneração bruta do capital e que é, necessariamente, maior do que na Irlanda, para simplificar.
Em segundo lugar, temos a energia como fator produtivo, já que todas as empresas usam energia. Também aqui os preços, devido a taxas e impostos, são particularmente elevados. E não estou a referir-me ao aumento recente, porque esse aumento afetou todos os países da União Europeia, não alterando a competitividade de uma empresa em Portugal. Mas os impostos e taxas implicam custos da energia muito mais elevados em Portugal do que em França ou na Irlanda.
Estamos agora na posição de perceber porque os salários são baixos em Portugal: porque todos os outros custos de produção são significativamente mais elevados que na Irlanda, por exemplo, para o mesmo preço para os bens e serviços.
Com o preço dos bens fixados internacionalmente, com o custo do capital e da energia acima da Irlanda, para a empresa sobreviver os custos do trabalho terão de ser menores. O que resta do bolo é menor em Portugal que na Irlanda ou em França.
Como a produtividade do trabalho é, grosso modo, metade, este diminuto resto do bolo é para dividir pelo dobro dos trabalhadores. Os salários são assim baixíssimos e mais baixos do que é socialmente aceitável. Se não for assim, implicará a falência da empresa ou o investimento nem se realizar.
Evidentemente as pessoas com elevados níveis de educação são cada vez menos imóveis internacionalmente. Por isso, emigram. As discrepâncias salariais têm levado médicos, engenheiros, licenciados em gestão e economia, enfermeiros… a emigrarem em massa. Também aqui um IRS absurdamente elevado agrava a situação. O Estado pagou parte significativa da sua formação para eles ajudarem a Alemanha, o Reino Unido, a Irlanda ou a Espanha a serem mais ricos e mais competitivos. O Estado português subsidia países mais ricos com impostos altos pagos pelos portugueses.
Por isso, a discussão do salário mínimo, dos contratos coletivos, da precariedade faz apenas cócegas nesta realidade de fundo. E quando não fazem cócegas, as empresas entram em falência. Não é estar contra os aumentos de salários ou diminuição da precariedade é apenas salientar que a causa dos salários baixos, a médio prazo, não está aí. Está nas taxas e impostos sobre os outros fatores que todos as empresas necessitam para sobreviver. Tornar os custos de produção não laborais mais baixos é imperioso para os salários poderem subir significativamente. Um corte nesses impostos —sobre a energia e a remuneração do capital— levaria o mercado a remunerar melhor o trabalho. As forças do mercado de trabalho, sindicatos à cabeça, conseguiriam esse resultado a médio prazo.
Portugal tem condições para ter salários muito acima dos atuais, mas necessitaria de ter tido políticas públicas diferentes das seguidas desde há duas décadas, pelo menos. E Portugal não é um país, do ponto de vista económico, mas apenas uma região. Por outras palavras: não faz sentido falar em modelo de salários baixos, o que existe é um modelo de impostos altos. Os salários baixos e a fuga de quadros são apenas a consequência.