Marta Temido não tem condições para se manter na pasta da Saúde. Ou melhor. Não fora este o PS de António Costa, aquele que manteve o «excelente» Eduardo Cabrita, e não teria. Não fora este o PS que fez transitar Fernando Medina de uma perda decidida pelos eleitores para a liderança das Finanças decidida pelo próprio António Costa, e não teria. E, muito mais importante para o caso em questão, não fora este PS o facilitador do SNS no País dos Sovietes, na anterior legislatura, e não teria.
O problema do SNS é estrutural. Não é circunstancial, não se refere a um período crítico, seja desencadeado pelos feriados recentes ou pelo COVID, por muito que as circunstâncias adversas possam agravar o seu mau estado. E ao fim de quase sete anos de governação convém também que não seja, e ainda, um problema da responsabilidade dos de sempre: Passos/Troika/Cavaco/Direita.
Os hospitais públicos têm graves problemas de gestão, de falta de pessoal, de renovação de pessoal, falta de condições de trabalho, ou não haveria pedidos de escusa de responsabilidade e desde antes da pandemia por haver equipas incompletas, portanto, sem capacidade de resposta adequada. O que Marta Temido propõe entre comissões e concursos para soluções de curto e médio prazo não é a reforma do SNS, é um placebo para o SNS.
Médicos e enfermeiros saem do SNS ou, no caso dos recém-licenciados, já nem entram no SNS uma vez adquiridas as competências necessárias para a contratação pelo privado, que paga melhor, trata melhor, e tem lucro; ou para emigrar. Há, necessariamente, para além do problema estrutural que é preciso resolver, um problema concorrencial. O pessoal de saúde é mal pago no SNS: um enfermeiro ganha pouco mais do que o salário mínimo. Um médico especialista, com ou sem exclusividade, ganha menos do que o médico tarefeiro, pago à hora e à distância, que trabalha ao seu lado. Para além do número exorbitante de utentes a que tem de prestar assistência. É preciso um ajuste salarial. Ao contrário do que este governo afirma, se a pandemia fez alguma coisa durante dois anos, foi ocultar a degradação do SNS.
As PPP hospitalares foram salvaguardadas até pelo Tribunal de Contas. Nos hospitais de Braga, Vila Franca de Xira, Loures, Cascais, em parcerias público-privadas entre 2014 e 2019, foram poupados ao erário público 203,3 milhões de euros, no mínimo. Houve melhor utilização dos recursos disponíveis, menores custos, melhores serviços prestados aos utentes, maior satisfação dos utentes. Estas parcerias e os seus bons resultados foram sacrificados por Marta Temido à geringonça, à ideologia política que garantiu a manutenção do poder próprio, isto é, do Partido Socialista, ainda que para tal cumprisse a agenda do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista. Isto foi feito por quem diz «lutar» pelo SNS. E por quem afirmou, a despeito da avaliação do Tribunal de Contas, que «o modelo de avaliação não é suficientemente adequado a avaliar o que quer que seja» e que «a gestão pública cobre melhor as necessidades na área da saúde» – estamos a vê-la no seu esplendor.
Quem luta pelo SNS é quem garante a sua funcionalidade e dignidade tanto quanto a saúde e dignidade dos seus utentes. As parcerias provaram o que sabemos de cor: o Estado, ao contrário do que afirmou a ministra da saúde, não é um bom gestor.
(A desfaçatez de Marta Temido, depois de satisfazer a geringonça com a reversão das PPPs, quando afirmou «os privados não têm tido disponibilidade para as condições que o governo coloca em cima da mesa enquanto o estado tem e mantém esses serviços» só tem paralelo na desfaçatez de António Costa quando pediu aos privados aumentos de 20%. Tudo isto seria cómico, se não fosse trágico.)
O problema é estrutural. É de gestão. Não há falta de verbas para a Saúde. Não há, se comparamos com os restantes países da Europa, sequer desproporção no número de médicos por doentes. Há más condições de trabalho. Há salários baixos. Há unidades hospitalares degradadas e/ou desfasadas das necessidades que devem suprir, desadequadas seja em número de camas ou em volume, ou em especialidade, ou localização. Mas há, porque foi democraticamente decidido, uma maioria absoluta que permite a resolução deste problema. Vão buscar um quadro competente. Resolvam-no.
A autora escreve segundo a antiga ortografia