Já não há maneira de dizer isto, a não ser brutalmente: com o governo de António Costa, o país vai a caminho de lado nenhum. Mário Centeno está inquieto com uma subida de juros. Outros já estão para além de preocupações. A gestão da CP desistiu, tal como 85 médicos do Hospital de Setúbal que se demitiram esta semana. O Estado, que o governo disse ser a salvação durante o confinamento, cai aos pedaços. Sim, está a chegar o dinheiro europeu do PRR. Mas para quê? Para que tudo isto dure talvez mais uns anos, e mesmo assim não é certo.

Há vinte anos que a economia portuguesa diverge das economias mais dinâmicas da União Europeia. A estagnação tem tido custos enormes. Compromissos e aspirações dependentes do crescimento económico foram, à falta deste, sustentadas pelo endividamento que o enquadramento monetário europeu permitiu. Em Portugal, a economia parece consistir na barganha dos partidos de esquerda à volta da distribuição dos despojos orçamentais. A pouco e pouco, deixou de haver vida para além do Orçamento. Mas o próprio Orçamento contém cada vez menos vida, apertado pela urgência de justificar o financiamento europeu de que o Estado depende.

Tinha de ser assim? Segundo o governo e os partidos que o apoiam, sim. Há cinco anos que nos dizem que é isto, ou a “austeridade”. Mas que é isto que temos agora, senão a  “austeridade”? O que é a angústia da dívida pública, um dos maiores esforços fiscais da Europa, serviços públicos sub-financiados, e esta pequena mercearia orçamental, senão a “austeridade”? Não, não tinha de ser assim, nem tem. Há um século, Portugal era um país sem algumas das condições básicas do desenvolvimento moderno. Hoje, já não é possível pendurar simplesmente as nossas frustrações na falta de estradas ou de diplomas. Aliás, uma parte da mão-de-obra mais qualificada passa cada vez mais para o estrangeiro, por não encontrar remuneração condigna no país. Portugal tem acesso privilegiado a um dos maiores mercados de consumo e de capitais do mundo, a União Europeia. Durante o ajustamento de 2011-2015, os portugueses souberam reagir, por exemplo, passaram a exportar mais. Quem nos olha de fora, com mais ingenuidade, por vezes nem percebe bem qual é o problema. Não vemos nós o que outros países fizeram e fazem para prosperar?

Não os imitamos porque o poder político em Portugal quer que os portugueses acreditem nesta coisa: que a manutenção e melhoria dos seus rendimentos depende unicamente desse mesmo poder político, dos seus decretos, regulamentação e subsídios. Segundo a doutrina oficial, não é o investimento, não é o trabalho, não é a inovação, não é a produtividade que garantem empregos e aumentam rendimentos, mas o telefonema ao senhor secretário de Estado ou a manifestação da CGTP. Ora, para que o telefonema e a manifestação valham a pena, é preciso um sistema em que o investimento e o trabalho estejam constrangidos pelo poder político, de modo que, de facto, esse poder seja a única via para arranjar negócios, obter empregos e acrescentar rendimentos. Acontece que nunca um sistema destes, em que a iniciativa e o engenho se esgotam na cunha e no megafone, alguma vez gerou uma economia de empregos qualificados e de salários elevados.

A inversão do declínio em Portugal depende de uma mudança política: da capacidade de as oposições substituírem esta maioria parlamentar por uma outra maioria, disposta a acreditar na sociedade civil e a libertá-la. Não se trata de transformar o país: trata-se de lhe restituir as condições de se transformar a si próprio. Como está, não tem de ser, nem verdadeiramente pode ser.

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