Os projectos de construção de gasodutos anunciados pela Rússia não são para serem construídos na totalidade, pois não há meios financeiros, mas apenas para a ameaçar a Ucrânia com o fim do trânsito desse combustível através desse país para a Europa.
Alexei Miller anunciou, no Fórum Económico Internacional de São Petersburgo, o projecto de construção de mais um gasoduto que vai ligar a Rússia à União Europeia através do Mar Báltico. A capacidade dos dois tubos, que serão construídos paralelamente à “Corrente do Norte” (North Stream), será de 55 mil milhões de metros cúbicos de gás por ano.
Segundo Miller, “isso mostra que a procura de gás russo aumenta e sem dúvida que a questão de novos contratos de fornecimento de gás russo a longo prazo é uma questão actual nas conversações com os nossos parceiros europeus”.
Uma das principais razões deste anúncio foi prevenir a Turquia que não pode perder muito tempo a tomar a decisão de autorizar a construção da “Corrente Turca”, gasoduto que deverá transportar gás russo do Mar Cáspio até à Grécia e, daí, até à Europa Central.
É de recordar que a Rússia e a Turquia decidiram montar este novo gasoduto em alternativa à “Corrente Sul” (South Stream), projecto que não saiu do papel devido a Moscovo não ter chegado a acordo com Bruxelas.
Por isso, segundo alguns especialistas, o Kremlin não irá realizar a construção dos dois gasodutos, mas de um, dependendo a decisão final do desenvolvimento das conversações com a Turquia e a União Europeia.
O anúncio da construção do novo gasoduto é tanto mais estranho quando se sabe que as capacidades de transporte da “Corrente do Norte” não estão a ser totalmente aproveitadas. Esse gasoduto tem capacidade para transportar 55 mil milhões de metros cúbicos, mas, presentemente, fornece apenas 36,5 mil milhões de metros cúbicos.
Segundo o Terceiro Pacote Energético da UE, a Gazprom não pode utilizar 100% da capacidade dos tubos OPAL e NEL (a parte terrestre da “Corrente do Norte” no território da Alemanha), pois transforma-se em monopolista. Mas não apareceram outros exportadores para encher o gasoduto.
A rentabilização desses gasodutos só será possível com a normalização das relações entre Moscovo e Bruxelas, processo que parece não estar para breve. Além de mais, é difícil ver onde a empresa de gás russa irá buscar dinheiro para concretizar esses e outros projectos gigantescos num momento em que a Gazprom não tem os cofres cheios. É de recordar que esta empresa pública russa tenciona também construir um gigante gasoduto que irá ligar a Sibéria à China e que Pequim só tenciona pagar quando começar a receber gás, o que deverá ocorrer em 2019.
Por isso, toda esta actividade mais não visa do que tentar recuperar a Ucrânia para a zona de influência russa. Se o Kremlin conseguir construir pelo menos a “Corrente Turca”, o sistema ucraniano de transporte de gás deixará de ser estratégico e Vladimir Putin vê nisso mais uma forma de chantagem económica sobre o país vizinho, de o obrigar a renunciar à opção europeia.
P.S. Torna-se cada vez mais preocupante a luta política no interior dos centros de decisão da Ucrânia. A decisão do Presidente ucraniano, Petro Porochenko, de demitir Valentin Nalivaytshenko, director dos Serviços de Segurança da Ucrânia, está a ser contestada por alguns dos seus apoiantes, que atribuem essa decisão ao facto de Nalivaytshenko ter começado a luta contra a corrupção na Procuradoria-Geral da Ucrânia. Estes duelos não ajudam nem a luta contra corrupção, nem o combate à crise económica no país.