O investimento que o país fez no ensino superior nos últimos 45 anos é notável. Hoje vivemos desafios societais complexos que só serão ultrapassados com mais e melhores políticas públicas promotoras do fortalecimento e da valorização do investimento na educação de forma transversal. Isto em total alinhamento com a visão do século XXI da Comissão Europeia para a transformação do ensino superior na Europa, que deve assumir quatro dimensões decisivas: ensino, investigação, inovação e serviços à sociedade.

Em tempos de crise, normalmente, tomamos decisões que se pagam muito caro a médio e longo prazo. Foi assim em 2011, quando o ensino superior foi desvalorizado, a escola pública atacada, as escolas superiores de educação desprezadas, a profissão de Professor absolutamente ignorada. Ou seja, foi passada a ideia de que existia ensino superior a mais, financiamento a mais e estudantes a mais.

Quem saiu a perder? O País, em particular as regiões mais pobres e fora dos grandes centros urbanos, com as pessoas socioeconomicamente mais frágeis a deixarem de ter forma de aceder ao ensino superior.

Nos governos liderados por António Costa voltámos a apostar em políticas públicas que foram capazes de gerar uma perceção social notável e justa da qualidade do ensino superior português, universitário e politécnico, quer a nível nacional quer internacional. Os resultados estão à vista: aumento do número de estudantes (nacionais e internacionais) no ensino superior e do orçamento das instituições; valorização das carreiras e das várias formações do ensino superior; maior participação em projetos europeus de investigação e inovação; financiamento específico para formação, investigação e inovação; participação e liderança em universidades europeias.

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O aumento do número de candidatos ao ensino superior tem vindo a aumentar de forma significativa no concurso nacional de acesso, com políticas que, não baixando a exigência e a valorização do mérito, foram determinantes. Estas, como deve ser, demonstram confiança nas escolas secundárias, bem como nas instituições de ensino superior (IES). Hoje, cada IES tem a liberdade para definir como critério de acesso às suas licenciaturas uma ou duas provas específicas, exercendo a sua autonomia com a aprovação da Direção Geral do Ensino Superior.

Atualmente, 75% dos cursos exigem apenas uma prova de acesso. Tomando como referência um ano pré-pandemia – 2019 -, quase 18 mil estudantes candidataram-se com apenas uma prova de acesso. Em 2019, foram 6 mil estudantes que apenas tiveram positiva em apenas um exame nacional. A exigência obrigatória de dois exames de acesso, retirando autonomia às IES, aparentemente, vai contra a visão política para o ensino superior dos governos de António Costa, que, mantendo o nível de exigência, defendem o aumento do número de estudantes e de diplomados, aumentando inclusive a base de acesso ao ensino superior. Na verdade, estes indicadores estão contratualizados com a Comissão Europeia e também especificamente com as IES, nomeadamente no âmbito do PRR.

Em 2022 candidataram-se ao ensino superior mais de 61 mil estudantes via concurso nacional de acesso. Com a proposta de tornar obrigatório dois exames de acesso, as projeções mais otimistas apontam para que, em 2025, passemos a ter um número de candidatos abaixo do número que existiu em 2018, ou seja, menos de 49 mil.

O impacto de tal medida, contraditória às políticas públicas assumidas desde 2015, é muito pior para as instituições pequenas e do interior, que poderão ter uma redução de cerca de 30%, colocando em causa a sua viabilidade, o que constitui a antítese das políticas de coesão regional que o país tem vindo a adotar nos últimos anos.

Por outro lado, uma das formas mais interessantes que foi criada para aumentar a base de estudantes no ensino superior foi através dos Cursos Técnicos Superiores Profissionais (TeSP). Hoje, são mais de 17 mil os estudantes nestes cursos superiores não conferentes de grau, que se revelaram também uma excelente forma de integração de estudantes internacionais, particularmente dos PALOP e da América Latina. Só foi possível valorizar os TeSP com um compromisso enorme dos Politécnicos, com políticas de financiamento relevantes, quer pelos fundos estruturais nas regiões de convergência quer pelo orçamento do Estado nas regiões de não convergência, mas também com um enorme esforço de empresas, municípios e instituições na criação de condições infraestruturais e financeiras. Não podemos permitir que nenhuma instituição de ensino superior politécnica encerre qualquer destes TeSP por falta de financiamento. São menos profissionais a colocar no mercado de trabalho, são regiões a perder competitividade, são menos estudantes do ensino profissional a chegar ao ensino superior, são menos estudantes a prosseguir para licenciaturas, são famílias frustradas cujos filhos ficarão amputados dos seus sonhos. E é Portugal a não cumprir os objetivos contratualizados com a Comissão Europeia.

Hoje, que estamos a discutir o financiamento do ensino superior, este é um tema que tem de ser considerado, bem como a equidade do financiamento entre Politécnicos e Universidades e a inclusão de fatores de coesão regional que contemple em particular as IES do interior e as instituições mais pequenas.

Por tudo isto, para continuarmos o caminho de valorizar o ensino superior, para que este continue como desígnio nacional, sendo uma afirmação de abril e permitindo o acesso a todos, em particular às famílias socioeconomicamente mais desfavorecidas, não podemos desacelerar o investimento no ensino superior.