Um mês depois do desafio, três semanas depois da resposta, o PSD resolveu adiar as conversas com o CDS para pôr no papel uma coligação pré-eleitoral nas próximas legislativas, disse ao Observador uma fonte da direção social-democrata.

“Estamos empenhados em permanecer como um factor de estabilidade”, diz a mesma fonte. “Por isso, queremos deixar o CDS à vontade para se definir, resolver os tabus internos sem interferências. A coligação tem que ser muito bem pensada, é melhor deixar o tema mais para a frente”, acrescenta ainda.

Na verdade, há na São Caetano quem garanta que muita gente no aparelho do partido começou a pensar duas vezes sobre as vantagens de uma coligação, falando de um CDS sem peso eleitoral suficiente para ser uma mais-valia. Mesmo na direção, cresce o incómodo com vários governantes centristas. Por “falta de solidariedade” na defesa das medidas mais difíceis, ou por mostrarem maior empenho em representar o país fora do que em “viajar cá dentro”.

Mas a lista dos dados que têm incomodado o PSD é mais longa e sensível.

(Re)começou logo depois das eleições europeias, quando o vice-presidente Marco António Costa foi à Rádio Renascença lançar o repto: “Seria útil se se pudesse olhar rapidamente para uma coligação para o futuro”. Alguns dias depois, a resposta viria fria: o CDS quer primeiro negociar o próximo Orçamento do Estado, depois se verá o resto. E outra, de Telmo Correia, lembrando que a decisão do CDS sobre uma nova coligação será tomada em referendo interno.

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Entretanto acumularam-se os sinais públicos de que a tensão pré-crise de 2013 estava a voltar. Visões diferentes sobre como responder ao chumbo do TC, sinais do CDS de que quer Marcelo Rebelo de Sousa na corrida para Belém (sabendo que Passos Coelho o vê como opção distante). Também problemas mais pequenos, como um travão do CDS a uma lei negociada na AR entre PSD e PS, perguntas incómodas da JSD ao ministro da Segurança Social sobre as mudanças nos estágios profissionais.

orçamento a caminho, marcação cerrada

Os temas mais sensíveis vieram esta semana e todos com o Orçamento em vista. A proposta da fiscalidade verde abriu a ‘Caixa de Pandora’. A proposta de um grupo de técnicos de aumentar vários impostos e taxas sobre produtos poluentes deixou o CDS irritado, com um pequeno sinal público vindo da bancada parlamentar. A palavra “agressões”, usada pela deputada Cecília Meireles, mereceu resposta e desafio de um deputado do PSD. Cuidadosamente lembrando que só ganhando receita de um lado seria possível reduzir o IRS em 2015, uma reclamação que o centrista Pires de Lima, ministro da Economia, repete à exaustão.

E, por fim, esta semana: Passos Coelho tinha pedido um relatório a peritos com sugestão de medidas para aumentar a natalidade, um tema caro ao PSD. Uma das principais recomendações era uma redução de IRS para as famílias com filhos. No mesmo dia, antes da apresentação, surge uma outra notícia a dar conta de outro relatório, este pedido pelo Governo, para reformar o IRS, dando conta precisamente de uma sugestão igual (ou parecida). Um detalhe, que não é de somenos: a equipa que está a estudar a reforma do imposto foi constituída por Paulo Núncio, o centrista que é secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, e tem entre os peritos um vice-presidente do CDS, Diogo Feio. No PSD acredita-se que a notícia foi antecipada para esvaziar a ‘boa notícia’ que Passos anunciaria à tarde.

A ‘conversa’ foi até mais longe: na conferência de imprensa, o primeiro-ministro avisou que medidas como a baixa do IRS só avançarão se houver outras para as compensar do ponto de vista orçamental — e sem “pressa”. E o CDS não tardou na resposta: os incentivos à natalidade têm de vir mesmo em 2015.

Com tantos dossiês em aberto, a decisão sobre as negociações da coligação chegou. “Maio é um bom mês”, diz agora um influente social-democrata.