“Até agora o que tem havido são juízos preconceituosos, precipitados. Sabe que eu, em toda a minha vida, me bati contra autos-de-fé e contra julgamentos no pelourinho”, é assim que Daniel Proença de Carvalho, o advogado de Ricardo Salgado, avalia o caso BES e tudo o que tem sido dito e escrito sobre o assunto desde a derrocada do banco e e do Grupo Espírito Santo e o afastamento de Salgado da administração.

Numa extensa entrevista ao Diário Económico, Proença de Carvalho – que foi também presidente da Comissão de Remunerações do BES, diz e repete ser “ainda prematuro fazer um julgamento do que se passou”. “É preciso ouvir as várias narrativas de todos os protagonistas. Temos de aguardar o próprio processo que ainda não terminou para, com tempo e serenidade e depois de haver um verdadeiro contraditório, podermos emitir um juízo”.

Mas isso não o impede de deixar, em alguns passos da entrevista, um primeiro contraditório – mesmo referindo que é cedo para preparar a defesa de Salgado nos tribunais (“ainda nem há acusação”, alega). Como a passagem em que avalia o governador do Banco de Portugal e as suas decisões: “Ainda é muito cedo para formar um juízo sobre o comportamento dos reguladores, designadamente do Banco de Portugal. É preciso ouvir todos os factos, conhecer todas as versões e acho que as setas para cima e para baixo que apareceram nos jornais a propósito do Dr. Carlos Costa… Os jornais também foram protagonistas relevantes e essas setas podem ter-se revelado prematuras (…) e precipitadas”. Quanto à decisão de separar o BES num ‘band bank’ e um Novo Banco, merece o seguinte comentário ao advogado: “Não posso tomar posição. Reservo essa opinião sobre a solução, aliás inovadora e experimentalista, para mais tarde.”

Avalia também os comentadores que diz ter ouvido na televisão: “Quem ouviu os comentários televisivos apelando… Vi aqui resquícios do que aconteceu no PREC em 1975. Confesso que vejo isso com pena, porque uma democracia civilizada e madura deve evitar procedimentos desse tipo.”

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Advogado de “muitas pessoas com relevo”, nas suas próprias palavras, Proença de Carvalho admite ter indicado (entre três nomes) também o de Paulo Mota Pinto, deputado do PSD, para chairman do BES, numa nova solução que acabou por não se concretizar após a resolução aplicada pelo Banco de Portugal. Diz que o que aconteceu depois no banco foi “uma surpresa” para si, “totalmente imprevisível”. “Houve um conjunto de circunstâncias, umas imputáveis à gestão, outras aos reguladores, outras a outros protagonistas, que geraram em determinado momento perda de confiança da parte de clientes e de acionistas. O banco mais sólido teria soçobrado, perante essa perda de confiança”, explica o advogado.

A entrevista, conduzida por dois ex-diretores do Económico, Sérgio Figueiredo e Paulo Ferreira, passa também por críticas ao funcionamento da Justiça (“um dos grandes falhanços da nossa democracia”. Onde o advogado de Salgado diz, “em termos abstratos”, que “quando a opinião pública e a publicada exigem qualquer coisa, a Justiça vê-se na obrigação de fazer qualquer coisa.”

Mas vai mais longe: “O Ministério Público tem as polícias ao serviço para investigar e tem meios de investigação poderosíssimos, com escutas telefónicas, buscas de todo o tipo”. Se assimetria existe, garante, “é em desfavor da defesa. Todas as reformas do processo penal feitas desde o 25 de Abril de 74 foi para tirar direitos à defesa. Havia mais direitos da defesa quando comecei a minha vida profissional.”.

E ainda por críticas às decisões do Tribunal Constitucional, às suspeitas públicas lançadas sobre altas individualidades angolanas (“O que aconteceu e foi muito negativo para nós. Foi em prejuízo dos portugueses. A nossa relação com os países lusófonos tem uma importância estratégica e tudo devia ser feito para que não fosse prejudicada. E isso prejudicou”.)

A entrevista termina com uma parte dedicada à Controlinveste, grupo de comunicação que agora lidera. Promete “ambições de crescer” e uma estratégia para o grupo: “Tornar os jornais de referência, o ‘Jornal de Notícias’ e o ‘Diário de Notícias’, com credibilidade, força, independência, sem maniqueísmos, procurando naturalmente defender os valores da democracia política e da liberdade económica. Não fazer campanhas contra quem quer que seja, afirmar princípios que são comuns, não ter posições partidárias.”