“Parece que sou muito bom a matar pessoas. Não sabia que ia ser um dos meus pontos fortes”. A ‘confissão’ de Barack Obama à sua equipa mais próxima terá acontecido a 30 de setembro de 2011, já depois da morte de Osama Bin Laden, em referência ao ataque que provocou a morte a Anwar al-Awlaki, numa altura em que Obama começava a preparar a campanha para a sua reeleição.
Anwar al-Awlaki, era uma das principais caras da Al-Qaeda no Iémen e esteve envolvido ou serviu de inspiração a grande parte dos atentados da última década no mundo ocidental. Era cidadão norte-americano.
“Eu fui enviado pela al-Qaeda no Iémen. Eu fui lá e o Sheikh Anwar al-Awlaki pagou a minha viagem”. Estas foram as palavras de Cherif Kouachi, um dos irmãos que esteve no ataque ao Charlie Hebdo – que provocou a morte de 12 pessoas -, na sexta-feira em entrevista a uma televisão francesa, enquanto estava cercado. Said Kouachi, o outro irmão, também terá passado vários meses no Iémen em 2011, onde foi treinado pela al-Qaeda, segundo os responsáveis norte-americanos.
Os Estados Unidos acreditavam (como o disse Obama) que al-Awlaki era o líder das operações externas da al-Qaeda na península arábica e, mesmo três anos depois da sua morte Anwar al-Awlaki continua a ser um dos grandes instigadores e inspirações dos atentados terroristas nos países ocidentais. Siga a lista de alguns desses casos.
O atentado na Maratona de Boston
A 15 de abril de 2013, os irmãos Tamerlan e Dzhokhar Tsarnaev, nascidos em antigas repúblicas soviéticas e a viver nos Estados Unidos desde cedo, fizeram explodir duas bombas perto da linha de chegada da maratona de Boston. Três espetadores morreram, 260 pessoas ficaram feridas. Quatro dias depois de uma intensa caça ao homem, Dzhokhar foi preso. O seu irmão Tamerlan morreu numa troca de tiros com as autoridades.
Dzhokar Tsarnaev, foto divulgada pelo FBI.
Os investigadores contam que quando foi interrogado ainda no hospital, na sequência da sua detenção, Dzhokar terá dito a agentes do FBI que ele e o seu irmão foram influenciados pelos sermões que Anwar al-Awlaki disponibilizava na internet. Dzhokar Tsarnaev está a ser julgado e pode ser condenado à pena de morte.
Ataque ao centro de recrutamento em Little Rock, EUA
A 01 de junho de 2009, Carlos Bledsoe disparou com uma arma semi-automática sobre um centro de recrutamento em Little Rock, no Arkansas, atingindo dois soldados. Um deles morreu. Depois dos ataques, Carl Bledsoe admitiu que a sua inspiração espiritual seria al-Awlaki.
Carl Bledsoe esteve a estudar árabe no Iémen, casou com uma iemenita, foi preso e deportado por permanecer no país com um visto fora de prazo. Recentemente, Carl Bledsoe – agora Abdulhakim Mujahid Muhammad – enviou uma carta ao juiz que está a julgar o seu caso, onde diz que é membro da al-Qaeda na península arábica, o mesmo grupo de al-Awlaki – e pediu para se considerar culpado.
Ataque em Fort Hood, Texas
Nidal Hasan era psiquiatra no exército norte-americano. A 05 de novembro de 2009, decidiu atacar a base militar onde trabalhava no Texas. O resultado foi o ataque mais mortífero a uma base militar em solo norte-americano: 13 pessoas morreram, mais de 30 ficaram feridas.
As autoridades tiveram conhecimento de 18 emails enviados a al-Awlaki no Iémen, que não organizou o ataque mas serviu de inspiração. Recentemente, Nidal Hasan enviou uma carta ao líder do Estado Islâmico, Abu Bakr al-Baghdadi, onde pedia para ser integrado no califado. Foi condenado à morte e aguarda pela sua execução.
Nidal Hasan, ainda com o uniforme do exército dos EUA
O avião que não explodiu no dia de Natal
Umar Farouk AbdulMutallab é oriundo de uma família abastada da Nigéria (o seu pai era um banqueiro conhecido) e tinha apenas 23 anos quando a 25 de dezembro de 2009 tentou fazer explodir o avião em que viajava sobre o Detroit.
Umar Farouk ficou gravemente ferido no atentado falhado
O voo 253 da Northwest estava a chegar a Detroit, oriundo de Amsterdão, quando AbdulMutallab tentou fazer explodir uma bomba que tinha escondida na sua roupa interior. O dispositivo falhou e o nigeriano foi dominado por um dos passageiros. AbdulMutallab tinha estado no Iémen pouco antes, onde jurou lealdade à al-Qaeda. O ataque foi ordenado por al-Awlaki.
Mas quem era al-Awlaki?
Anwar al-Awlaki terá sido o primeiro cidadão norte-americano alvo do programa de mortes da CIA (decisão justificada em tribunal pela administração norte-americana), através de um ataque com drones quando se encontrava numa casa no Iémen, onde se fez rodear de dezenas de crianças.
Nascido em 1971 em Las Cruces, no Estado do Novo México, nos Estados Unidos, Anwar al-Awaki foi viver para o Iémen, de onde era oriunda a sua família, mas regressou aos Estados Unidos para terminar a escola e para frequentar a Universidade do Colorado, onde se licenciou em engenharia.
Em 1995, mudou-se para San Diego, onde assumiu o lugar de clérico na mesquita de Al-Rribat. Nessa mesma altura, ainda terminou um mestrado na Universidade de San Diego em Educação. Foi também em San Diego que encontrou dois homens que ficarão para sempre na história: Khalid al-Mihdhar e Nawaf al-Hazmi, dois dos cinco homens que sequestraram o voo 77 da American Airlines e que o despenharam contra o Pentágono, como parte dos ataques de 11 de setembro de 2001.
Midhar e Hazmi morreram no ataque em que fizeram despenhar um avião comercial contra o Pentágono
Al-Awlaki chegou mesmo a passar um cheque de 175 dólares a estes dois terroristas três meses antes do 11 de setembro, mas as autoridades, que vigiavam Midhar e Hazmi, e que passaram a tratar al-Awlaki como uma pessoa suspeita e que merecia mais atenção, não conseguiram encontrar ligação com os atentados.
Em 2002, quando estava a fazer o seu doutoramento na Universidade de George Washington, em Washington, decidiu abandonar o país e foi para Londres. Esteve lá dois anos até ir finalmente para o Iémen, onde se tornou um dos principais líderes religiosos da al-Qaeda, especialmente na parte que falava inglês. Ser fluente na língua e ser um religioso deu-lhe maior projeção e, depois de estar preso no Iémen onde também recebeu visitas do FBI, endureceu o discurso.
Foi aí que Anwar al-Awlaki passou a ser abertamente considerado como um membro da al-Qaeda. Os sermões na Internet e as publicações digitais em inglês davam-lhe um acesso ao mundo islâmico sem precedentes. Das 250 pessoas acusadas de atividades terroristas com ligação ao Islão nos Estados Unidos desde o 11 de setembro, pelo menos 62 tinham ligações com as publicações e sermões de al-Awlaki, ou citavam-no como influência, e outros seis tinham mensagens trocadas ou tinham estado no Iémen com al-Awlaki.
Foi depois da tentativa de fazer explodir o avião que viajava de Amsterdão para Detroit, a 25 de dezembro de 2009, que a administração norte-americana decidiu que Anwar al-Awlaki seria um alvo do seu programa de assassinatos.
Pouco depois, no verão de 2010, a al-Qaeda no Iémen publica a primeira edição da sua revista em inglês, a Inspire. Essa edição tinha uma lista de pessoas a matar por terem ofendido o Islão, e entre eles estavam, por exemplo, Flemming Rose e Kurt Westergaard, o editor e o autor dos cartoons do profeta Maomé publicados na Dinamarca em 2005.
Os sermões de Anwar al-Awlaki ainda estão disponíveis no Youtube
“Vamos instigar, vamos bombardear e vamos assassinar”, dizia Anwar al-Awlaki.
Al-Awlaki é também conhecido pelas suas publicações escritas em inglês, onde dava orientações sobre como melhor apoiar a causa da guerra santa, como é o caso da “44 Ways To Support Jihad”, um guia de apoio que também se encontra facilmente na Internet.
A morte de al-Awlaki chegaria graças a informações recebidas apenas três dias depois da morte de Osama Bin Laden.