A Justiça bloqueou 106 operações financeiras no valor total de 91,77 milhões de euros, em 2014 e 2015, por suspeita de que aquele dinheiro tinha origem em atividades ilícitas, disse a Procuradoria-Geral da República (PGR).

De acordo com os dados cedidos à Lusa, quando se completam dois anos sobre as regras do Banco de Portugal que reforçaram os sistemas de alerta à Justiça em caso de suspeita de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, em 2014 foram recebidas 2.903 comunicações por parte dos bancos que operam em Portugal e instaurados 60 inquéritos.

Em resultado dessas averiguações foram bloqueadas, por ordem das autoridades, 43 operações bancárias que continham 34,2 milhões de euros e 2,2 milhões de dólares (1,97 milhões de euros à taxa de câmbio atual).

Este valor significou um aumento face a 2013, ano em que o Departamento Central de Investigação e Ação Penal bloqueou 19,8 milhões de euros e 10,1 milhões de dólares (9,06 milhões de euros) em 39 operações.

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Já em 2015, foi ainda maior o montante ‘congelado’ pela Justiça: 47,1 milhões de euros e 9,5 milhões de dólares (8,5 milhões de euros).

O valor bloqueado no ano passado aconteceu na sequência de os bancos terem efetuado 3.865 comunicações, o que levou à instauração de 64 inquéritos e à suspeita sobre 63 operações bancárias.

Há dois anos, a 16 de fevereiro de 2014, entrou em vigor o aviso do Banco de Portugal que obrigou os bancos a adotarem medidas de vigilância mais restritivas contra a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo. Na altura os bancos falaram das dificuldades com que se confrontavam para ter prontos a tempo e horas os procedimentos de controlo interno exigidos pelo supervisor.

A Lusa contactou o Banco de Portugal e a Associação Portuguesa de Bancos (APB) para saber como tem corrido a adoção destas regras, mas não obteve comentários.

Entre as novas obrigações que entraram em vigor a 16 de fevereiro de 2014, os bancos passaram a ter de identificar (nome e dados do cartão de identificação) quem pretenda depositar dinheiro numa conta a partir de 10.000 euros, mesmo que através de várias operações.

No caso das transferências bancárias a partir de 15.000 euros – quer sejam feitas só numa operação ou em várias operações relacionadas entre si – tem de haver um registo centralizado com a data e o valor de cada operação e a identificação do cliente bancário.

Além disso, os bancos passaram ainda a ter de identificar quem deposite pelo menos 5.000 euros numa conta que não é sua se os sistemas internos de alerta indiciarem suspeitas de “risco elevado” de branqueamento de capitais ou de financiamento ao terrorismo.

A prevenção dos crimes de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo tem ganhado, nos últimos anos, a atenção dos países europeus, tendo saído várias diretivas da União Europeia a estabelecer novas regras e a harmonizar os procedimentos.

No caso de Portugal, os bancos, mas também empresas de investimento ou sociedades gestoras de fundos de pensões são obrigados a informar o Ministério Público e a Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária (PJ) em caso de transações e atividades financeiras suspeitas.

Quando essas entidades fazem uma comunicação, o Ministério Público e a PJ acedem à informação e fazem as diligências necessárias, podendo abrir um inquérito para prosseguirem as investigações e, em caso de suspeita forte, bloqueiam as operações e o dinheiro em causa. Caso não haja indício de crime, o caso é arquivado.

Atualmente há uma nova diretiva europeia para afinar ainda mais a malha nestes casos. Esta legislação obriga os países a criarem registos centrais e os bancos, assim como outras entidades financeiras, consultores fiscais, auditores, advogados e até agentes mobiliários e casinos, a reforçarem os deveres de vigilância.

A diretiva aumenta ainda a proteção dos denunciantes, para evitar que funcionários que comuniquem atividades suspeitas sejam vítimas de ameaças ou atos hostis, e também aumenta a vigilância sobre “pessoas politicamente expostas”, caso de políticos, por considerar que podem representar um risco mais elevado de corrupção pelas funções públicas exercidas.

Esta legislação europeia tem de ser transposta para o Direito nacional até 26 de junho de 2017, mas há informações de que a sua entrada em vigor pode vir a ser antecipada.

O Grupo de Ação Financeira GAFI, que avalia a nível internacional os padrões contra o branqueamento de capitais, considera que os recentes ataques de Paris, em França, e o combate ao autodenominado Estado Islâmico criaram a necessidade de reforçar as medidas contra a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo e de aumentar a troca de informações internacionais, com o objetivo de descobrir antecipadamente atividades criminosas.