Começou hoje o Europeu de futebol. A nossa seleção, que tem o seu primeiro jogo na terça-feira, parte com a confiança em alta, depois da vitória por 7-0 frente à Estónia. Mas vamos deixar o tema desportivo para a devida secção do Observador.

Na quarta-feira, antes de ter início o último jogo de preparação, Pedro Abrunhosa pisou o relvado do Estádio da Luz para cantar o hino que embala a Seleção para a sua campanha em França. Mas, ao contrário do sucesso unânime do seu álbum “Viagens”, tripla platina em 1994, onde figurava o original “Tudo o que eu te dou”, a adaptação agora encomendada pela Federação Portuguesa de Futebol não foi do agrado de todos, a julgar pelos comentários no Facebook. Houve quem achasse que a canção, a embalar, seria mais para a caminha.

A escolha de uma canção oficial de apoio à Seleção Nacional de futebol é um tema recorrente. De dois em dois anos, antes de cada Mundial ou Europeu, não falta criatividade para transformar em música a ambição de ver os jogadores das quinas a levantar a taça. A mais popular dessas criações é o mítico “Bamos lá cambada” de Herman José, cantado em 1986 pela sua personagem José Estebes, com a ajuda de Luís Represas, Alexandra, Dany Silva e Carlos Paião, o autor da música. Existe até um grupo no Facebook que defende que este devia ser o hino oficial da Seleção, mas, apesar de a sua letra ainda hoje estar na memória de todos, a campanha portuguesa no Mundial do México não foi a mais famosa.

Em 2004, com a euforia instalada por Portugal ser o país anfitrião, os adeptos dividiram-se entre a música “Força“, de Nelly Furtado, que era o hino oficial da competição, e o bem-humorado rapMenos Ais“, lançado pela Galp. A boa energia quase funcionava na perfeição, não fosse a derrota com a Grécia na final. Passados dois anos, a marca voltaria a lançar a música, com nova letra.

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Embora uma pesquisa no YouTube revele dezenas de músicas de gosto duvidoso que têm como tema o apoio à Seleção, nos últimos campeonatos nenhuma ganhou uma notoriedade especial nas gargantas dos adeptos. Em 2012, um hino da Adidas teve a participação dos jogadores patrocinados pela marca, mas nada se compara ao que hino da Seleção Sub-21 que foi campeã do mundo em 1991.

O Mundial de Juniores de 1991

Recuemos então ao ano da segunda maioria absoluta de Cavaco Silva. Longe da dimensão da Expo 98 ou do Europeu de 2004, a organização do Campeonato do Mundo de Sub-21 em Portugal gerou uma onda de entusiasmo pelo país. A equipa liderada por Carlos Queiroz tinha conquistado o título de campeã mundial dois anos antes, na Arábia Saudita, e propunha-se revalidar o estatuto frente aos seus adeptos.

Talento futebolístico não faltava, com vários jogadores que se tornaram vedetas internacionais e que foram fundamentais na seleção principal, na década e meia que se seguiu, casos de Figo, Rui Costa e Fernando Couto. Mas a ideia do massagista

Vale a pena reparar nos pormenores. A equipa técnica, identificada pelos polos cor-de-rosa, era quase unânime no uso de um frondoso bigode. Em 1991, ainda com o colorido dos anos 80 a ditar modas, o fato de treino às riscas sobre o polo violeta dos jogadores era um must. E o que dizer dos penteados de Rui Costa, Luís Figo ou Emílio Peixe, que foi eleito o melhor jogador do torneio?

A candura da letra também é notável: “O futebol é para nós a nossa festa / Foi com ele que aprendemos a sorrir / Fazemos golos com os pés e com a testa / Vamos em frente, não podemos desistir.” Mais ainda na segunda estrofe: “Neste mundo de injustiças e de guerras / Nós escolhemos a melhor situação / Viver em paz, amor e harmonia / No seio da nossa Seleção.” Quase lembra o Coro de Santo Amaro de Oeiras no Natal dos Hospitais.

A verdade é que as vozes que se ouvem na gravação não são exatamente as de todos os jogadores, como contou ao DN José Manuel Catoja, fisioterapeuta dos campeões e autor do hino “Todos Somos Portugal”. A canção foi ensaiada pelos jovens futebolistas durante meses, para vir a ser gravada nos estúdios Tchatchatcha, de Ramón Galarza. Mas, com exceção de alguns mais afinados, como Abel Xavier, a voz da maioria dos jogadores foi retirada na edição final.

Com mais ou menos playback, a verdade é que este hino, que era passado várias vezes nos intervalos da RTP, empurrou a Seleção numa campanha vitoriosa até à final de 30 de junho, num Estádio da Luz completamente lotado.

João Vieira Pinto, campeão do mundo sub-20 em Riade e Lisboa, é hoje o Diretor da Federação Portuguesa de Futebol para a Seleção Nacional. E já se sabe que no futebol não faltam superstições, por isso aqui fica a nossa sugestão: não seria má ideia marcar um estúdio em Marcoussis e pôr os jogadores a cantar o hino.