O IGCP fechou, nesta quarta-feira de manhã, as condições da primeira emissão de dívida de 2017 e publicou ao final da tarde as informações mais relevantes. Numa operação montada por um conjunto de bancos internacionais, a primeira deste género desde há quase um ano, o Tesouro português emitiu três mil milhões de euros com uma taxa a rondar os 4,2%.
O IGCP ofereceu 352 pontos base acima das taxas de referência na zona euro (as chamadas mid swaps) para a maturidade em causa, ligeiramente abaixo dos 360 pontos que começou por oferecer. Somando às taxas de midswaps, a rendibilidade destes títulos, para quem os comprou na emissão, será de 4,227%. No que diz respeito ao juro fixo anual que será pago, esse é de 4,125%.
Trata-se do custo de financiamento (a 10 anos) mais elevado desde fevereiro de 2014, quando a troika ainda estava em Portugal e o país conseguiu terminar o programa sem necessitar, sequer, de um programa cautelar. O Tesouro português chegou a pagar 2% para se financiar a 10 anos (leilão em fevereiro de 2015).
Com esta emissão de três mil milhões de euros, o Tesouro português já garante um quinto das necessidades de financiamento do Estado, isto no que diz respeito à emissão de obrigações do Tesouro (o principal instrumento, a que se juntam outros como os bilhetes do Tesouro e o aforro no retalho). O IGCP prevê emitir entre 14 mil milhões e 16 mil milhões de euros através de obrigações do Tesouro.
Ao inaugurar uma nova linha de obrigações, com maturidade em abril de 2027, o IGCP está, também, a criar margem para que o Banco Central Europeu (BCE) vá recolher no mercado até um terço dos títulos em causa. O programa de compras de dívida impõe a si mesmo o limite de o BCE não ser dono de mais de 33% dos títulos em cada linha de obrigações (o Estado tem várias linhas vivas), o que no caso de Portugal e de outros países já se tem vindo a tornar um constrangimento.
Segundo o IGCP, a procura total ascendeu aos 8,5 mil milhões de euros, pelo que foi satisfeito cerca de um terço da procura. Mais de 250 investidores participaram. Mais de 60% dos investidores vêm do Reino Unido, de França, Itália e Espanha, com a habitual preponderância de gestoras de ativos — o que se deve ao rating baixo da dívida portuguesa. Investidores mais conservadores como seguradoras e fundos de pensões só ficaram com um em cada dez títulos.
Este juro de 4,2% compara com a taxa inferior a 3% que se pagou no início de 2016 para emitir dívida a 10 anos. E, além disso, nessa altura colocaram-se quatro mil milhões de euros, 25% mais do que os três mil milhões emitidos nesta quarta-feira.
Na emissão de 2016, apesar do montante maior, pagou-se 205 pontos base acima das taxas de mercado, muito abaixo dos 352 que foram oferecidos.
A emissão de janeiro de 2016 aconteceu antes de a Fitch Ratings ter decidido, em março, deixar de atribuir uma perspetiva positiva ao rating português, o que tornava mais provável que a notação saísse de lixo e Portugal deixasse de depender apenas da agência DBRS. Desde então, o apetite dos investidores internacionais pela dívida portuguesa tem oscilado ao sabor das indicações sobre se a DBRS irá manter o rating, se o BCE irá comprar mais ou menos dívida nacional, se o apetite global dos investidores por obrigações irá subir ou descer e, finalmente, sobre as questões de política interna e o escrutínio ao governo liderado por António Costa.
Analista: Juros mais caros, “razão para cautela, não para alarme”
O diretor de gestão de ativos do Banco Carregosa, Filipe Silva, afirma em reação difundida esta tarde que a subida dos juros em relação ao ano passado são “razão para cautela, não para alarme”.
“Já se esperava uma taxa acima dos 4% e até saiu um pouco mais baixa do que se antevia [4,227%, calcula o especialista], portanto não foi surpresa e, nesse sentido, correu bem. Aliás, por ser uma operação sindicada, estava garantida à partida”, afirma o especialista.
Filipe Silva diz, contudo, que “devemos realçar que a taxa saiu acima do custo médio da dívida portuguesa (que é de 3,4%), por isso, vem encarecer as condições em que o país se financia”. Contudo, “o facto de estar acima dos 4% não é novo – tivemos essa taxa em março e no último trimestre, de 2016. Se compararmos com a taxa de há um ano, de janeiro de 2016, a diferença é bastante maior. Nessa altura emitimos dívida a 10 anos com uma taxa de 2,875%. Ou seja, o risco, num ano, subiu. É caso não para alarmes, mas para cautela.”
Antes deste leilão, o Observador entrevistou um dos mais prestigiados analistas de dívida pública da City londrina, Richard McGuire, do Rabobank. O especialista diz que Portugal está vulnerável em relação aos riscos “sistémicos” que assolam a Europa e receia que o BCE não vá comprar dívida pública suficiente para evitar a subida dos juros.