Fechado por ora o episódio das presidenciais brasileiras, regresso a casa com a abertura oficiosa da campanha para as legislativas de 2015 marcadas – espera-se – para a sua data constitucional. A pouco menos de um ano, o lançamento foi dado por António Costa com mais um passo no sentido da sua entronização como líder do PS. Prudentemente, vai avançando com a apresentação de sucessivos programas de governo onde vai testando o que pode e não pode prometer. Trata-se de acautelar a vitória eleitoral ao menor custo possível e, se possível, com maioria absoluta a fim de não ter que dividir os despojos com ninguém. Depois se verá.

Conforme tenho mantido, as coisas não dependem dele como também não têm dependido do actual governo, mas sim da forma como a Alemanha e o resto da União Europeia têm vindo a acompanhar a grande depressão económica, da qual nenhum país saíu ainda verdadeiramente, tirando porventura a China e o pequeno combóio de «emergentes» que ela puxa. Portanto, quem aspira a um rápido regresso ao antigamente, bem poderia agradecer que o país não hoje esteja tão mal como se julgou que seria o caso quando Sócrates pediu o apoio dos credores perante a bancarrota iminente em 2011…

Pelas comedidas promessas do novo líder com que os jornais se encheram, percebe-se que António Costa começou a deitar contas à vida e que escutou as palavras do actual ministro da Economia quando este lhe recomendou «nããão cedaaa». Para já, deitou pela borda fora várias das promessas feitas pelo seu rival alegadamente pouco firme contra o governo, António José Seguro. E lá se vão a redução do IVA para a alimentação assim como a revisão do simbólico «mapa judiciário», para não falar do regime de incompatibilidades dos deputados.

Do resto, sobressaiem dois tipos de pretensas medidas. O primeiro é um clássico socialista: uma «agenda para a década», provável reedição de uma dessas «estratégias socialistas» que foram ficando pelo caminho. Desde Guterres que este engodo se tornou típico: quando não se sabe o que fazer hoje, repesca-se a gazua do planeamento e projecta-se o futuro para daqui a dez anos! A ideia dos orçamentos plurianuais, que de resto Portugal já teve sob a forma dos esquecidos PIDDACs, é uma variante dessa propensão natural do PS para adiar as dificuldades para o longo prazo… Quanto às reais necessidades de financiamento da economia no sentido do crescimento desejado por todos, afinal verifica-se que o PS se servirá, banalmente, do novo «Banco de Fomento» que o governo actual tem vindo a montar com a consabida falta de dinheiro! A segunda linha de promessas vem da experiência do presidente da Câmara de Lisboa, mas pouco augura de diferente dos pobres resultados das «bolsas de alojamento» perante a crise agónica do imobiliário: construção civil parada; prédios devolutos a cair de podres; super-abundância de casas para venda, com a respectiva desvalorização patrimonial dos bens da tal classe média que os governos anteriores andaram a insuflar com dívidas!  

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Sobre fiscalidade, nada. Quanto à reposição dos «cortes» aos funcionários e pensionistas, idem. Brilha aliás pela ausência uma palavra que seja sobre a questão financeira mais imediata que se coloca ao país, a saber, as reformas e pensões, que são de longe a maior rubrica da despesa pública. Em compensação, no que diz respeito à questão demográfica, agora intitulada «parentalidade» para que ninguém perceba do que se está a falar, a moção não teve sequer imaginação para encontrar palavras diferentes da actual coligação, quando esta fala em «remover os obstáculos à natalidade», transformando uma questão social da maior complexidade num exercício de vantagens fiscais que só poderá beneficiar os mais abonados…

Esperava-se ao menos uma solução original para resolver o intratável «problema da dívida», isto é, o facto de não termos economia que chegue para os nossos gastos. Ora, a proposta é ainda mais risível do que um pedido de «resgate da PT» que circula por aí. Numa frase: «concertação com a União Europeia». E como havia ser se não em concertação com a UE? E o que fazer entretanto? Sobretudo, tendo o líder prometido não sair do «euro»? Era isto que o eleitorado gostaria de saber. Ficará porventura para a próxima. Temos tempo e, se António Costa já compreendeu que tem de medir com cuidado as promessas que o seu partido andava a badalar, isso deixa mais espaço para o actual primeiro-ministro mostrar aquilo que teve possibilidade de fazer e propor o que pretende para o futuro.

Por fim, mais frustrante do que aquela não-proposta, só a pretensa reforma política. Com este PS, estaremos a discutir as mesmas coisas daqui a cinco anos. É esta, porventura, a chave de todos os outros impasses, que a actual coligação governamental também não conseguiu ultrapassar, desde logo porque não teria o apoio de 2/3 dos constituintes, como o PS também não terá. A ideia de ressuscitar o voto uninominal, além de reaccionária, é tão vã hoje como foi há duas décadas, quando o governo Guterres andou a financiar projectos que felizmente foram parar ao lixo!