Numa primeira análise aos resultados eleitorais, escrevi ontem que “o PSD não apenas perdeu estas eleições, como desistiu de as ganhar logo à partida quando recusou uma aliança com os democratas-cristãos [em Lisboa]. E, com essa decisão fatal, começou também a perder as eleições legislativas, arrastando a direita para um beco sem saída. É que, como se viu, a direita vale pouco (ou muito menos) separada. Agora que isso ficou exposto ao país, ao mesmo tempo que a distância entre PSD e CDS se acentuou, ficou mais difícil de acreditar que o prometido novo ciclo político do pós-autárquicas não será mais do que a consagração do PS.” Ou seja, a noite eleitoral seria a de uma derrota da direita.

Essa é a primeira parte da história: a incapacidade de entendimento com o CDS foi fatal em Lisboa e será mortal nas eleições legislativas. Perante a união de todas as esquerdas no apoio de um governo PS, a direita só pode competir se se apresentar una e com um projecto comum – que respeite, obviamente, as diferenças entre os partidos, mas que permita a construção de uma alternativa reformista. Se a direita continuar dividida e incapaz de estabelecer-se como motor reformista do país (com ideias inovadoras por sector), estará a entregar o país ao PS. É, portanto, fundamental que o traumático resultado do PSD em Lisboa (mas também por todo o país), após um pouco claro processo de negociações falhadas com o CDS, não perturbe a relação dos dois partidos e não contamine entendimentos futuros. O pior que CDS poderia fazer seria acreditar que pode dispensar o PSD. E o pior que PSD poderia fazer seria repetir o erro e desistir de ganhar as eleições legislativas logo à partida.

A segunda parte da história é o colapso da própria estratégia política do PSD. O partido tem como projecto nacional convencer para a mudança um país que, nestas eleições autárquicas, provou não o querer ouvir. E, em boa verdade, nem os sociais-democratas deram aos portugueses argumentos para isso, optando por uma estratégia de oposição ao governo que está a falhar e candidaturas fracas em municípios-chave destas eleições autárquicas. Sim, fazer oposição num contexto de crescimento económico é sempre difícil. Mais ainda o é se, pela primeira vez, a oposição estiver limitada à direita, sem o poder de fogo de PCP/BE no parlamento e nas ruas. Mas, em vez de resignação, isso significa que o PSD tem de afinar a sua mensagem e melhorar nas formas de a comunicar.

Ao contrário do que tanta gente acredita e discutirá por estes dias, isso não significa que Passos Coelho deva cair ou sequer que a indefinição estratégica se resolverá através de uma mudança de liderança. Significa apenas que, sem uma outra estratégia, o PSD perderá as legislativas de 2019. Parece simples dito assim, mas é realmente complicado. Sim, a liderança importa. Haverá, por certo, muitas sentenças de morte política a Passos Coelho nestes próximos dias – e os piores resultados autárquicos de sempre justificam-nas. Mas o que importa ainda mais é perceber-se que o vazio de ideias do PSD desde 2015 está na raiz deste fracasso. Qual é a alternativa para esse vazio de ideias? Por enquanto, ninguém sabe. E se é fácil indicar potenciais sucessores a Passos Coelho, por mais voltas que se dê, apresentar caras novas não chega para preencher esse vazio.

O tal novo ciclo político que Marcelo prometeu para após as eleições autárquicas tem tudo para ser a consagração do PS, que alcançou a sua maior vitória autárquica de sempre. As legislativas estão à espreita. O CDS mostrou-se pronto e motivado para olhar o futuro de frente. Mas, sem o PSD, tudo isso servirá de pouco, porque não abrirá as portas de São Bento. Assim, ao PSD, resta a opção de aceitar ou não o aviso destas eleições: se não tentar ganhar as eleições legislativas, tal como não tentou ganhar as autárquicas, perdê-las-á com estrondo. E perderá a confiança do eleitorado de direita que, não se revendo no actual governo, aguarda por uma alternativa.

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