Depois da aprovação da nova tabela salarial do Estado, prevista para o Conselho de Ministros desta quinta-feira, o primeiro-ministro tenciona enviar para o Presidente da República um pedido formal, explicando ao chefe de Estado as razões pelas quais o Governo entende ser necessário o seu pedido de fiscalização preventiva dessa tabela e também dos novos cortes sobre as pensões. A ideia é fazer um “pedido público”, que sirva de justificação ao chefe de Estado para atuar. Embora o método não esteja fechado, o Observador sabe que a ideia de uma carta é bem vista em S. Bento – Passos é um formalista e crê que esta é a maneira certa de o fazer.
“É importante explicar por que é que estamos a fazer as coisas assim: a incerteza que ficou criada, a necessidade de continuar a cumprir os objetivos a que estamos vinculados pelas regras europeias e a importância de ter todos os dados na mão antes do Orçamento de 2015”, explica um elemento do Executivo ao Observador.
Para o núcleo duro do Executivo, só com estes passos se poderá evitar um último ano de legislatura “com chumbos às pinguinhas” – e com necessidade permanente de correção das contas públicas. Em diplomas tão sensíveis como os que incluirão cortes “duradouros” nas pensões e salários do Estado, só mesmo uma fiscalização preventiva pelo Tribunal Constitucional tornará mais sólida a proposta de Orçamento que seguir para o Parlamento.
Os precedentes de cavaco
Há um ano, quando a mesma estratégia foi acordada com a troika, o Governo nunca escreveu ao Presidente a pedir que enviasse para o Palácio Ratton o diploma da convergência das pensões antes de uma promulgação (ou veto). Mas Cavaco Silva fê-lo. Porém, com uma argumentação tão dura contra o diploma que deixou o Governo numa crise de nervos.
Agora, muitos meses depois, o Governo recebeu com agrado as primeiras palavras do Presidente depois do acórdão do Tribunal Constitucional. Mas anseia por saber se Cavaco repete as dúvidas (e o tom) que tem manifestado sobre cortes em pensões a pagamento, ou se a menor dimensão destes ajudará a convencê-lo da sua necessidade.
Mas a ideia da carta, assegura outra fonte do Governo ao Observador, não é escrever ao Presidente para o pressionar, antes para dar o mote formal à atuação do chefe de Estado. Precisamente para assegurar que um pedido destes não será interpretado como uma pressão indevida, o Executivo andou a estudar se houve algum precedente. E descobriu pelo menos um, do tempo em que Cavaco era primeiro-ministro, sobre a lei quadro das privatizações, altura em que o Governo de então pediu a Mário Soares (então Presidente) que enviasse para o Palácio Ratton (sede do TC). A lei, recorde-se, também era muito polémica e levou a uma forte discussão constitucional no país.