A Lusófona é uma universidade igual a todas as outras nesta altura do ano. A tranquilidade que reina na instituição faz esquecer o turbilhão que ali se viveu há mais de seis meses. No dia em que o processo da tragédia do Meco foi arquivado, não se ouve uma palavra sobre o assunto. Os temas de conversa daqueles que passaram esta sexta-feira pelo espaço estão nas preocupações normais de quem está de férias e quer aproveitar o descanso das frequências, dos apontamentos e dos professores. Planear os dias de praia, as próximas saídas, refletir sobre as discussões, os namoros, sobre a justiça ou a falta dela em quem passou e quem chumbou. São as questões de uma vida académica normal.

Quase no fim de julho os estudantes estão, na sua maioria, de férias. Não há grandes grupos nem azáfama. Com intervalos aproximados de quinze minutos chegam grupos de dois, três ou quatro universitários ao campus do Campo Grande, em Lisboa. Uns espreitam pelas vitrines nas paredes onde constam as notas de final de semestre. Os olhos passeiam pelas folhas afixadas e procuram ativamente os nomes e valores correspondentes. Os telemóveis registam os resultados que deixam uns mais satisfeitos do que outros.

Alguns estão ainda a completar exames e provas em falta. Outros fazem da faculdade um ponto de encontro para estar com os amigos. Os espaços interiores refrescam e fazem esquecer o calor tórrido que se sente em pleno verão. As esplanadas presentes no espaço amplo do exterior convidam a uma refeição, a uma bebida fresca, a um café ou a um cigarro.

O ambiente de consternação desde dezembro tem vindo a acalmar, conta um funcionário da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. A tragédia que ganhou dimensão púbica durante meses parece estar num tempo já longínquo. “A tragédia foi-se diluindo com o tempo”, explica. “Sentia-se o receio de que os acontecimentos manchassem a imagem da universidade, mas espero que isso não tenha acontecido”. Sem se querer identificar, porque o assunto ainda é sensível, o funcionário remata a análise do ambiente que ficou depois de sete meses com uma frase comum, que se respira aqui: “É difícil, mas a vida continua”.

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Na madrugada de 15 de dezembro sete estudantes da Universidade Lusófona estavam na praia do Meco, em Sesimbra, quando foram arrastados por uma onda. Seis deles morreram. João Gouveia, o dux (líder da Comissão de praxe da instituição), foi o único sobrevivente. Alertou as autoridades e, em choque, foi transportado para o Hospital Garcia da Orta.

A Polícia Marítima começou as buscas, que terminaram a 26 de dezembro quando o mar devolveu a última vítima mortal. O Meco tornou-se um mar de luto e foi palco de várias celebrações feitas pelos familiares e amigos dos estudantes. O acidente foi associado desde o início a rituais de praxe que terão terminado da pior forma. Em janeiro, a Universidade Lusófona abriu um inquérito interno para apurar se a tese de praxe violenta se confirmava. O Procurador da Comarca de Almada anuncia um inquérito que entra em segredo de justiça. Ambos sem conclusões sólidas.

A situação gerou um debate público sobre as praxes. O Ministério da Educação fez várias reuniões para discutir os perigos da tradição estudantil. Os pais das vítimas fizeram uma queixa-crime contra João Gouveia, que indicavam como o responsável pela suposta praxe violenta. Agora, sete meses depois, o Ministério Público arquivou o inquérito por não haver indícios de crime, concluindo ter sido um acidente. Os pais das vítimas dizem querer recorrer do arquivamento do processo.