Empresas do grupo Banco Espírito Santo (BES) e a companhia de seguros Tranquilidade asseguravam mais de 90% dos subsídios à exploração concedidos à Fundação Ricardo Espírito Santo Silva (FRESS), de acordo com as demonstrações financeiras desta entidade. As contas de 2012, as mais recentes entre aquelas que estão disponíveis no site oficial da Fundação, indicam que o BES e a seguradora garantiram donativos no valor total de 751 mil euros, sendo a fatia de leão proveniente dos cofres do banco e de empresas associadas. O BES deu 641 mil euros à FRESS naquele ano, num total de ajudas de 921.898 euros.

A soma, concedida em plena crise, numa época em que Portugal estava, ainda, sob o programa de ajuda assinado com a troika, é superior àquela que foi transferida para a Fundação um ano antes. Em 2011, BES e Tranquilidade concederam 740 mil euros, o que pesou 80% na soma dos subsídios de 815 mil euros angariados durante o exercício em causa.

Na comparação entre os dois anos de atividade, verifica-se que os cortes decididos pelo Governo nas despesas públicas abriram um rombo nos apoios à FRESS. Em 2011, a entidade teve direito a 200 mil euros que saíram dos cofres do Ministério da Cultura, além de 14 mil euros cedidos pelo Instituto para o Emprego e a Formação Profissional (IEFP) devido a acordos com a escola de artes decorativas da FRESS. No ano seguinte, o ministério entretanto desaparecido e substituído pela Secretaria de Estado da Cultura já no Governo liderado por Pedro Passos Coelho reduziu as ajudas a zero, enquanto o IEFP se limitou a contribuir com 14,4 mil euros.

As perdas registadas na rubrica dos subsídios chegados do setor público foram, em 2012, compensadas pela generosidade de outras organizações, num esforço aparente da fundação de diversificar as fontes de financiamento. A Fundação EDP subiu os apoios, entre 2011 e 2012, de 70,5 mil euros para 74 mil euros e quatro outras empresas que não figuravam no ano anterior na lista de mecenas, entregaram à FRESS 95 mil euros.

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Entre, pelo menos, parte destas entidades, há um ponto comum: a ligação ao grupo BES. No capital da EDP, o BES tinha uma posição a rondar 2% das ações emitidas pela energética. A Esegur, que doou cerca de 34 mil euros, era uma parceria entre o BES e a Caixa Geral de Depósitos. Por fim, a Ascendi era participada por empresas do Grupo Espírito Santo (GES), entre elas a construtora Opway, uma das unidades que pesou no avolumar de problemas financeiros de toda a estrutura familiar e que culminaram com o colapso do BES e o pedido de proteção de credores lançado junto dos tribunais por holdings do GES como a Espírito Santo Financial Group, Rio Forte e Espírito Santo International.

Na lista de doadores, surgia, também, em 2011 a Fundação Portugal Telecom. Largou quatro mil euros para apoiar a FRESS, mas no exercício seguinte decidiu cortar radicalmente os apoios. A operadora de telecomunicações que lançou aquela fundação era detida, em 10%, pelo GES. Com a divisão do BES, em “banco bom”, o Novo Banco, e um “banco tóxico”, os responsáveis pela FRESS não sabem como será feito no futuro o financiamento, alvo de pedidos efetuados ano a ano, de acordo com as necessidades de recursos para sustentar as atividades da Fundação.

A degradação da situação financeira da FRESS era já antecipada no relatório relativo a 2012. No documento, os responsáveis da Fundação referiram que, “apesar da crise económica generalizada instalada a partir de 2008, foi possível (…) manter o rumo estratégico”, refletido na redução das perdas de 1,8 milhões de euros em 2005 para 381 mil euros em 2010. No entanto, “a persistência e o agravamento da crise (…) determinou a inversão desta tendência em 2011 e 2012”. Nos últimos três anos, prosseguia o documento, a FRESS “terá perdido potencialmente 2,5 milhões de euros de receitas próprias, a uma média de 840 mil euros” por ano. A entidade queixava-se da perda do apoio proveniente do Fundo de Fomento Cultural e de não ter sido possível “captar novos mecenas e um maior volume de mecenato”.

Resultado? Em 2012, a FRESS registou prejuízos de 954 mil euros, mais do dobro daqueles que foram sofridos no ano anterior.