António Costa, o candidato, traçou o cenário do país: negro. Bem negro. O diálogo social não existe, o desemprego atinge mais do que o suportável, a economia não cresce, as desigualdades aumentaram, a educação e a saúde pioraram. O discurso foi (quase sempre) de crítica ao estado atual do país com a intenção de promover uma alternativa.
Mas afinal o que propõe o candidato socialista que irá enfrentar Pedro Passos Coelho nas legislativas de 2015?
Economia
António Costa aponta como remédio para todos os males o “crescimento da economia”. Ou uma “fisioterapia para a economia“. Uma das vias será através de uma melhor utilização dos fundos comunitários para promover as empresas, uma bandeira que, disse, faltou ao líder demissionário do partido.
Esta fisioterapia para a economia passa pelo aumento do salário mínimo para 522 euros. E tem como bandeira a reposição do rendimento das pessoas para assim promover o mercado interno. Foi por isso que Costa admitiu que é possível repor as pensões (“É possível repor as pensões”, disse) e “acabar com a guerra com a função pública” – o que significa, que, de acordo com o candidato socialista a primeiro-ministro, é “necessário iniciar uma trajetória para repor salários na função pública“. Mas o que quer isto dizer só será revelado daqui a alguns meses – maio ou junho – quando apresentar o programa de Governo.
Ainda no campo da economia, Costa quer apostar no investimento público, sobretudo em investimentos de longo prazo em “investigação e desenvolvimento, mesmo sabendo que o retorno não será imediato”, escreveu na moção às primárias.
Para melhorar as condições da economia, o autarca de Lisboa diz que fará mexidas nas duas faces da moeda: do lado das empresas e do lado dos trabalhadores. Diz que quer “incrementar fatores de competitividade empresarial efetivos“, mas não concretiza o que quer isto dizer. E garante “estabilidade fiscal, laboral, legislativa e regulatória”. As perguntas, no entanto, aparecem: quais as leis que mudam e as que ficam na mesma?
Finanças e dívida
Sobre impostos, António Costa não se compromete com uma redução da carga fiscal. Mostrou genericamente apenas vontade em reduzir o IVA na restauração e IMI, mas não foi mais longe que isso.
E a consolidação orçamental? Para António Costa, é uma questão “instrumental e não estratégica para o país” que será concretizada na estratégia que vai definir de curto prazo. Costa aposta na economia para “resolver a questão da estabilização orçamental“, ou seja, não será pela redução do peso do Estado, mas sim pelo crescimento do produto interno bruto.
Mas para conseguir cumprir as metas, Costa, se ganhar as legislativas de 2015 tem uma fatura para pagar: a dívida pública. E quanto à forma como lidar com este problema, o candidato ainda não foi explícito. Começou por dizer que o problema não começou na dívida, mas sim na “falta de competitividade da nossa economia e na dificuldade que temos tido em adaptar-nos ao choque que no início do século tivemos com a entrada no euro”. Mais tarde, num dos debates com António José Seguro, admitiu que “há várias soluções técnicas para o tratamento da dívida” e que é preciso um “novo equilíbrio desses compromissos” mas não especificou a que soluções se refere.
Costa defende ainda alterações ao Tratado Orçamental. Ou, uma “nova leitura” do Tratado Orçamental, numa versão suavizada. Na moção que apresentou às eleições, Costa defende no entanto que a aplicação do Tratado deve ter em conta “a adequação da trajetória de ajustamento ao ciclo económico, em especial no caso de situações de recessões económicas graves” e que por isso o país deve “negociar” um “plano de recuperação económica alicerçado no investimento produtivo e criador de emprego”. Além disto, defende o candidato que deveria ser possível incluir investimento público em “educação, formação, investigação científica, desenvolvimento científico e tecnológico”.
Desigualdades
No campo das questões sociais, Costa promete reduzir a pobreza, nomeadamente, a pobreza infantil e, em consequência, reduzir as desigualdades. Vai lançar um “programa de Recuperação Económica e Social“, que passa pela ligação entre relançamento da economia e criação de emprego.
Como? Neste ponto, Costa apenas garante – e faz disso discurso repetido – que vai impulsionar o diálogo em concertação social. E, para o exemplificar, recua aos tempos do guterrismo. É aqui que fala na aposta na qualificação e na ciência e investigação.
A defesa do passado – seja de António Guterres ou de José Sócrates – é bagagem que vai levar consigo. Em termos de narrativa, Costa não terá problemas (e até é parte nuclear do discurso) com a defesa do passado socialista. “Temos que defender o que fizemos bem e o que fizemos de errado. Critiquei alguns erros. O PS usou a maioria absoluta com auto-suficiência sem aproveitar diálogo político e acordos alargados”, disse no primeiro debate televisivo com António José Seguro.
Coligações
E termos políticos, quer tenha maioria absoluta nas eleições legislativas, quer não tenha (e sobretudo se não tiver), já garantiu que quer fazer um “governo de esquerda”, procurando compromissos com os partidos à esquerda do PS. Foi, aliás, esse o primeiro slogan de campanha quando apresentou a moção no Tivoli em Lisboa.
E foi por querer maior força na esquerda que recusou a proposta do líder demissionário do partido de mexer na lei eleitoral. Chamou-lhe “jogada de secretaria” e defendeu que “não se pode aceitar um sistema eleitoral que não garanta a proporcionalidade”.
Mas com Costa à frente do PS, o sistema eleitoral não ficará como está. Diz o candidato a primeiro-ministro que vai propor uma reforma que garanta uma “representação proporcional personalizada, introduzindo círculos uninominais que, numa adequada composição com círculo plurinominais, garantam uma relação mais próxima, personalizada e responsabilizante entre o eleito e o eleitor”. Mas não concorda com uma “redução excessiva” de deputados”.
Além disso, o agora candidato a primeiro-ministro do PS – e que será, presumivelmente líder do partido nas diretas que deverão acontecer em novembro – quer fazer pequenas mudanças como alargar o voto antecipado e introduzir a possibilidade de voto fora da área de residência.