Os últimos dias foram marcados por trocas de palavras entre António Costa e o ministro Poiares Maduro sobre a execução dos fundos comunitários para aos próximos anos. Agora, Manuel Castro Almeida, secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, em declarações ao Observador, diz que o futuro líder do PS tirou uma “conclusão errada” do volume dos fundos que vêm para o país e que há sete anos, quando António Costa estava no Governo de José Sócrates, “Portugal não era o país com maior percentagem de absorção de fundos, ao contrário do que acontece atualmente”.

De sete em sete anos, a União Europeia atribui fundos estruturais e de coesão que visam melhorar o nível de vida das diversas regiões europeias e este ano inicia-se um novo quadro plurianual que deverá se executado até 2020. Em ano de transição – o quadro plurianual que vigorou entre 2007 e 2013 deverá estar fechado até 31 de dezembro de 2015 e a atual taxa de absorção de dinheiros comunitários por parte de Portugal é de 84,1%, a mais elevada a nível europeu -, o Relatório do Orçamento do Estado para 2015 mostra um decréscimo das transferências da União Europeia para Portugal no próximo ano, algo que motivou António Costa a afirmar que isso se tratava de “uma confissão antecipada do Governo” que o país teria uma “baixíssima execução do novo quadro comunitário”.

Segundo o secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, esta não foi uma interpretação correta, já que no final de cada quadro plurianual, a Comissão Europeia retém 5% dos fundos a atribuir a cada país que são só restituídos dois anos depois do final da execução desse mesmo quadro (em 2017), dinheiro que não entra assim nestes fluxos financeiros, mas que entretanto o Governo já deu autorização ao Tesouro para adiantar no próximo ano de modo a haver “um aumento no investimento na economia em 2015”. Esta autorização está no artigo 122.º, intitulado “Antecipação de fundos europeus estruturais e de investimento” da proposta do OE 2015 entregue pelo Governo na Assembleia e aponta para um adiantamento dos 5% (1,8 mil milhões de euros) para cobrir “programas cofinanciados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), pelo FSE, pelo FC e por iniciativas europeias”.

“São regras da utilização destes fundos europeus em todos os Estados-membros. Até ao final do próximo ano vamos assim executar todo o dinheiro que falta do QREN (2007-2013) e garantidamente vamos investir mais em 2015”, assegura Manuel Castro Almeida, avançando que haverá 4 mil milhões de euros em 2015 para investimento na economia através de fundos comunitários, sendo que mil milhões (cerca de 5% dos 21 milhões euros do novo quadro Portugal 2020) virão já do novo quadro. O secretário de Estado espera que António Costa reconheça que se enganou, dizendo que houve “ligeireza” nas afirmações do autarca.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O quadro do Orçamento de Estado que mereceu críticas por parte de Costa indica que Portugal receberá em 2015 cerca de 3,1 mil milhões de euros, menos dinheiro do que em 2014 (4,5 mil milhões de euros). Se se somar os 1,8 mil milhões de que fala Castro Almeida, a fatia para 2015 já não é menor. “Estou ansioso para saber se António Costa vai reconhecer que se enganou”, disse.

Atrasos na execução do QREN, do novo quadro e o crescimento da Economia

Outro argumento de António Costa no fim de semana foi o atraso na execução do QREN e na apresentação dos novos fundos até 2020. Manuel Caldeira Cabral, professor de Economia da Universidade do Minho e um dos conselheiros do PS nesta área, diz que a quebra de dinheiros comunitários não acontece só em 2014 e que desde 2012 se pode verificar essa diminuição de transferências da UE para o país, o que segundo o investigador “tem um efeito de desequilíbrio na economia”, já que estes fundos são a ferramenta “mais preciosa” que Portugal tem para crescer nos próximos anos.

“O calendário para o novo quadro já leva um atraso, pois os programas operacionais deveriam estar prontos em 2014 para haver candidaturas ainda em 2014 e as empresas poderem beneficiar dos fundos logo no início de 2015”, afirma Manuel Caldeira Cabral. O economista diz que o atraso se deve à “remodelação no seio do Governo em 2013” que redistribuiu as responsabilidades dos fundos a Poiares Maduro, quando uma grande parte estava sob a alçada do ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira. Caldeira Cabral diz que com a atual configuração, as verbas só devem começar a chegar à economia real em 2015.

“O crescimento anunciado pelo Governo é modesto. A retoma é assim pouco sustentável já que é puxada pelo consumo e pelos gastos público, o que faz com que esta reforma não seja interessante”, diz Manuel Caldeira Cabral.

O secretário de Estado do Desenvolvimento Regional diz que não há qualquer atraso e que em comparação com os restantes países europeus, Portugal foi mesmo o segundo país a entregar o Programa Operacional Regional Temático que define as prioridades para cada uma das sete regiões em que o país está dividido. “Portugal está no grupo da frente”, afirmou o secretário de Estado, anunciando que espera que as negociações sobre este Programa estejam fechadas com Bruxelas até ao final desta semana. Falta ainda a fase de aprovação que envolverá audições com as autarquias e instituições locais.

“Parece que há muita vontade de dizer mal de tudo, mas há sete anos, quando António Costa estava no Governo [como ministro da Administração Interna], Portugal não era o primeiro país da UE em termos da absorção de fundos e em 2008, o Governo de Sócrates apenas conseguiu aproveitar 1,9% do programa plurianual iniciado em 2007”, conclui o governante.

Até ao momento, António Costa não respondeu às questões enviadas pelo Observador sobre a polémica com o ministro-Adjunto e do Desenvolvimento Regional, Poiares Maduro.

A guerra dos fundos entre Costa e Maduro

O autarca de Lisboa disse na quinta-feira que Portugal estava “em risco de não aproveitar” os fundos europeus do próximo quadro plurianual” por opção nacional, abrindo assim uma guerra com o ministro Poiares Maduro que no dia seguinte acusou o futuro líder do PS de falar por “incompetência ou má-fé”.

“Eu não sei se é por incompetência ou por má-fé, mas os erros que o doutor António Costa pronunciou ontem [quinta-feira] e nos últimos dias sobre os fundos são tantos, que é difícil saber por onde começar a corrigi-los”, disse aos jornalistas Poiares Maduro, na Figueira da Foz, à margem da abertura de um espaço do cidadão.

Entretanto, o ministro apelou ao autarca para “não procurar fazer dos fundos, matéria estrutural de imensa importância, um instrumento de combate político, sobretudo quando isso assenta em factos que não são verdadeiros”. Perante isto, António Costa organizou uma conferência de imprensa no sábado em que mostrou o Relatório do Orçamento do Estado para 2015, afirmando que os dados revelavam”um enorme atraso na execução do QREN e, sobretudo, uma confissão antecipada do Governo que vai ter uma baixíssima execução do novo quadro comunitário que devia estar a ser utilizado”.