As relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba foram restabelecidas, mas são poucas as medidas concretas conhecidas, como a promessa de que a embaixada norte-americana volta a Cuba e de que o país da América Latina vai sair da lista de países terroristas definida pelos EUA. “Mas este acordo tem muito mais alcance do que se possa pensar”, disse Tiago Moreira de Sá, professor de Relações Internacionais na Universidade Nova de Lisboa (UNL). “Este é o primeiro passo para a normalização completa entre os dois países.”

Para o académico, o acordo agora anunciado só faz sentido se no final se acabar com o embargo que os Estados Unidos impuseram a Cuba no início dos anos 1960. “Como os dois líderes falaram em público sobre este acordo é provável que tudo corra bem.” Mas para Tiago Moreira de Sá existem muitos aspetos que ainda não foram tornados públicos, notando que é muito raro que se mantenha um segredo deste tipo durante tanto tempo.

Tiago Moreira de Sá prevê que este acordo e o fim do embargo venham a ter um impacto importante no regime autoritário cubano, que perderá a única base que ainda o sustentava. “O regime cubano tinha como único pilar a queixa contra o embargo norte-americano. Agora desaparece o inimigo.” Este processo pode levar a uma transição política em Cuba que venha mudar as condições de vida dos cidadãos, com maior liberdade económica e política, com a libertação dos presos políticos, o respeito pelos direitos e a liberdade de expressão, refere o académico.

Para Manuel Gonçalves Martins, professor catedrático na Universidade do Minho e da Universidade Lusófona do Porto, “os outros países vão reconhecer o prestígio dos Estados Unidos com esta medida”, os “amigos dos Estados Unidos” vão ver o povo cubano com outros olhos. Mas Tiago Moreira de Sá não vê que que esta medida influencie as relações que os outros países têm com Cuba, porque nenhum país tem uma situação como a dos Estados Unidos. Para o professor da UNL esta medida será particularmente significativa para o presidente Barack Obama que já tinha tomado algumas medidas importantes, mas nenhuma tão memorável como esta. “Daqui a 50 anos, Obama vai ser visto como o homem que abriu as portas a Cuba, como Nixon é visto como o homem que as abriu à China.”

Embora a medida desta quarta-feira não tenha, provavelmente, passado pelo Senado norte-americano, outras terão certamente de passar, refere Tiago Moreira de Sá. E é aí que os Republicanos podem manifestar a oposição a esta situação. O professor alerta que “os Republicanos têm de ponderar que posição querem tomar perante o eleitorado hispânico”, porque o presidente Obama neste momento não tem de se preocupar com uma reeleição. Manuel Gonçalves Martins acusa os partidos de pensarem uma coisa e dizerem outra. “Os Republicanos, ainda que possam reconhecer que a política é boa em termos mundiais, vão continuar a manifestar-se contra e a apontar problemas.”

Para haver acordo entre as duas partes teve de haver vontade política dos líderes dos dois países, mas como não falavam um com o outro o papel de um mediador foi fundamental, explica Tiago Moreira de Sá. “O Papa Francisco tem conseguido, com as atitudes que tem tomado, ganhar notoriedade e credibilidade. Dificilmente [os dois países] podiam ter arranjado melhor intermediário.” Além de ser alguém em que ambos confiam, o académico nota também que a maior parte da população cubana é católica.

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