Não há dúvidas: as taxas previstas sobre smartphones e tablets vão mesmo avançar. Apesar de, desde o início, ter divido o Executivo PSD/CDS – com os centristas a levantarem muitas reservas em relação à proposta do secretário de Estado da Cultura Jorge Barreto Xavier (do PSD) – a proposta de lei vai ser aprovada pela maioria parlamentar sem alteração dos valores propostos inicialmente. O diploma entrou na Assembleia em setembro, altura em que foi constituído um grupo de trabalho que já chegou a conclusões.
Na prática, a lei da cópia privada prevê uma taxa de compensação equitativa entre os 0,004 cêntimos e os 20 euros a aplicar aos equipamentos e dispositivos digitais, como leitores de mp3, pens, discos rígidos, smartphones, tablets, CD, entre outros. A título de exemplo, um disco rígido de 500 gigabytes (GB) vai passar a ter uma taxa de compensação equitativa de oito euros (0,016 cêntimos por cada GB de capacidade, com o limite máximo de €15). A um smartphone com capacidade de armazenamento de 64 GB, por sua vez, vai ser aplicada uma taxa de 7,68 euros (0,12 por cada GB). A maior taxa, no entanto, incide sobre equipamentos multifunções ou fotocopiadoras a laser que consigam reproduzir mais de 40 páginas por minuto – são mais 20 euros (pode consultar a lista completa aqui).
Inês Teotónio Pereira, deputada do CDS, admitiu ao Observador que os valores das taxas aplicáveis não se alteravam, mas, ainda assim, garantiu que a proposta final “melhorou substancialmente” em relação ao documento inicial. Em quê? A centrista explica:
“Achamos que melhorou em relação à proposta inicial na questão da transparência, na questão da publicação dos estudos e dos critérios de distribuição aos autores dos valores cobrados . [Além disso], assegura o cumprimento da diretiva europeia”, uma das maiores preocupações do CDS, desde que se iniciaram as negociações.
Apesar de não ter ficado convencido com o valor de 15 milhões de euros como teto máximo para compensar os artistas – um dos mais elevados da União Europeia – e com a fundamentação para aplicar as taxas propostas, o CDS acabou dar o ‘ok’ ao documento que vai ser em breve votado em comissão parlamentar. O documento esteve agendado para votação na última quarta-feira, mas os partidos acordaram em adiar para ser discutido conjuntamente com outros dois diplomas conexos (entidades de gestão coletiva e alteração aos direitos de autor).
PSD e CDS conseguiram, ainda assim, negociar os critérios que devem ser ponderados para a repartição das compensações equitativas pelos artistas – mesmo aqueles que não estão inscritos nas associações de defesa dos direitos de autor – e uma revisão da tabela de compensação equitativa a cada dois anos.
Assim, a redistribuição dos montantes garantidos pela taxas deve ponderar:
- os autores que mais venderam. Ou seja, o valor a atribuir a um músico que vende 100 ou 200 mil discos deverá ser superior ao atribuído a um artista que vende apenas 10 mil discos;
- os estudos sobre a natureza das obras reproduzidas (música, filmes, etc.) deverá pesar na distribuição dos valores;
- a devida diferença entre os autores que utilizam medidas tecnológicas que impedem a cópia (DRM), muito habitual nos DVDs, por exemplo, e os autores que não recorrem a essas tecnologias;
- e o acesso dos portugueses a obras cujas cópias privadas já estão autorizadas (é o caso do que se compra pelo itunes, em que a licença de utilização inclui a cópia para outros aparelhos da apple).
Quanto ao Partido Socialista, que em setembro se absteve na votação da proposta de lei na generalidade, pretendia limitar a taxa de compensação equitativa em 5% do preço final, em dispositivos como memórias USB e cartões de memória, por exemplo, antes da respetiva tributação. No entanto, a proposta socialista não obteve a concordância no PSD e CDS no grupo de trabalho.
Com esta medida, o Governo espera garantir um encaixe financeiro de 15 a 20 milhões de euros – um valor que não reuniu consenso entre parceiros da coligação. Se o ministério da Economia falava em 30 milhões, a secretaria de Estado da Cultura garantia que eram apenas 11 milhões de euros. As previsões do Governo acabaram por ficar a meio caminho.
Foram, de resto, negociações longas e a vários tempos: a medida teve de passar quatro vezes pelo Conselho de Ministros antes de ser aprovada em agosto. Mas, mesmo assim, continuou sem reunir consenso. Em novembro, Michel Seufert, um dos centristas que mais dúvidas levantou em relação à polémica lei, admitiu ao Observador que as reservas se mantinham. “O importante é garantir que há de facto uma ligação real entre o que está a ser taxado e a diretiva europeia. Não podemos correr o risco de estar a taxar uma coisa que não vai ao encontro do previsto a nível europeu”, alertava na altura.