Agentes infiltrados, vigilância nas redes sociais, bloqueio de sites, critérios mais apertados para vistos, naturalização e viagens e papel mais interventivo do Ministério Público. Estas são algumas das novidades da Estratégia de luta anti-terrorista que o Governo está a ultimar e que esteve em debate durante cerca de quatro horas na reunião do Conselho Superior do Ministério Público, que ocorreu terça-feira na Presidência do Conselho de Ministros.

As mudanças implicam alterações em oito leis. São elas:

As alterações neste pacote de leis devem ser aprovadas em Conselho de Ministros na próxima semana e depois enviadas para a Assembleia da República. Trata-se de legislação que pertence exclusivamente à esfera do Parlamento.

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O Governo já tinha feito uma apreciação da primeira versão da Estratégia de luta anti-terrorista há duas semanas em Conselho de Ministros, que depois foi distribuída aos membros do Conselho Superior de Segurança Interna na semana passada em antecedência à reunião. Nesta reunião de terça-feira, porém, houve vários contributos que inviabilizaram a aprovação já esta quinta-feira de todas as alterações legislativas.

Estas mudanças vêm na sequência de recomendações da União Europeia, que, em 2006, estabeleceu quatro pilares para lidar com a ameaça do terrorismo: a prevenção, proteção, perseguição e resposta. O Governo português entende desdobrar o primeiro pilar e acrescenta-lhe a deteção – cuja missão fica mais concentrada nos serviços de informações e, sobretudo, no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), organismo que em Portugal tem muita informação pois por ele passa tudo o que diz respeito a circulação de cidadãos.

A deteção deve ser autonomizada para se dar mais enfoque a esta vertente, decompondo, assim, aquilo que é a função típica da prevenção, entende o Governo. E o que distingue a deteção da prevenção? A primeira consiste na identificação precoce da ameaça, permitindo assim o desmantelamento isolado ou de outros focos de ação. Isto envolve a recolha de dados dentro do território português e no estrangeiro – na verdade, as forças de segurança e os serviços de informação dependem essencialmente das informações recebidas de países amigos. Isso foi público, por exemplo, no recente caso do açoriano que queria juntar-se ao Estado Islâmico ou no caso de apreensão de droga em Odemira, em 2012. A troca de informações continuará a ser determinante também para o controlo de movimentação de capitais que, muitas vezes, está associada a organizações terroristas.

A prevenção tem a ver com o conhecimento e identificação das causas que determinam os processos de radicalização e recrutamento. Nesta aérea, o Governo português quer traçar mesmo um plano de estratégias de saída e de inclusão, ou seja, medidas de atuação para que uma pessoa que, por exemplo, queira desistir de um campo de treinos de um grupo radical possa voltar para casa e depois seja acompanhado na sua reintegração. Essa pessoa, enquanto não praticar atos terroristas, não cometeu um crime.

O recrutamento acontece essencialmente nas redes sociais e, por isso, no futuro vai ser possível bloquear sites radicais. Essa tarefa competirá ao centro nacional de cibersegurança, uma estrutura recente que depende do Gabinete Nacional de Segurança. É essa equipa que irá vigiar as mensagens trocadas nas redes sociais e identificar os perfis que fazem apologia ao terrorismo. Atualmente, já está criminalizado o incitamento à prática de atos terroristas, mas o Governo entende que isso não chega e, por isso, a própria apologia (louvar atos terroristas) tem que constar do Código do Processo Penal.

A lei de ações encobertas vai também ser modificada para que seja possível haver agentes das forças de segurança ou dos serviços de informação infiltrados em organizações terroristas, algo que era reivindicado há muito por aquelas entidades.

As penas que dizem respeito ao terrorismo também vão aumentar para manterem um equilíbrio com as restantes penas. Um ato preparatório para crime de terrorismo pode ser punido com 1 a 8 anos, enquanto que, por exemplo, o crime de rapto, na lei portuguesa, tem uma moldura penal de 3 a 10 anos.

No que diz respeito à lei da nacionalidade, o Governo vai introduzir mais um critério para concessão de naturalização – o facto de a pessoa não constituir ameaça à segurança nacional. Essa norma vai também passar a constar nos critérios de atribuição de vistos de residência.

Os destinos de viagem vão passar a ser também mais controlados e será possível no futuro fazer detenções no aeroporto caso haja suspeitas fundadas de que a pessoa planeia viajar para juntar-se a organizações terroristas.

Outra diferença em relação ao que existia é a de que com a atualização desta estratégia passará a haver avaliações regulares à capacidade de resposta por parte de Portugal, através da realização de simulacros. A resposta continuará a ser coordenada pela Unidade de Combate ao Terrorismo (UCAT), que vai sofrer algumas alterações. A lei deixará explícito que o coordenador será o secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (atualmente é omissa a este respeito) e o responsável pela investigação do crime e a ação penal, o Ministério Público, passa a ter assento neste órgão, algo que não acontecia até aqui.