Acaba já, sofrimento! Terá sido algo como isto, embalado em jeito de suspiro e dito em bom castelhano que, na terça-feira, se ouviu entre os bancos do Santiago Bernabéu, estádio que dá casa ao Real Madrid. O árbitro apitou, hora e meia depois, lá apitou três vezes seguidas e deu sinal para que tudo terminasse. Os merengues, os que vestiam de branco, eram derrotados pela equipa que, meses antes, sofrera quatro golos contra o Sporting (4-2, em Alvalade) e, mesmo assim, escapavam por pouco rumo aos quartos-de-final da Liga dos Campeões. Mas perdiam — em casa, perante os seus e com pouco, muito pouco de bom futebol jogado. O público, por isso, decidiu assobiar, muito e bem alto.

O barulho era ensurdecedor. “Una pitada histórica”, como descrevia a Marca, num castelhano que, traduzido, equivale a uma assobiadela que há muito não se via. E a cabeça de Ronaldo, a mesma que no jogo dera dois golos ao Real e, em conjunto com o de Karim Benzema, alinhou as contas com os golos fora (a equipa vencera por 2-0, na Alemanha, há duas semanas), não gostou do que viu e ouviu. Cristiano foi rápido a abandonar o relvado, foi um dos primeiros a fazê-lo, abanando a tal cabeça, em desaprovação, e mascarando a cara com um ar chateado.

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Antes, uma das câmaras de televisão que, jogo sim, jogo sim, tranca a mira no português, apanhara-o, quando a bola ainda rolava, a dizer “vergonha, vergonha”. Cristiano Ronaldo não estava mesmo a gostar do que se estava a passar, mas só não se sabe, ao certo, do quê: se os assobios que a orquestra do Bernabéu dedicava aos jogadores, se a parca qualidade que a equipa e, já agora, o próprio Ronaldo, apresentaram durante o encontro. Por uma coisa ou por outra, o capitão da seleção nacional terá dado dito aos jornalistas, na zona mista do estádio, que “não [fala] mais até ao final da temporada”. Pelo menos assim o ouviu um jornalista do Canal Plus.

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Diz-se, portanto, que Cristiano Ronaldo ficará calado quase até ao verão, pelo menos em Espanha. Resta esperar para ver se é verdade. Certo é que os jogadores do Real, e isso viu-se na terça-feira, não correm quando é hora de defender, pouco se mexem para se colocarem à disposição de um passe e as coisas já não saem como antes saíam.

Foi mais ou menos até ao Natal, altura em que o Real venceu o Mundial de Clubes e, no campeonato, ainda mantinha os quatro pontos de vantagem numa liderança que, no último fim de semana, acabou por perder para o rival Barcelona. “Se continuarmos assim não vamos longe”, admitiu, na terça-feira, Carlo Ancelotti, o treinador que, desde o banco, não tem arranjado soluções para amparar a quebra de uma equipa que, a época passada, nunca abrandou durante a maratona que lhe deu a conquista da Liga dos Campeões.

Depois de a equipa, há duas semanas, empatar em Madrid (1-1) com o Villarreal, para o campeonato e, depois, ir a Bilbao perder (1-0) e abrir a porta do primeiro lugar ao Barça, foi agora derrotada, em casa, pelo Schalke 04. E pior: os alemães treinados por Roberto di Matteo, homem conhecido por montar equipas amigas da cautela e encolhidas para verem o que o adversário tem para dar, foram melhores em quase tudo. Nos passes (526 contra 493), nos remates (19 contra 14) e, claro, nos golos. Nunca uma equipa tinha sofrido quatro golos em casa, perdido a segunda mão de uma eliminatória da Champions e, mesmo assim, seguir em frente na prova.

Cristiano Ronaldo, no meio dos assobios, da derrota e do parco futebol coletivo demonstrado pela equipa, até conseguiu chegar-se à frente na luta a dois em que há anos está metido — com os dois golos frente ao Schalke, o português chegou aos 78 golos marcados em competições da UEFA e, assim, ultrapassou Lionel Messi, que leva 76. Só na Liga dos Campeões, aliás, o extremo, de 30 anos, igualou o argentino em número de bolas rematadas para dentro da baliza. Ambos têm agora 75 golos e tão cedo ninguém os apanha. Quem mais perto está é Didier Drogba (com 44), avançado trintão que hoje pouco joga no Chelsea de José Mourinho.

E o que pensa Ronaldo disto? Como aparentemente se decidiu calar, não sabemos.