Daniel Carder é um dos engenheiros cuja investigação terá estado na descoberta – acidental – de que a Volkswagen comercializou, pelo menos nos EUA, modelos de automóveis movidos a gasóleo que estavam equipados com um mecanismo para mascarar a quantidade real de emissões poluentes. Convidado pelo El País a explicar como foi o processo que terá alertado as autoridades, Carder recorda que as conclusões do estudo que terminou em maio de 2014 foram publicadas mas ninguém, nem mesmo a imprensa especializada, prestou atenção. O engenheiro e a sua equipa chegaram a pensar, recentemente, que “o caso tinha morrido“.
“Ficámos tão surpreendidos quanto o resto do mundo quando a agência de proteção ambiental dos EUA (EPA) anunciou” os contornos da fraude que poderá afirmar-se como uma das maiores da História empresarial mundial. Daniel Carder lidera uma equipa de nove pessoas, assistidas por cerca de 30 alunos da Universidade de West Virginia. Como lhe contámos aqui, esta universidade foi, por ter o equipamento necessário, convidada por dois engenheiros ligados a uma associação ligada aos transportes limpos para ajudar a provar que os motores diesel podem ser amigos do ambiente.
Estabelecida essa parceria, os investigadores colocaram mãos à obra e utilizaram os equipamentos portáteis de medição de gases poluentes. Com estes equipamentos na bagageira e ligados ao tubo de escape, percorreram uma distância de quase 2.100 quilómetros entre San Diego e Seattle e, quando foram apurados os resultados, os investigadores ficaram “chocados”.
“Chocados” porque os resultados que obtiveram não tinham qualquer comparação com os que as autoridades – em rigor, a California Air Resources Board – tinham registado. “Os resultados mostraram que o BMW funcionou bem em todos os cenários”, conta Daniel Carder, mas os carros da Volkswagen – dos modelos Jetta, Passat e Beetle – poluíam mais até 40 vezes os limites permitidos quando eram levados para a estrada.
“Há milhões destes carros, por aí, a circular”
“Quando vimos a discrepância pensámos que poderia ser um problema técnico e pedimos ao fabricante que nos disponibilizassem mais carros para experimentar”, recorda o engenheiro. “Há milhões destes carros, por aí, a circular”, explica Daniel Carder, acrescentando que queria uma amostra alargada para poder tirar conclusões sólidas. Mas o fabricante não respondeu ao pedido e os investigadores decidiram apresentar, de qualquer forma, as conclusões do estudo num evento em maio de 2014 em San Diego, onde estavam responsáveis da EPA.
O estudo foi, portanto, apresentado publicamente logo em maio de 2014. Mas ninguém prestou muita atenção, nem mesmo a imprensa especializada, lamenta o investigador. Daí que a equipa de cientistas tenha ficado surpreendida pelo processo não estar “morto há mais de um ano”, como eles achavam que estaria. O investigador recusa, porém, a ideia de que tenham “dado uma dica” às autoridades. “Limitámo-nos a abrir os olhos dos reguladores”, diz Carder.
Houve, entretanto, ainda em 2014, uma chamada à oficina (recall) de carros da Volkswagen movidos a diesel – que, na altura, a empresa justificou com a necessidade de fazer uma atualização de software. Os cientistas acreditaram, nessa altura, que “eles [os reguladores] tinham assumido as rédeas do caso”. Mas, nos meses que se seguiram, presumiram que a questão tinha ficado por ali.
Carder pede, no entanto, que não se culpe a tecnologia diesel por este caso. Basta lembrar que “o modelo da BMW comportou-se perfeitamente e cumpriu os parâmetros recomendados pela lei” tanto no laboratório como na estrada. “As pessoas adoram especular sobre o futuro do diesel, mas isso não está em questão. Só espero que isto sirva para melhorar os processos de certificação dos veículos”.