O que começou por ser uma manifestação pacífica reprimida pelo Governo, no movimento Primavera Árabe, transformou-se numa guerra civil e é atualmente um dos maiores e mais preocupantes conflitos do mundo. Esta quinta-feira celebram-se cinco anos de Revolução Síria: foi a 15 de março que o conflito armado se oficializou, arrastada também por outras tensões no mundo árabe. Entenda porquê.

De onde surgiram os protagonistas do conflito?

O número de protagonistas internos e externos foi-se multiplicando. O balanço da guerra aponta para a morte de quase 300 mil pessoas, segundo a ONU, na sua maioria civis, e há muitos relatos de crimes de guerra e contra a humanidade. Um dos resultados mais visíveis foi a contribuição para o maior fluxo de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.

Falamos da Síria. Um pequeno país no Médio Oriente que conquistou a sua independência apenas em 1946 e que surgiu no fim da Primeira Guerra Mundial depois do desmantelamento do Império Otomano.

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O território sírio é agora um autêntico vulcão militar onde estão envolvidas as maiores potências árabes e mundiais. Um conflito onde parece que todos lutam contra todos. A intervenção internacional, liderada pelos EUA e com apoio de vários países europeus, divide-se entre os ataques ao regime sírio e ao Estado Islâmico. O EI é mais um dos inimigos do regime, já domina muitos territórios, e serviu de pretexto à Rússia para entrar no conflito. Ainda que entre o combate ao “Daesh”, Moscovo ajude Bashar al-Assad a derrotar os outros inimigos.

E é deste emaranhado que têm saído grandes problemas para toda a região e para a Europa: Os migrantes que fogem da guerra síria para a Europa e os recrutas sírios que procuram nos países europeus combatentes para o Estado Islâmico onde estão as forças e campos de formação.

O facto de a Síria fazer fronteira com vários países, como o Iraque, Israel, Jordânia, Líbano ou Turquia, pode explicar o crescente interesse e intervenção no conflito do país. Mas a sua influência na distribuição de petróleo também. A rota pela Síria é, talvez, a forma mais fácil e mais acessível de fazer chegar o petróleo árabe ao Ocidente. Mais do que o trajeto através do Canal do Suez. Pela sua localização, o país liderado por Bashar al-Assad é também um grande ponto de contacto entre Ocidente e Oriente há séculos.

Dos primeiros protestos a uma guerra com demasiadas inimigos

O conflito teve início em 2011, no ano que viu nascer a Primavera Árabe. Os ecos das revoltas do mundo árabe chegaram à Síria através de manifestações pacíficas que abalaram um regime ditatorial que permanece no pode há décadas. Assad utilizou a força do exército para reprimir os protestos. Foram dados os primeiros tiros naquilo que se transformaria rapidamente numa guerra civil.

As partes envolvidas no conflito multiplicaram-se. Mas como? Para responder aos avanços do exército, os manifestantes pegaram em armas e ripostaram. Isto levou a que alguns elementos das forças militares de Assad passassem para o outro lado, intitulando-se Exército Livre da Síria (ELS). Nascia assim o primeiro grupo de oposição ao regime e começava a guerra civil.

Rapidamente vários grupos extremistas da Síria e das regiões envolventes juntaram-se ao ELS. É destes grupos que nasce uma filial da Al-Qaeda, com o nome de Frente al-Nusra ou Jabhat al-Nusra. Na mesma altura, os curdos sírios que lutam pela autonomia reúnem armamento e separam-se do regime de Assad no Norte do país, passando a ser também uma parte ativa e independente no terreno.

É assim que se forma a chamada oposição a Assad, que engloba todos as milícias de rebeldes, incluindo ainda a Frente Islâmica, movimento que segundo o seu líder, nasceu da junção de outros sete frações islâmicas durante o conflito sírio.

Mas esta guerra sai, pela primeira vez, das fronteiras sírias com a entrada em cena do principal aliado de Assad: o Irão. O Governo iraniano começou a enviar aviões de carga e oficiais para o terreno para apoiar o regime sírio.

Ao mesmo tempo, alguns Estados do Golfo Pérsico, como a Arábia Saudita e o Qatar, enviaram armas e financiamento (utilizando a riqueza com origem nas enormes reservas de petróleo) aos grupos rebeldes através da Turquia. O objetivo era duplo: combater a influência iraniana e apoiar a luta contra Assad.

Mas o Irão responde e o Hezbollah (grupo fundamentalista xiita do Líbano apoiado financeiramente pelos iranianos) entra também na Síria. A Arábia Saudita e o Qatar respondem com o aumento da ajuda aos rebeldes, agora através da Jordânia, também opositor do regime Bashar al-Assad. O Médio Oriente ficava agora separado entre sunitas, que apoiam os grupos rebeldes, e os xiitas, do lado do presidente sírio.

Sunitas e Xiitas

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Os sunitas formam o maior ramo do Islão. Em 2006, 84% dos muçulmanos pertenciam ao sunismo. Alguns afirmam que o termo deriva de uma palavra que significa “um caminho moderado”, referindo-se à ideia de que o sunismo toma uma posição mais neutra do que, por exemplo, os xiitas.

Neste ramo incluem-se, portanto, o Exército Livre da Síria, a Frente Islâmica, mas também os radicais do al-Nusra e do Estado Islâmico. Este conjunto é denominado simplesmente como oposição (a Assad).

Os xiitas são portanto a minoria. Representam 16% do total de muçulmanos. E deste ramo faz parte o líder da Síria Bashar al-Assad e os seus apoiantes.

Os xiitas estão espalhados por todo o mundo árabe. No entanto, quase toda a população do Irão pertence a este ramo e no Iraque, onde 95% dos seus habitantes são muçulmanos, quase dois terços são xiitas. Na Síria a percentagem de muçulmanos desta vertente é baixa, mas tem liderado o país quase desde o seu início. E com uma autoridade tão forte que praticamente não deixou espaço à oposição.

 

É então que a coligação militar liderada pelos Estados Unidos entram no teatro das operações. Para conter os crimes de guerra atribuídos ao regime sírio, Obama anuncia o apoio a grupos de rebeldes moderados através de treino e equipamento.

Em 2014 surgiu outro interveniente que viria a mudar o rumo das hostilidades e a baralhar tudo: o Estado Islâmico (EI). A chegada do EI fez com com que Assad deixasse de ser o centro das hostilidades. A coligação internacional, por exemplo, passou a concentrar-se mais em derrotar o Estado Islâmico do que a combater os alegados crimes de guerra do presidente sírio.

O surgimento do EI chamou a jogo a Rússia. Em setembro deste ano, Vladimir Putin, usa a sua força aérea para, supostamente, bombardear e combater o avanço jihadista. Mas muitos países, incluindo os EUA, alegam que os russos combatem, na verdade, os grupos de oposição ao governo de Assad.

O emaranhado de alianças e inimigos:16 gráficos para o perceber bem

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Estado Islâmico

Foi a entrada do Estado Islâmico que mudou o rumo e a natureza da guerra civil da Síria. Luta contra todos e não é apoiado por nenhuma nação, mas controla já grande parte do território do país.

Inimigos militares – Rússia, coligação liderada pelos EUA, Irão, Qatar, Arábia Saudita, Frente Islâmica, curdos sírios, Governo sírio, Exército Livre da Síria e Al-Nusra.

Apenas a Turquia e o Iraque se abstiveram de tomar uma posição em relação ao ‘Daesh’.

O esquema de alianças é de grande complexidade. A maioria das partes apoia grupos que são inimigos dos seus aliados ou vice-versa. Isto faz com que alguns não consigam estabelecer contra quem combatem, porquê e por quem lutam.

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