Cientistas portugueses descobriram, numa experiência com peixes-zebra, que há órgãos como o intestino que envelhecem mais cedo, devido ao ritmo acelerado dos “relógios moleculares” das células, que leva ao aparecimento de lesões.
O trabalho, conduzido por investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), foi publicado na revista PLOS Genetics.
Os “relógios moleculares” das células são os telómeros, as pontas dos cromossomas que asseguram que não há perda de qualquer material genético durante a divisão celular num tecido ou órgão como o intestino, o músculo, o sangue ou os rins.
Acontece que, com o avançar da idade, os telómeros, estruturas protetoras do genoma (código genético), vão encurtando, em resposta às contínuas divisões de células, expondo, assim, o genoma a danos.
Para manterem um tamanho normal, as extremidades dos cromossomas teriam de ser alongadas pela enzima telomerase. Só que a maioria das células do corpo “desliga esta enzima” no momento em que uma pessoa nasce, esclarece o IGC em comunicado.
A equipa coordenada por Miguel Ferreira Godinho descobriu que os telómeros, além de encurtarem mais depressa nuns órgãos do que noutros, mais no intestino do que no músculo, por exemplo, fazendo com que envelheçam mais cedo, também “acumulam danos no ADN”, quando curtos, levando ao aparecimento de lesões nas células, disfuncionalidades nos órgãos e tecidos.
“Identificámos tecidos-chave onde o encurtamento dos telómeros se torna realmente limitante para o funcionamento dos órgãos numa idade avançada”, afirmou o investigador do IGC, citado num comunicado da instituição.
O estudo pretende verificar, numa próxima etapa, se ao se “expressar atempadamente” a enzima telomerase em órgãos específicos, como o intestino ou o músculo, é possível “evitar a disfunção do tecido e reverter a incidência de doenças do envelhecimento, nomeadamente o cancro”, assinalou Miguel Ferreira Godinho na mesma nota.
Para a investigação, a equipa partiu do peixe-zebra. Porquê? Porque “os telómeros do peixe-zebra são do mesmo tamanho do dos humanos”, explicou à Lusa Madalena Carneiro, que faz parte da equipa.
Os cientistas mediram o tamanho das pontas dos cromossomas nos testículos, sangue, intestino, músculo e rins de cadáveres de peixes com diferentes idades, desde o estado larvar até ao adulto com um ano e ao idoso com três anos.
As medições foram comparadas com as obtidas com peixes modificados geneticamente, aos quais propositadamente foi-lhes reduzido, numa fase mais precoce, o tamanho dos telómeros para um estado crítico.
Madalena Carneiro sublinhou que os peixes com mutação genética revelaram mais cedo, com 1 ano, disfunções nos órgãos, como inflamação intestinal e degeneração das fibras musculares, do que os peixes mais velhos, com 3 anos, que evoluíram sem essa mutação.
Em geral, os peixes mais velhos têm telómeros mais curtos e lesões em órgãos específicos.
“O envelhecimento predispõe os organismos a desenvolverem várias doenças, como as cardiovasculares e o cancro (…). Queremos identificar os mecanismos biológicos que promovem o envelhecimento, porque isso pode auxiliar no tratamento das doenças associadas ao envelhecimento”, frisou a investigadora. Um desses mecanismos é, precisamente, o encurtamento das extremidades dos cromossomas que a equipa do Instituto Gulbenkian de Ciência está a estudar.