A consultora financeira Palomar considera que o relatório da Kroll sobre a dívida oculta em Moçambique “tem falhas, está incompleto, e contém uma série de afirmações enganadoras e erradas”, lamentando não ter colaborado no processo.

“Apesar da oferta da Palomar para reunir com a Kroll, em nenhuma altura até à divulgação do relatório a Kroll pediu qualquer informação ou procurou colaboração da Palomar para perceber as transações em causa”, lê-se numa nota da consultora enviada à Lusa.

O resultado, acrescentam, é que “o relatório tem falhas e está incompleto, e contém uma série de afirmações enganadoras e erros materiais”, nomeadamente no que diz respeito a esta consultora financeira e de gestão de ativos com forte presença em África.

No comentário à divulgação, no sábado, do sumário executivo da auditoria apresentada pela consultora Kroll à Procuradoria-Geral da República de Moçambique, cuja publicitação era uma das condições defendidas pelos doadores e pelas instituições financeiras internacionais para voltarem a ajudar o país, o nono mais pobre do mundo.

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Na declaração enviada à Lusa, a Palomar exemplificou que a auditoria sugere que esta consultora “aconselhou todos os empréstimos iniciais às três empresas moçambicanas, o que é simplesmente errado”.

A Palomar “não esteve envolvida no lançamento dos empréstimos da Proindicus em 2013 em qualquer formato, nem com o empréstimo da Ematum em 2013, e foi uma co-facilitadora não remunerada da MAM em maio de 2014”.

O relatório, conclui a gestora de ativos financeiros, “arrisca-se a escurecer as águas à volta de um assunto complexto e importante, o que é uma desilusão”. A auditoria às dívidas ocultas de Moçambique foi divulgada no sábado, mas deixou por esclarecer o destino dos dois mil milhões de dólares contraídos por três empresas estatais entre 2013 e 2014, disse a PGR no domingo.

Lacunas permanecem no entendimento sobre como exatamente os 2 mil milhões de dólares (1.780 milhões de euros) foram gastos, apesar dos esforços consideráveis” para esclarecer o assunto, refere a PGR em comunicado sobre a investigação da Kroll.

Por outro lado, “a auditoria constatou que o processo para a emissão de garantias pelo Estado parece ser inadequado, sobretudo no que respeita aos estudos de avaliação que devem ser conduzidos, antes da sua emissão”, acrescenta-se.

As garantias foram passadas sob a presidência de Armando Guebuza, sem conhecimento do parlamento, nem dos parceiros internacionais – como o Fundo Monetário Internacional (FMI) – para suportar os empréstimos contraídos pelas empresas Ematum, Proindicus e MAM.

O escândalo das dívidas ocultas rebentou em abril de 2016 – a dívida de 850 milhões de dólares (759 milhões de euros) da Ematum era conhecida, mas não os 622 milhões (556 milhões) da Proindicus e os 535 (478) da MAM – e atirou Moçambique para uma crise sem precedentes nas últimas décadas.

Os parceiros internacionais suspenderam apoios, a moeda desvalorizou a pique e a inflação subiu até 25% em 2016, agravando o custo de vida já de si elevado para os cidadãos. Segundo a procuradoria, a investigação da Kroll descobriu “divergências entre as explicações” para uso da verba e detetou “falhas graves na forma como foram feitas as avaliações para emissão de garantias pelo Estado”.

Há mesmo um valor de mil milhões de dólares (893 mil milhões de euros) correspondente a três garantias, do total de cinco que foram emitidas, em que “não há evidências de ter sido feita qualquer avaliação”.

Foram ainda identificados “potenciais conflitos de interesse em relação a algumas pessoas intervenientes no processo de autorização das garantias do governo para as empresas auditadas”.

A PGR destaca ainda que o Grupo Privinvest, contratado pelas empresas estatais para fornecer bens e serviços para os quais supostamente serviria o dinheiro, teve “um papel determinante no projeto” participando em quase todo o seu desenho, inclusivamente na ligação aos bancos que emprestaram o dinheiro, o Credit Suisse e o VTB.