Apanhar um elevador no El Corte Inglés de Lisboa — essa hercúlea tarefa que testa os limites de paciência de qualquer um — passou a ser mais apetecível, com a inauguração do novo Gourmet Experience, um paraíso literal (fica no último andar do edifício) para qualquer foodie que queira intercalar as suas compras com uma refeição que até pode ter estrela Michelin.
Ocupando todo o sétimo andar do edifício, este espaço que só não é food court porque tem serviço à mesa, reúne 17 pontos de alimentação, uma zona de esplanada com vista para Lisboa e o Club Del Gourmet, o supermercado refinado que anteriormente morava no piso térreo do espaço comercial. Números à parte, vamos à descrição daquilo que aqui se pode comer, quem o cozinha e o que pode comprar.
A primeira coisa que se vê ao chegar a este sétimo piso é a zona da Landeau, marca criada por Sofia Landeau e que se especializa num pecaminoso bolo de chocolate feito em três camadas. Parece estranho, começar logo pela parte das sobremesas — do lado oposto há o stand da Alcôa, pastelaria especializada em doces conventuais que nos têm ajudado a engordar desde 1957 –, mas são elas que se encontram na entrada do Gourmet Experience.
A distribuição dos restaurantes é feita num “U” que abraça uma área de mesas. É no início que encontramos dois dos três espaços sob a alçada de José Avillez, o super-chef/empreendedor português. O primeiro é o Jacaré, um restaurante descontraído, decorado em tons de verde e bege, onde carnes grelhadas e comida vegetariana comandam a ementa. Aqui pode encontrar pratos como cachaço de porco na brasa com molho chimichurri e arroz Biro -Biro (uma espécie de arroz xau-xau brasileiro), a 18€, ou o caril verde de grão e legumes (14€). Logo ao lado — os espaços partilham a mesma cozinha — surge a Tasca Chic, dedicada aos restaurantes clássicos do país. É entre as paredes forradas a azulejos bordeaux que se podem provar especialidades mais tradicionais como plumas de porco alentejano com migas e favinhas (19€) ou um bacalhau à Gomes de Sá com creme de cebolada, a 18€.
O Observador falou com José Avillez e, em relação a este novo projeto, o chef afirma que esta estreia numa superfície comercial “foi uma oportunidade e um convite, que surgiram no momento certo”. “O mercado da restauração está com grande dinamismo, o Grupo José Avillez está a viver um momento de expansão e procurávamos espaços para alguns conceitos e projetos já estruturados internamente”, acrescentou.
Antes de se chegar à zona da esplanada, perto do The G Bar (espaço da marca Gin Lovers que quer promover festas sunset no futuro), surge O Poke, o sexto restaurante do chef Kiko Martins. Aquando da visita do Observador, o chef explicou que o nome desta sua novidade vem de um prato típico havaiano. O Poke, segundo o cozinheiro,”é muito diferente do ceviche”, especialidade peruana que já domina há alguns tempos. Enquanto “o ceviche é mais ácido, leva o leite de tigre [molho cítrico]”, o poke “é mais salgado”, muito por culpa do molho Ponzu, ingrediente japonês que faz parelha com cubos de atum crus para formar a versão mais típica deste prato. “Se comer dois ceviches fico a pedir um kompensan, se comer dois pokes, fico a pedir um copo de água”, acrescentou, entre risos, o chef.
Continuando a caminhar chega à ala mais internacional deste Gourmet Experience. Primeiro encontra, meio escondido, o bar de pintxos Imanol, do chef basco Aitor Ansorena. Comida simples e honesta como o delicioso entrecôte grelhado com batata frita dominam a ementa deste cantinho.
Em todos os jantares de família ou de amigos há sempre alguém mais animado que os outros todos, seja o tio que conta piadas secas ou o primo afastado que gosta de cantarolar depois de uns copos a mais. Ora neste sétimo andar, a Barra Cascabel é essa pessoa. Este conceito do chef mexicano Roberto Ruíz (uma estrela Michelin no Punto MX, em Madrid. Foi o primeiro mexicano a conquistar a distinção na Europa) em parceria com José Avillez (duas estrelas) dedica-se à comida descontraída e festiva. Não acredita? Basta saber que durante os poucos minutos em que o Observador a visitou a equipa de cozinha cantou, bateu palmas e meteu-se com os clientes usando um megafone. Quando aqui passar faça um favor a si mesmo e prove a deliciosa tostada de Bonito (espécie de atum), uma mistura de peixe com salsa de esquites, pepino, hortelã e salsa de chile habanero que é servida num círculo crocante feito com farinha de milho (custa 11€). Sobre este Barra Cascabel, José Avillez diz que quando estava a planear os seus projetos para o El Corte Inglés, teve oportunidade de estar com o chef Roberto Ruíz, “cujo trabalho no Salón Cascabel e no Punto MX já conhecia e admirava”. O chef Ruíz mostrou-se em “desenvolver o conceito” e isso foi o suficiente para aceitar a parceria com o Grupo José Avillez.
Ao Observador, o próprio chefe mexicano explica que segue o trabalho de Avillez “há quatro anos” e que o facto de “terem vários amigos em comum” facilitou esta aproximação. O que o convenceu a apostar m Lisboa? “A oportunidade de dar a conhecer sabores autênticos” e uma “cozinha muito nossa, mexicana”. O facto deste projeto já ter vingado em Madrid foi garante acrescido de que tudo correria bem.
Ao seu lado está o Balcão do chef Henrique Sá Pessoa, espaço semelhante ao muito bem sucedido Tapisco, no Príncipe Real, em Lisboa. “Mantivemos as cores como o branco e o cobre. O balcão também é muito semelhante ao que temos lá [no Tapisco]”, explicou Sá Pessoa depois de nos apresentar um guloso bacalhau confitado com puré de grão e tomate confit (15€) e uma dose de lombo de atum com escabeche de legumes (15€). De ar cansado — a alta movimentação de pessoas era tida como culpada –, o chef do Alma (uma estrela Michelin) refere ainda a capacidade dos seus companheiros de criarem conceitos diferentes, afirmando ainda que “Se o Zé [Avillez] está cá, é porque isto vai correr bem.”
Outro representante espanhol neste Gourmet Experience é o galego Pepe Solla (uma estrela Michelin na Casa Solla, em Pontevedra), que aqui se apresenta com o Atlántico, reprodução de um outro restaurante seu em Madrid. Dedicado quase na totalidade àquilo que o mar nos dá, este espaço serve pratos como as deliciosas zamburinhas (umas vieiras mais pequenas) com alho e azeite, a 14,50€, e uma igualmente especial posta de pescada com puré de batata e molho ajada, que é feito à base de pimentão e custa 21€.
Em declarações ao Observador, o chef espanhol conta que o Atlántico é um projeto que, inicialmente, surgiu em Madrid, há dois anos, “com o intuíto de mostrar a mais pessoas a qualidade dos produtos galegos” e de olhos postos numa possível expansão. “Quando visitei Lisboa em Julho fiquei muito admirado com o quanto ela tinha mudado”, explica o cozinheiro. Por este motivo percebeu que trazer o Atlántico para a capital portuguesa seria uma decisão “estupenda”. Pepe Solla pretende então mostrar uma “cozinha galega mas do Mundo” e acredita que a mesma terá sucesso neste Gourmet Experience. Pode demorar mais tempo — “estou no mesmo espaço que chefs portugueses já estabelecidos, é normal que as pessoas os procurem numa primeira visita” –, mas lá chegará.
Voltando à categoria dos doces, destaque ainda para a banca dos gelados Nannarella e à da Godiva, marca belga de chocolates.
Tudo isto descreve uma das alas deste piso, já que a outra é inteiramente dedicada a um novo e melhorado Club Del Gourmet, a mercearia requintada da cadeia comercial espanhola. De um espaço pequeno e meio escondido passou para um outro que é o seu oposto: grande, espaçoso e bem iluminado. É aqui que encontra uma cafetaria, um wine bar que vende ostras e champanhe a copo e o Cigar World, um verdadeiro altar para qualquer amante de um bom charuto.
Artigo atualizado às 18h50 de dia 27/12/2017