A reunião do Conselho do BCE desta quinta-feira trouxe uma simples (mas significativa) alteração na política monetária na zona euro. O Banco Central Europeu (BCE) deixou cair da sua posição oficial a disponibilidade para aumentar os estímulos monetários (as compras de dívida no mercado), caso isso venha a ser necessário. É mais um passo na normalização da política do BCE, depois das medidas inéditas (e controversas) que a autoridade monetária empregou para combater a crise.

A decisão está a ser explicada em detalhe pelo presidente, Mario Draghi, na conferência de imprensa, a partir de Frankfurt. O desafio de Draghi, numa altura delicada para os mercados financeiros, é explicar a decisão de retirar essa referência explícita sem desencadear uma reação adversa nos mercados financeiros, designadamente com uma valorização indesejável do euro.

Além da política monetária (embora também haja uma ligação), o momento mais marcante da conferência de imprensa foi a crítica de Mario Draghi a Donald Trump, que ameaçou entrar numa “guerra comercial” com o lançamento de taxas alfandegárias contra países como os da Europa. “Quaisquer que sejam as convicções de cada um sobre comércio, a posição do Conselho do BCE é que disputas sobre esta matéria devem ser resolvidas com uma abordagem multilateral. Decisões unilaterais são perigosas.” avisou Mario Draghi.

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Como é que este risco vai influenciar a política do BCE. Depende de três questões, ou fatores. “Vai haver retaliação ou não? E qual vai ser o efeito para a taxa de câmbio?”, esclareceu Draghi. O terceiro efeito: “depois há o efeito sobre a confiança, que é muito difícil de avaliar, mas se for negativa isso será um fator desfavorável para a inflação e para o crescimento”, comentou o presidente do BCE.

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Decisão de deixar cair frase explícita “foi unânime”

Segundo Mario Draghi, “foi unânime” a decisão de retirar a frase em que o BCE fazia uma referência explícita à disponibilidade para aumentar as compras em dimensão e/ou em duração. Mas o facto de o BCE ter retirado essa passagem é uma vitória para aqueles dentro do Conselho que querem acelerar a retirada dos estímulos monetários e o fim da intervenção controversa do banco central nos mercados de dívida.

O que mudou? Nos últimos meses “tivemos várias revisões do crescimento económico e um aumento da convergência” entre os indicadores nacionais que o BCE segue de perto. Foi porque se confirmaram as melhores expectativas em relação à economia, até ao momento, que o banco central decidiu retirar essa referência explícita. Mario Draghi acrescentou que o Conselho do BCE considera que são “improváveis” os eventos que poderiam agravar as condições (no crescimento e, sobretudo, na inflação) ao ponto de isso poder levar a uma mudança da posição do BCE.

Ainda assim, nesta fase parece claro que o programa não será terminado em setembro de 2018 mas que irá continuar, pelo menos, até ao fim do ano, ainda que a um ritmo mais reduzido. O BCE chegou a comprar 80 mil milhões de euros em dívida de países e empresas da zona euro, por mês, um ritmo que caiu para 60 mil milhões e, mais recentemente, para 30 mil milhões. Vários analistas acreditam que a partir de setembro as compras irão reduzir-se para 15 mil milhões, para depois desaparecerem em dezembro.

Quanto a subidas de taxas de juro, outra ferramenta importante da política monetária do BCE, essas só deverão sair de zero a partir do verão de 2019, acreditam economistas, salvo se houver acontecimentos imprevistos como os que podem estar ligados a uma eventual “guerra comercial” entre os EUA e outros blocos económicos.

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BCE revê em baixa para 1,4% previsão de inflação para 2019 na zona euro

O Banco Central Europeu (BCE) anunciouque reviu em baixa a previsão de inflação na zona euro para 2019, mas mostrou-se mais otimista em relação ao crescimento em 2018.

A instituição liderada por Mario Draghi previu uma inflação de 1,4% em 2019 (1,5% na anterior previsão divulgada em dezembro), mas apontou para um crescimento da economia de 2,4% em 2018 (2,3% em dezembro).

As outras previsões até 2020 ficam inalteradas. O BCE continua a apontar para uma inflação de 1,4% em 2018 e de 1,7% em 2020, o que significa uma lenta aproximação em relação ao objetivo de uma inflação ligeiramente abaixo de 2%. O crescimento da economia deve abrandar para 1,9% em 2019 e 1,7% em 2020, como já tinha sido indicado em dezembro.