Um suplemento que seja composto por um só elemento, como uma vitamina ou um mineral, é sempre só um suplemento. Um alimento é composto por várias moléculas que interagem umas com as outras e cujo efeito benéfico nas pessoas pode resultar desta combinação e não do nutriente específico. Não há evidência do resultado da suplementação com ómega 3 para a prevenção de doença cardiovascular, referiu Renata Barros, professora na Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto. “Ingerir um suplemento de N-3 não é o mesmo que comer peixe.” A suplementação alimentar foi um dos temas em discussão no XVII Congresso de Nutrição e Alimentação, em Lisboa.
Venha o cálcio, as vitaminas B6, B12, D, E e os multivitamínicos, venha o ácido fólico e o beta-caroteno, mas a verdade é que nenhum deles consegue demonstrar uma diminuição do risco de doença cardiovascular, sublinhou Renata Barros. Alguns até podem ter um efeito contrário e aumentar o risco ou trazer outros problemas para a saúde. Por exemplo, a suplementação com vitamina D e cálcio está associada a um aumento dos cálculos renais.
“Apesar do entusiasmo [52% dos norte-americanos reportaram o uso de pelo menos um suplemento], a maior parte dos ensaios clínicos aleatórios de suplementos de vitaminas e minerais não demonstraram benefícios claros na prevenção primária e secundária de doenças crónicas não relacionadas com deficiências nutricionais”, escrevem JoAnn E. Manson e Shari S. Bassuk, especialistas em Medicina Preventiva, num artigo de opinião na revista científica JAMA (The Journal of the American Medical Association). “A investigação mostra que os resultados positivos estão mais fortemente relacionados com a dieta e com tipos específicos de comida do que com a toma individualizada de nutrientes ou micronutrientes.”
Perceber se estes suplementos têm algum efeito na prevenção de doenças e na melhoria de vida das pessoas que os tomam é de particular importância. Isto porque, segundo o Inquérito Alimentar e da Atividade Física 2015-2016, 26,6% da população portuguesa usa suplementos alimentares. A grande maioria destas pessoas procura suplementação com minerais (36,3%), multivitamínicos (36,2%) ou vitaminas (20, 8%).
Ainda assim, existem 22,5% das pessoas que tomam suplementos, que usam outro tipo de produtos. E no mercado nacional existem mais de 400 substâncias que pretendem ser usadas no controlo de peso e controlo metabólico, referiu Diana Teixeira, investigadora no Cintesis e na Universidade Nova de Lisboa.
Pegando nos suplementos mais comuns — a cafeína, a epigalocatequina galato presente no chá verde, o glucamanano (uma fibra solúvel) e os probióticos —, a conclusão parece ser clara e transversal: não há evidência científica que suporte a suplementação com estes produtos. Até podem ter as características para os efeitos a que se propõe, até podem resultar nos ensaios com ratos, até podem ter um significado estatístico, mas não têm um significado clínico. Por outras palavras, não resulta (ou o impacto mal se consegue medir).
Não só não resulta, como muitas pessoas chegam às urgências com sobredosagem de alguns destes produtos, como os suplementos energéticos, os de performance física e sexual e os de perda de peso. Além disso, continua a haver pouca fiscalização daquilo que consta nos produtos e que muitas vezes não é referido no rótulo.
“Não encontrámos evidência científica que suporte o uso de antioxidantes na prevenção primária ou secundária. Beta-caroteno e vitamina E parecem aumentar a mortalidade, assim como doses mais altas de vitamina A”, escreveu a Cochrane, numa revisão de artigos científicos que avalia a suplementação com antioxidantes para prevenir a mortalidade. “Os suplementos antioxidantes deviam ser considerados produtos médicos e deviam ser suficientemente antes de ser comercializado.”
E é neste ambiente de regulamentação e fiscalização deficiente, segundo as nutricionistas presentes neste painel, que surge ainda outra categoria de suplementos alimentares: os alimentos funcionais. Para os nutracêuticos as linhas parecem ser ainda mais ténues, afirmou Mónica Sousa, professora na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. É que o nutracêutico continua a ser um alimento ou um suplemento alimentar, mas com potenciais propriedades farmacológicas. Ora, os alimentos não servem para tratar nada e não podem fazer alegações farmacológicas. O que deixa estes produtos num limbo. Mónica Sousa simplifica: “Os nutracêuticos não são um grupo, são um conceito de marketing”.
Corrigido: instituição de Mónica Sousa