António Costa “não gosta de tabus” e por isso terminou o discurso da rentrée, na Festa de Verão do PS, em Caminha, a dizer o que quer no próximo ano político: nada menos do que “ganhar” os três atos eleitorais de 2019 — das europeias às legislativas, com as regionais da Madeira pelo meio –, mas sem colocar a expectativa tão alta ao ponto de pedir maioria absoluta. Para isso, sublinhou, é preciso a esquerda estar coordenada, aprovar o próximo Orçamento do Estado sem sobressaltos, e não se aventurar em eleitoralismos sob pena se a esquerda, no seu todo, ser prejudicada nas urnas. “Um voto que se ganha pode ser um país que se perde”, disse Costa em Caminha.

A formulação usada pelo primeiro-ministro este sábado, que deverá ser repetida até à exaustão ao longo do ano eleitoral que se segue, é a de pedir “mais força para o PS” — sem descurar a importância que PCP, BE e PEV têm tido nos feitos até aqui conquistados, mas sublinhando que sem o PS nada disso era possível. Os primeiros, diz Costa, são “essenciais”, mas o PS, diz, é “imprescindível”.

“Temos gosto e avaliamos muito positivamente o trabalho com os nossos parceiros parlamentares, eles têm sido essenciais, mas o PS é imprescindível para que haja um governo de esquerda em Portugal. É por isso necessário dar força ao PS para darmos continuidade às boas políticas que têm permitido estes bons resultados”, disse num discurso de cerca de 40 minutos que marca a rentrée socialista, depois de dar conta da evolução positiva dos indicadores económicos nos últimos três anos, em contraste com os indicadores económicos registados antes de 2015, durante a governação do PSD/CDS.

Mais à frente, até voltaria a repetir a ideia: “Para que se possa fazer ainda melhor é importante dar força ao PS, não vale a pena ilusões. Não há nenhum governo progressista em Portugal sem que o PS tenha força para formar esse governo”.

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O desafio mais imediato, contudo, é já a aprovação do próximo Orçamento do Estado, para “não estragar aquilo que já conseguimos, porque ninguém nos perdoaria se fosse preciso cortar o que conseguimos repor, ou aumentar o que já conseguimos baixar”. “E para não estragar, não podemos pôr em causa nem a estabilidade política que esta solução de parceria tem permitido, nem ter uma gestão orçamental irresponsável que faça derrapar o défice e aumentar a dívida”, disse, resumindo a ideia para BE, PCP e PEV ouvirem: “Termos uma boa gestão orçamental não é ser de esquerda ou de direita, é governar bem”.

Depois do balanço positivo dos “mil dias” de governação, António Costa deixou uma certeza: não é por este ser um ano eleitoral que o governo vai deitar por terra o que até aqui foi “conquistado”. Ou seja, em vésperas de retomar as negociações com a esquerda para o último Orçamento do Estado da legislatura, o secretário-geral do PS e primeiro-ministro fecha a porta a eleitoralismos — com avisos à esquerda. “Ninguém pense que para o ano, por ser ano eleitoral, vamos pôr em causa o que já conquistámos, ou vamos sacrificar o rigor orçamental em nome de votos. Porque um voto ganho pode ser um país que se perde. Estamos aqui para continuar a recuperar o país e não para ganhar os votos a qualquer custo”, disse.

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Além dos avisos deixados aos parceiros da esquerda no dia em que inaugura o ano eleitoral, António Costa levantou também a ponta do véu do Orçamento do Estado para 2019, que vai ser o último da legislatura e, porventura, aquele onde BE, PCP e PEV vão apostar todas as fichas das exigências. Confirmando o que tinha sido avançado este sábado pelo semanário Expresso, Costa promete criar condições orçamentais para que os portugueses emigrados queiram regressar ao país: “No próximo OE, todos os que queiram regressar a Portugal entre 2019 e 2020 vão ficar a pagar metade da taxa de IRS que pagariam”, anunciou.

Governo vai oferecer desconto de 50% no IRS a emigrantes que regressem

Mais: valorização do interior. Costa prometeu ainda que irá constar no Orçamento do Estado do próximo ano “as medidas que foram aprovadas no Conselho de Ministros de 14 de julho” sobre a valorização do interior, onde se encontra a diminuição de IRC para as empresas do interior em função do número de postos de trabalho que criem; ou a afetação de 1700 milhões de euros de fundos comunitários para projetos empresariais no interior do país que criem emprego qualificado; bem como a diminuição das portagens para viaturas comerciais nas estradas no interior do país.

O investimento na ferrovia, um tema que tem estado debaixo de fogo nas últimas semanas, também vai ser prioritário no próximo Orçamento do Estado. Segundo António Costa, a ligação ferroviária a Espanha e à Europa tem sido prioritária, com o primeiro-ministro a garantir que “estamos a realizar o maior investimento dos últimos 100 anos com a construção da linha de caminhos de ferro que liga Sines a Badajoz, para ligar o interior alentejano ao centro da península ibérica” e “estamos a fazer o maior investimento ferroviário das últimas décadas”, nomeadamente na linha da beira baixa, na linha da baira alta e na eletrificação da linha do Minho, disse.

O caminho da devolução de rendimentos, de resto, é para continuar, com Costa a garantir que “no próximo Orçamento 98% das pensões vão subir, porque este ano vamos crescer mais de 2% na economia”. Mais: os “abonos sociais vão aumentar”, “a progressão das carreiras dos funcionários públicos vai continuar” e “as famílias portugueses vão pagar menos mil milhões de euros de impostos do que pagavam em 2015″, como consequência das alterações feitas ao nível do IRS (desde os novos escalões à atualização do mínimo de existência, passando pela eliminação da sobretaxa). Também o salário mínimo nacional vai “continuar a subir” em 2019, depois de já ter “aumentado 15% desde 2015”.

No final, entre elogios aos feitos dos últimos mil dias e promessas de “continuidade” das políticas, Costa deixou uma promessa, em jeito de se descolar do estereotipo associado às governações socialistas despesistas: “No dia em que deixar de exercer as funções que exerço não deixarei o país pior do que encontrei, deixarei muito melhor do que encontrei”, rematou.