O presidente da Comissão Europeia arrancou o discurso do estado da União com sucessivos apelos à unidade, numa altura em que as fraturas no projeto europeu minam a reta final da presidência Juncker. Numa intervenção dirigida ao Parlamento Europeu, em Estrasburgo, Jean- Claude Juncker diz que se há paz no continente é por causa do projeto europeu e que é importante, por isso, “mostrar respeito, parar de arrastar o nome da União Europeia pela lama” e, acrescentou numa referência ao discurso político que tem vindo a ganhar terreno em vários países, “abandonar os ímpetos nacionalistas que projetam o ódio e destroem tudo pelo caminho”.

“Párem com o triste espetáculo das divisões entre o este e o oeste, a Europa merece melhor”, continuou.

Uma questão que ainda no dia anterior tinha deixado claro o ambiente que se vive hoje na Europa. Precisamente por causa da discussão do caso húngaro, Juncker garantiu que a Comissão Europeia vai resistir “a todos ataques ao estado de Direito” e defendeu que, se for preciso, se deve aplicar o polémico artigo 7 — se que no limite retira aos estados membros o direito de voto. Ainda assim, não houve nenhuma referência específica à Hungria, com Juncker a preferir falar dos vários estados onde há problemas (a Polónia é um deles, tal como a Eslováquia ou a Roménia).

Daqui até às próximas europeias, continuou, “a Europa tem de mostrar que é capaz de superar as diferenças norte sul, este oeste, direita esquerda. Em conjunto podemos semear uma Europa mais soberana”.

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Segurança e Imigração

Dando o exemplo daquilo que se passa hoje em Idlib, na Síria, Juncker disse que  a ordem internacional não é a mesma que durante décadas serviu os europeus, e que “as velhas alianças podem não ser as mesmas amanhã”. Pediu, por isso, uma Europa mais forte,  pelo multilateralismo, com capacidade para atuar no xadrez internacional.

Esta é uma das prioridades de Juncker, a Cooperação Estruturada Permanente e o Fundo Europeu de Defesa. “Não queremos militarizar a Europa”, explicou. “Não seremos uma fortaleza, nem somos uma ilha” continuou, mas só “com uma Europa forte conseguimos proteger os cidadãos das ameaças externas, do terrorismo às alterações climáticas”.

Quanto ao problema da imigração, que tem também contaminado a política interna de muitos estados-membros, Juncker fez o anúncio de 10 mil novos polícias para a agência Frontex (Guarda de Fronteiras e Costeira) até 2020, com o objetivo de reforçar a proteção das fronteiras europeias. Juncker diz, no entanto, que quer atuar diretamente nos locais de origem dos imgrantes clandestinos. Para isso, propôs avançar com uma parceria Europa-Africa, que o presidente da Comissão Europeia espera possa ajudar a criar cerca de 10 milhões de empregos e atrair mais investimento para o continente. “África não precisa de caridade, precisa de uma parceria equilibrada”.

Ao mesmo tempo pediu mais rotas legais para a entrada de imigrantes, dizendo que a Europa precisa de imigrantes qualificados, também assumiu o compromisso de acelerar a repatriação dos imigrantes ilegais. “Não podemos procurar soluções ad-hoc de cada vez que chega um novo barco. A solidariedade temporária não chega.”

Brexit, euros e fundos comunitários

Uma das principais crises a marcar a presidência Juncker é a saída do Reino Unido. E neste último discurso do estado da União, houve referências ao problema que ainda não está resolvido. “Respeito, mas lamento muito”, disse com a garantia de que o Reino Unido nunca será um país como outro qualquer. Mas já tinha deixado o aviso: “Se saem da União Europeia, não podem esperar pertencer ao mercado único ou só à parte que vos interessa”. Ou seja, o clube é para os sócios, quem sai perde privilégios.

Outro desafio importante e para o qual o relógio começou a contar é a negociação do próximo pacote de fundos comunitários. As negociações estão em marcha e o presidente da Comissão Europeia deixou claro que quer que o processo fique concluído antes das próximas eleições europeias – mais uma questão que promete agitar Bruxelas nos próximos meses.

Em maio do próximo anos os europeus vão às urnas e Jean-Claude Juncker quer medidas para garantir que as eleições  vão estar  imunes a “manipulações por países terceiros e interesses privados”. O presidente do executivo continuou: “No nosso mundo online, o risco de interferências e de manipulação jamais foi tão elevado. Chegou o momento de adaptar as nossas regras eleitorais à era digital, a fim de proteger a democracia europeia”.

Para acelerar as decisões no quadro comunitário, insistiu também que é preciso mais tomadas de decisão por maioria qualificada, em vez de unanimidade. É o que já está previsto no Tratado de Lisboa, mas é um tema sensível para países de menor dimensão, que temem perder poder.

Quanto ao euro, Juncker também promete propostas da Comissão para fortalecer a moeda única na economia internacional e destacou o “absurdo de companhias europeias comprarem aviões europeus em dólares”.

Este foi o último discurso do estado da União de Jean-Claude Juncker, como presidente da Comissão Europeia. No final, cerca de dois terços dos eurodeputados aplaudiram de pé.

Este modelo de debate foi criado na vigência de Durão Barroso, em Setembro de 2010. Hoje é tido como um momento fundamental do processo de controlo democrático que o Parlamento Europeu exerce sobre o executivo comunitário.

Em atualização