Paulo Colaço, um dos membros do Conselho de Jurisdição Nacional (CJN) e apoiante de Rui Rio desde a primeira hora nas diretas, demitiu-se esta segunda-feira daquele órgão e anunciou que vai apresentar em breve “uma ação disciplinar contra Paulo Mota Pinto, visando a sua destituição de Presidente tanto da Mesa do Conselho como do Congresso Nacionais“. A decisão de Paulo Colaço consta de uma carta, à qual o Observador teve acesso, enviada esta manhã ao presidente do CJN, Nunes Liberato. Na sequência desta decisão, está o facto de Mota Pinto ter recusado ouvir o Conselho de Jurisdição durante o Conselho Nacional sobre a forma de votação da moção de confiança (por braço no ar ou voto secreto), o que motivou o abandono da grande maioria dos membros.

Paulo Colaço, em declarações ao Observador, acrescenta que não perdoa a Mota Pinto ter “transformado o Conselho Nacional num Congresso eleitoral do Partido Comunista” e diz que o que se passou “na Venezuela seria normal, no PSD não“. Contactado pelo Observador, Paulo Mota Pinto não quis fazer qualquer comentário.

Na carta enviada a Nunes Liberato, Paulo Colaço afirma que, na gestão do último Conselho Nacional, “Mota Pinto teve um conjunto de comportamentos graves e em crescendo”, elencando uma série atos que lamenta e que imputa ao presidente da Mesa:

Começou por tentar que o CJN enjeitasse as suas funções jurisdicionais; quis impedir que este órgão usasse da palavra para exercício dessas funções; mais tarde, impediu mesmo que o CJN falasse; ignorou um parecer vinculativo nosso; e chegou ao cúmulo de negar aos conselheiros o direito ao uso da palavra, com a gravidade de – com isso – ter inviabilizado o instituto do ‘recurso para o plenário’, um instrumento democrático essencial nas reuniões de tipo Assembleia”.

Numa carta dura, Paulo Colaço acusa Mota Pinto de ter mostrado aos militantes do PSD uma “faceta arrogante, soberba e insolente” que ainda não lhe era conhecido. O membro do Conselho de Jurisdição quer assim que, à luz dos estatutos do partido, “este comportamento seja punido e que a Mesa deixe de ser liderada por quem não a soube honrar”. Colaço lembra ainda que “não precisaria de renunciar ao CJN para atingir esse fim”, e que “podia apenas suspender ou encontrar outro subscritor para a participação disciplinar” que vai interpor em breve. Mas o antigo dirigente da JSD diz que fazê-lo era estar a esconder-se e a criar “uma pressão indesejável aos membros do CJN, que saberiam que eu voltaria ao seu convívio após a decisão, fosse qual fosse”.

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Na mesma carta a Nunes Liberato, Paulo Colaço deixa uma nota pessoal a dizer que “entre o rei [o presidente do partido] e o reino [o PSD]” a sua “lealdade primeira é sempre para com o reino”. No entanto, deixa claro: “Fui, sou e continuarei a ser um apoiante firme e dedicado do dr. Rui Rio“.

Logo no início da carta, Paulo Colaço lembra quem são as suas referências no PSD e Rui Rio é uma delas: “A Comissão Política Nacional da JSD eleita em 1982 incluía Pedro Pinto, Rui Rio, Carlos Coelho e Pedro Passos Coelho, quatro companheiros de quem me sinto herdeiro. Do Pedro Pinto, herdei o desprendimento face a cargos e honrarias; de Rui Rio herdei o valor da ética no exercício público; do Carlos Coelho herdei a importância de uma intervenção política rigorosa e qualificada; do Pedro Passos Coelho herdei o primado do interesse público sobre o interesse pessoal ou partidário”.

É com “o peso desta herança” que Paulo Colaço diz tomar esta atitude por considerar que a desconsideração do Conselho de Jurisdição Nacional “não pode ficar impune nem criar precedente” e que a prova do que se passou é o facto dos membros do CJN terem abandonado o Conselho Nacional. Acusa ainda Mota Pinto, na última frase da carta enviada a Nunes Liberato, de ter transformado “um Conselho Nacional do Partido numa arruaceira RGA dos tempos do PREC.”

No final do Conselho Nacional, onde a sua decisão acabou por ser o fator mais polémico da longa noite, Paulo Mota Pinto disse aos jornalistas confiar na decisão que tomou: “Tenho a consciência perfeitamente tranquila em relação ao que fiz, quer no plano político, quer no plano jurídico”, disse à saída do Hotel Porto Palácio.

Não só porque “os estatutos não preveem competências do conselho de jurisdição, porque um órgão não pode interromper o funcionamento de outro órgão enquanto ele está a decorrer”, explicou o Presidente da Mesa, como também porque “a via de votação seguida foi a mesma via que foi defendida pelo conselho de jurisdição, portanto a votação foi secreta, por deliberação do Conselho Nacional”.

Maioria de apoiantes de Rio no CJN podem salvar Mota Pinto?

Após o último Congresso do PSD, a lista oficial de Rui Rio não tinha maioria no Conselho de Jurisdição Nacional, mas entre as outras listas com direito a eleger conselheiros, havia também vários apoiantes de Rio. Paulo Colaço, por exemplo, seu apoiante desde a primeira hora, encabeçou a segunda lista mais votada. Contas feitas, em 9 membros havia até agora 7 apoiantes de Rui Rio. Apenas dois (um na lista oficial , Paulo Calado) e outro na lista de Paulo Colaço (Cristiana Santos) não tinham apoiado o líder nas últimas diretas. Ou seja: o CJN é composto maioritariamente por apoiantes de Rio.

Ainda assim, houve uma debandada de protesto no último Conselho Nacional. Em nove membros, estavam presentes oito (o presidente Nunes Liberato, estava fora do país). Desses oito, o voto secreto venceu 7-1. Só apenas Emília Cerqueira (a deputada que ficou conhecida por fazer log in com a password de José Silvano) votou a favor de braço no ar. Mota Pinto não aceitou esse parecer nem deixou os membros da Jurisdição falarem e estes acabaram por abandonar a sala em protesto

Paulo Colaço diz que os seus colegas provaram que “independentemente dos seus amores ou desamores, votam com imparcialidade” e, por isso, acredita que vai ganhar a ação e que Mota Pinto vai perder o mandato.  É essa a figura a que Colaço vai recorrer, e não a outras mais gravosas,  por considerar que o PSD é “casa ideológica do Mota Pinto, aliás o seu pai foi líder, mas não pode ser a coutada do Mota Pinto. Não pode ser o rei no seu castelo. Não manda no Conselho Nacional.”

Paulo Colaço vai ser substituído pelo primeiro não-eleito da sua lista, Luís Tirapicos, um jurista de Évora.