Quando Carlos Costa percebeu que a tranquilidade do monte alentejano que comprou a Armando Vara ia ser perturbada pelo ruído de um comboio de alta velocidade (TGV), já era tarde.

Segundo a revista Sábado, que conta na edição desta quinta-feira mais alguns pormenores sobre o caso do monte perto de Montemor-o-Novo, a escritura do imóvel foi feita em julho de 2007, o mês em que a empresa pública RAVE terminou o estudo de impacto ambiental para o troço entre a Moita e Montemor-o-Novo. O atual governador do Banco de Portugal, que na altura vivia no Luxemburgo, chegou a enviar técnicos ao local, mais tarde, que confirmaram que a zona seria muito afetada pelo ruído do TGV — um comboio que não viria a ser construído, fruto da crise internacional, numa decisão de cancelamento que José Sócrates descreveu recentemente como “falta de ambição”.

A Sábado recorda que o monte em causa já tinha estado envolto em polémica por causa de notícias, poucos meses antes. Armando Vara — na altura administrador da Caixa Geral de Depósitos, onde já não tinha a companhia de Carlos Costa — tinha feito a reabilitação da herdade com projetos do diretor que tinha sido nomeado por Vara quando este era ministro da Administração Interna.

Com Carlos Costa a passar a maior parte do tempo no Luxemburgo, terá sido a mulher do governador do Banco de Portugal a dar a ideia de se comprar uma casa de férias. E, como disse Carlos Costa na entrevista à SIC na terça-feira, terão sido “os serviços da Caixa” que não só “identificaram a oportunidade” como trataram de todo o processo — o que, revela a Sábado, envolveu uma procuração passada por Carlos Costa aos serviços da Caixa para que fizessem a compra e a escritura.

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O Observador contactou a Caixa Geral de Depósitos, logo na noite de terça-feira, para perceber em que moldes é que os serviços “identificaram a oportunidade”. Na prática, os serviços sugeriram uma herdade que era propriedade de um dos seus administradores a um cliente, Carlos Costa, que pouco tempo antes tinha saído do banco público para o Banco Europeu de Investimento (BEI). Ainda não foi dada uma resposta ao Observador, por parte das fontes oficiais.

Segundo a Sábado — que não especifica onde obteve a informação — enquanto o processo decorreu, Carlos Costa nem sabia que era a Armando Vara que estava a comprar o monte. Só quando recebeu os documentos do imóvel é que percebeu que tinha comprado o monte ao administrador, hoje preso em Évora para cumprir uma pena de cinco anos no âmbito do processo Face Oculta.

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Na entrevista à SIC, na terça-feira, Carlos Costa disse que não se considera “amigo” de Armando Vara, mesmo tendo comprado o monte no Alentejo já depois de os dois terem deixado de ser colegas de administração.

“Foram os serviços da Caixa que identificaram a oportunidade [de comprar o monte a Vara] e foram os serviços da Caixa que se ocuparam de todo o procedimento de aquisição”, garantiu Carlos Costa, sem explicar por que razão é que o seu gestor de conta, presumivelmente, terá indicado que a compra deste monte poderia ser um bom negócio — sobretudo tratando-se de um gestor de conta que tinha o vendedor (Armando Vara) como seu administrador.

O que não se sabia, até à entrevista dada por Carlos Costa, é que esse monte no Cortiço, Montemor-o-Novo, já teria estado anunciado numa agência imobiliária — e Carlos Costa até decidiu comentar que esse anúncio pela imobiliária até era “5 ou 10 mil euros mais barato”. Ou seja, não terá sido assim tão bom negócio.

Essa revelação terá sido mais uma forma de Carlos Costa se afastar de Armando Vara, que tanto não é seu “amigo” que não lhe vendeu o monte, portanto, a “preço de amigo” — vendeu mais caro do que admitia vender quando inicialmente terá posto o imóvel à venda.

“Não sou amigo de Vara, eu transitei de uma administração nomeada pela ministra Manuela Ferreira Leite, passei por uma administração nomeada pelo ministro Bagão Félix e transitei para uma administração nomeada por Teixeira dos Santos”, ressalvou Carlos Costa.

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