Apenas podem ser gestantes de substituição mulheres que já foram mães, familiares diretas ou uma amiga muito próxima da beneficiária, defendeu o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, que apresentou esta terça-feira cinco alterações à lei da gestação de substituição.
A lei deve impor laços familiares ou de afinidade para minimizar o risco de incumprimento do contrato de gestação de substituição, disse a presidente do CNPMA, Carla Rodrigues, numa audição no grupo de trabalho para a Procriação Medicamente Assistida (PMA) na Assembleia da República.
O conselho já tinha feito esta proposta aquando da aprovação da lei, mas não foi acautelado que “apenas pode ser gestante de substituição a mulher que seja mãe de, pelo menos, uma criança por si gerada” e se “sinta realizada” para “encarar a gestação como um projeto pessoal de outra mulher e não seu, porque o seu já foi realizado”, disse Carla Rodrigues.
A lei deve aplicar-se também apenas “a cidadãos nacionais e a apátridas e estrangeiros a viver em Portugal” para “evitar, de alguma forma, que a lei seja criada e provoque uma afluência a Portugal de turismo reprodutivo”, tendo o conselho “sérias dúvidas que isso seja benéfico para Portugal, para o sistema de saúde” e para a gestação de substituição”.
As restantes propostas prendem-se com a excecionalidade do recurso à gestação de substituição, que só deve abranger casos de ausência de útero, lesão ou doença que impeça definitivamente a gravidez da mulher, e a pré-avaliação da aptidão psicológica da gestante e dos beneficiários.
O grupo de trabalho está a ouvir várias entidades sobre o projeto-lei do Bloco de Esquerda sobre a gestação de substituição – apresentado na sequência do chumbo do Tribunal Constitucional a várias normas da lei -, que prevê que a gestante possa anular o seu consentimento até ao momento de registo da criança.
Para Carla Rodrigues, o projeto do BE suscita “muitas dúvidas, muitas preocupações e muitos receios” sobretudo a norma que prevê o arrependimento da gestante.
“O projeto visa dar um enquadramento legal àquilo que foi o acórdão do Tribunal Constitucional, mas há cuidados e previsões que entendemos que devem constar da lei para proteção não só do instituto da gestação de substituição, mas também para proteção da gestante, dos beneficiários e sobretudo da criança que vier a nascer”, defendeu.
No seu entender, a proposta “padece de alguns vícios”, a que o TC de alguma forma obrigou, que “podem ser minimizados, mitigados” com as propostas apresentadas.
“Depois do acórdão do TC nada poderia ser como dantes e não basta alterar apenas cirurgicamente os artigos” declarados inconstitucionais, é preciso fazer uma intervenção mais abrangente para minimizar estes vícios”, defendeu.
Carla Rodrigues apontou como “primeiro grande vício” a introdução de um desequilíbrio grave na relação entre o casal e a gestante, porque “os direitos da gestante impõem-se sobre os direitos do casal”.
Outro vício é relegar para segundo plano os direitos da criança, cuja identidade genética é desvalorizada se a gestante se arrepender, além da indefinição do seu destino quando nasce e nos dias seguintes.
“A criança durante um período não tem pai nem mãe, não tem um destino definido, isto é pernicioso e inclusive violador da convenção universal dos direitos universais da criança”, salientou.
O terceiro vício é que “a lei como está é potenciadora de conflitos” legais e até pessoais entre a gestante e o casal, em tudo contrário ao princípio que deve estar na essência da gestação de substituição”.
As propostas apresentadas baseiam-se na experiência dos conselheiros, mas também na experiência dos nove processos que deram entrada no CNPMA durante o período em que a lei vigorou e dos quais foi “possível extrair muitas conclusões sobre aquilo que queremos ou não para a gestação de substituição em Portugal”.
“Foi com a experiência destes processos que pedimos ao legislador que atentasse bem nestas restrições que sugerimos para da gestação de substituição”, vincou.