A Polícia Judiciária (PJ) está a utilizar a informação recolhida pelo hacker Rui Pinto, revelou esta quinta-feira o diretor nacional adjunto deste órgão policial, Carlos Farinha, em entrevista à Rádio Observador. O responsável adiantou também que a informação está a ser usada “de acordo com as regras” e que a PJ “tomou iniciativas”.
Portugal está a usá-la. Está a usá-la de acordo com as regras que nos regem, com as regras processuais e com as regras penais”, disse Carlos Farinha, quando questionado sobre se seria benéfico para Portugal utilizar a informação recolhida por Rui Pinto, como outros países estão a fazer.
Carlos Farinha adiantou também que além desta utilização, a PJ também tomou iniciativas relativamente aos dados recolhidos. “Para além de a estar a usar, tivemos iniciativas”, afirmou, sem revelar quais, reforçando: “É evidente que a Polícia Judiciária tomou as iniciativas e seguiu os passos que podia dar e fê-lo com o desafogo e o atrevimento que a situação exigia”.
[Ouça aqui a entrevista à Rádio Observador na íntegra]
O diretor nacional adjunto da PJ defendeu ainda que as regras processuais em Portugal são “suficientes” para a informação recolhida pelo pirata informático possa ser utilizada pelas autoridades portuguesas e garantiu que estão a ser “cumpridas”.
Se hoje há entidades a aproveitaram a informação, também é bom que se saiba que há regras processuais que estão a ser cumpridas, no respeito pelo presunção de inocência e na morosidade necessária que os tribunais têm para que haja uma justiça célere mas não precipitada e justa no final”, disse.
Rui Pinto, de 30 anos, está indiciado pela prática de dois crimes de acesso ilegítimo, dois de violação de segredo, um de ofensa a pessoa coletiva e outro de extorsão qualificada na forma tentada crimes. O pirata informático encontra-se em prisão preventiva desde 22 de março, depois de ter sido extraditado para Portugal, após a sua detenção na Hungria, a 16 de janeiro.
O que pode acontecer a Rui Pinto e aos segredos que estão nos seus computadores?
Com o hacker, veio também para Portugal todo o material informático apreendido no âmbito do processo, na Hungria: computadores, discos externos e telemóveis. As autoridades francesas chegaram a fazer uma cópia destes discos rígidos por receio de que fossem destruídos, em Portugal. No final de março, o Jornal de Notícias avançava que, apesar de colaborar com as autoridades francesas, o pirata informático continuaria a recusar colaborar com as autoridades portuguesas.
Depois de ter sido feita uma análise preliminar a este material, a PJ e o Ministério Público suspeitaram que o hacker teria tido acesso a emails de procuradores e de funcionários da Administração Interna e conseguido obter informações sobre o inquérito de que era alvo. No despacho do DCIAP em que constam as suspeitas, e a que a revista Sábado teve acesso, a procuradora Patrícia Barão pediu a declaração de especial complexidade do processo — que, a ser aceite, poderá traduzir-se num prolongamento do prazo da investigação em mais seis meses.
Conclusões do relatório sobre corrupção estão “desatualizadas” em relação a Portugal
O diretor nacional adjunto da PJ considerou também que as conclusões do relatório sobre corrupção do Conselho Europeu — que colocou Portugal entre os países que não cumpre as recomendações para o combate à corrupção — “pecam por poder estar desatualizadas“. Carlos Farinha defendeu que tem havido um esforço a nível institucional de “inversão da tendência relativamente ao combate à corrupção em Portugal”.
O responsável situa este esforço no combate à corrupção, principalmente nos “últimos anos”, alertando para a “quantidade de iniciativas que tem ocorrido em termos operacionais” e “novas frentes de investigação“. Carlos Farinha não considera que esta mudança de paradigma esteja relacionado com a mudança de Procuradora-Geral da República e fala antes numa “linha de continuidade”.
Há uma consciencialização também acrescida da sociedade. Porque não se investiga sem informação. E é essencial que a informação provenha de quem a tem e que possa ser partilhada e direcionada para os sítios certos”, acrescentou.
O responsável considerou também que as leis são “suficientes” para que a corrupção seja combatida, mas aponta um problema: a falta de meios tecnológicos e também de recursos humanos. “A Polícia Judiciária não tem escondido nos últimos tempos a necessidade de meios. Há falta de meios humanos. Basta dizer que durante 10 anos praticamente ninguém ingressou na carreira de investigação criminal — o que significou não só uma diminuição de meios em termos quantitativos, mas também uma diminuição em termos qualitativos pelo aumento da média etária”, denunciou, acrescentando: “Precisamos efetivamente de recursos humanos em vários domínios: nos domínios da investigação, nos domínios das perícias, mas precisamos também que estejam motivados, formados, atualizados porque os novos desafios não param“.