Meia centena de pessoas concentrou-se esta segunda-feira em frente à Assembleia da República, em Lisboa, numa manifestação antirracista de solidariedade para com a deputada do Livre, Joacine Moreira, alvo de uma petição para não assumir o seu cargo no parlamento.
Numa “organização espontânea” do Coletivo Resistimos, na iniciativa ouviram-se ‘slogans’ como “somos todos filhos de imigrantes. Primeira, segunda, terceira geração” ou “racismo, fascismo, não passarão”, numa concentração “antifascista, antirracista contra a homofobia e contra o sexismo”. “Percebemos que havia algumas injúrias e ataques específicos à Joacine que não eram ataques específicos à Joacine, que eram ataques um bocado mais amplos dirigidos individualmente à Joacine”, disse à Lusa Bárbara Góis, do Coletivo Resistimos, que tem essencialmente pessoas LBGT e imigrantes em Portugal.
Questionada sobre a petição que circula nas redes sociais, já com milhares de assinaturas, para a deputada Joacine Qatar Moreira não assumir o cargo no parlamento para o qual foi eleita nas últimas legislativas, por ter erguido uma bandeira do seu país natal, Guiné-Bissau, quando soube da eleição, e por ser gaga, Bárbara Góis afirmou que essa atitude “é fruto da desinformação”. “É fruto de desinformação por essa petição ser lançada sobre um repto único de que ela [Joacine] teria atentado contra a Constituição portuguesa ao hastear uma bandeira da Guiné-Bissau, que é a sua terra, durante as comemorações quando soube que tinha sido eleita para o parlamento”, declarou a ativista.
Segundo Bárbara Góis, “viram na Joacine e nas comunidades negras o bode expiatório para a situação das pessoas que trabalham em Portugal, que não é culpa direta dos negros, nem dos ciganos nem do pessoal LGBT”. Bárbara Góis lamentou que a deputada, que esteve ausente da concentração, tenha “sofrido na pele diretamente injúrias, especificamente por ser uma mulher negra”, considerando que isso “é fruto do racismo e de uma perspetiva muito colonialista que ainda existe em Portugal”.
A título pessoal, mas também como líder do Livre, Rui Tavares deslocou-se junto ao parlamento para “exprimir a sua solidariedade para com esta causa e também para exprimir gratidão para com os coletivos espontâneos da sociedade civil” chocados “com o tipo de propósitos racistas, insultos e ofensas que, de forma infelizmente bastante numerosa e muito agressiva, choveram contra Joacine Moreira nos dias que se seguiram à sua eleição democrática para a Assembleia da República”.
Para Rui Tavares, tratou-se de “exprimir solidariedade contra o racismo larvar que ainda existe na sociedade portuguesa, mas que é possível erradicar”. Quanto à petição, o líder do Livre lamentou e criticou a sua realização, considerando que é subscrita por pessoas que “precisam de aprofundar a sua cultura democrática para entenderem alguém que foi eleito pelo povo”. “A Joacine, tal como o Livre, é alguém que tem defendido os direitos fundamentais, a democracia, o Estado de direito em Portugal, na Europa e no resto do mundo, e, portanto, merece respeito por parte dos cidadãos portugueses”, vincou.
Renata Chabi, também presente na concentração, disse à Lusa acreditar que “o racismo é estrutural” em Portugal, como o machismo. Para Renata Chabi, “estas desigualdades sociais” de alguma forma “estão inter-relacionadas”.
“Além do mais, para uma mulher negra e ainda gaga, todo este movimento que se criou de apoio, mas também pelo contrário, de oposição não pelo aquilo que são as ideologias da candidata, mas, sim, por aquilo que é e tem como características físicas é uma redução da pessoa àquilo que ela é como embalagem”, considerou, acrescentando que “a política portuguesa precisa mais do que isso e precisa mais do que reduzir uma candidata à sua cor da pele, ao seu sexo e à sua gaguez”.