Portugal já entrou numa “fase de crescimento exponencial da epidemia” da Covid-19 anunciou este sábado Marta Temido, que antecipa que as próximas semanas “vão ser duras”. A ministra da Saúde deixou ainda apelos aos pais e aos jovens — porque “se os comportamentos não mudarem o SNS [Serviço Nacional de Saúde] não vai aguentar”.
Entre novas medidas — como a obrigatoriedade de todos os hospitais receberem doentes infetados ou o adiamento de todas as consultas não urgentes — e apelos — aos jovens e aos pais que queiram deixar os filhos com os avós, Marta Temido e Graça Freitas, diretora-geral da Saúde, traçaram o ponto de situação da epidemia em Portugal. O que muda e o que devia estar a mudar no combate ao novo coronavírus.
Consultas não urgentes canceladas, todos os hospitais disponíveis para receber doentes: as novas medidas anunciadas
O Governo prepara um “redesenho dos fluxos de tratamento” e anunciou um conjunto de novas medidas a aplicar na nova fase de crescimento da epidemia:
Com o aumento do número de casos, vão ser alargadas as situações em que o tratamento da doença vai ser feito em casa. A partir de agora, quando um doente é diagnosticado com Covid-19 e os sintomas forem moderados, é encaminhado para casa — sendo ativada a “hospitalização domiciliária”. No caso de os sintomas serem graves, o doente fica no hospital.
Os chamados hospitais de referência e os de segunda linha vão deixar de ser os únicos a receber doentes infetados. “Todos os hospitais têm de receber doentes Covid-19“, medida que estará operacional a partir de segunda-feira, anunciou Marta Temido.
A capacidade laboratorial para a realização de testes também será alargada, e o Governo equaciona dois modelos: “Testagem em casa quando seja possível ou novos centros só para realização de testes”.
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Também no início da próxima semana, serão canceladas as consultas não urgentes, mantendo-se a assistência a crianças e grávidas, mas “permitindo que o que não é atividade urgente, nesta fase, seja adiado”. Alguns hospitais já estavam a aplicar esta medida, que será agora generalizada a todo o país. “Precisamos que as estruturas concentrem as suas respostas no atendimento à Covid-19. Precisamos de garantir que os profissionais não se esgotam para tarefas que podem ser adiadas“, disse Marta Temido.
Serão alargadas as situações em que os profissionais de saúde têm de usar equipamento de proteção individual.
Os prazos das prescrições a doentes crónicos serão alargados, “para evitar que tenham de ir ao médico” com frequência.
Os profissionais de saúde que terão de trabalhar e que tenham filhos vão poder, como já tinha sido anunciado, deixar os filhos em determinadas escolas. O objetivo é que “ninguém é prejudicado por força da atividade que exerce”. Além disso, o Governo recomenda que, entre dois progenitores, se um deles for profissional de saúde, deve ser o outro a ficar em casa.
O Infarmed recomenda que, nas farmácias, o atendimento seja feito ao postigo (através da janela de segurança), “quando se entenda que é a melhor solução para proteger profissionais”.
Confrontada com relatos de falta de equipamentos de proteção individual nos hospitais, Marta Temido garantiu que “os stocks estão a ser reforçados”. Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, assegurou, por sua vez, que há dois milhões de máscaras de reserva e que também há ventiladores. E que foram ainda feitas aquisições novas, de acordo com as prioridades do ministério da Saúde. “Estamos a construir uma reserva estratégica.”
Para os pais, para os jovens… e para toda a família: os apelos ao “civismo”
“É muito importante que todos colaborem e que as pessoas percebam e transmitam a familiares e amigos que, se estamos num momento de contenção e de apelo a que o isolamento social seja mantido, é uma prática para ser levada a sério. É importante que isso seja respeitado e que espaços que estão a ser encerrados tenham o civismo de colaborar e de se abster de funcionar”, avisou Marta Temido.
Temido fez mesmo um “apelo ao civismo de todos” no combate à doença porque, se isso não acontecer, “o sistema de saúde não vai conseguir responder e a curva epidémica vai continuar a subir“.
Graça Feitas, a diretora Geral de Saúde, deixou apelos para proteger os idosos: pede para se restringir de forma drástica a visita aos idosos nos lares, a população mais vulnerável. Aos pais, alertou: “O recurso aos avós para ficar com as crianças não é uma boa alternativa nesta altura”.
Os idosos são a população mais vulnerável. Queremos que as famílias tenham contenção nas visitas aos lares. Quanto menos contacto houver do exterior para o interior será melhor nesta fase que é difícil e transitória”. E mais: “Pais que têm crianças pequenas, desta vez o recurso aos avós não é uma boa solução porque podem ficar contagiados através destes contactos com os seus netos e familiares”.
Os apelos estenderam-se aos jovens: “sempre que saírem pensem que ao voltarem para casa podem contagiar as pessoas mais velhas da família com quem vivem”. “Não estamos a impor isolamento obrigatório mas há o mínimo de consideração. Porque se um jovem adoecer pode provocar a morte ao seu tio-avô, tia-avó, avó, ou avô”.
Além disso, quem tiver sintomas, “não deve ir trabalhar” e deve ligar à linha Saúde 24.
Em que ponto está o país? O alerta de rutura do SNS
Se estes apelos não forem cumpridos, e “se os comportamentos não mudarem, o SNS [Serviço Nacional de Saúde] não vai aguentar“, dramatizou Marta Temido.
Portugal tem, segundo o último balanço oficial, 169 infetados com a Covid-19. O país está na “fase de crescimento exponencial”, em linha com outros países europeus, e o Governo não sabe quando vai o país atingir o pico.
“Estamos na curva ascendente, não sabemos quanto tempo é que esse movimento ascendente vai durar. Esse comportamento da curva depende da adesão de cada um de nós”, disse Marta Temido, questionada sobre quando Portugal vai atingir o pico da epidemia. “As próximas semanas vão ser duras”, atirou ainda a ministra.
Governo faz levantamento de ventiladores e do número de enfermeiros com formação em cuidados intensivos
Está a ser feito um levantamento junto dos hospitais públicos e privados — e, noticiou o Observador, de hospitais veterinários — do número de ventiladores disponíveis. Está ainda a compilar números sobre os enfermeiros que têm formação em cuidados de saúde intensivos, para que possam ser mobilizados.
Graça Freitas deixou ainda a garantia de que não está a ser dada prioridade de tratamento a doentes com o novo coronavírus. “O que define o acesso é a gravidade do doente”, assegurou. A diretora-geral da Saúde adiantou ainda que a DGS está a receber vários contactos de profissionais de saúde, nomeadamente aposentados, que estão a disponibilizar-se para apoiar no combate ao Covid-19. “As listas estão identificadas”, para depois cada profissional ser colocado num serviço consoante o seu perfil e capacidade.