O pontapé de saída para as negociações sobre o Fundo de Recuperação — a proposta da Comissão Europeia, com 500 mil milhões de euros a fundo perdido e 250 mil milhões em empréstimos — é acompanhado de recados aos chamados países “frugais”, que têm mostrado resistência a uma maior solidariedade para com os países do Sul da Europa no contexto da crise pandémica.

Em conferência de imprensa, depois de ter apresentado o plano ao Parlamento Europeu, Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão, assegurou que a proposta para ajudar a recuperar a economia “é única e excecional”, não representa uma transferência orçamental entre países na UE e não vai levar os estados-membros a emitirem dívida comum — uma das grandes “tormentas” da discussão europeia em torno da crise.

Questionada sobre como é que planeia convencer Áustria, Holanda, Suécia e Dinamarca de que este é o melhor plano para recuperar as economias, a presidente do executivo comunitário citou as reivindicações feitas por estes países, que pedem que o Fundo de Recuperação “não leve a uma mutualização da dívida”, fazendo questão de tranquilizá-los: “Não é o caso” da proposta que a Comissão apresentou esta quarta-feira.

Mas um empréstimo comum, em nome da União Europeia, não é uma mutualização de dívida? Ursula von der Leyen entende que não, sublinhando que os estados-membros “têm um controlo muito claro sobre as partes que lhes cabem”, tanto no que diz respeito às garantias nacionais, no momento de pedir emprestado, como ao pagamento dos empréstimos ao longo das próximas décadas.

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Ou seja — num raciocínio que não é consensual —, a presidente da Comissão entende que o esforço é partilhado, mas não a dívida, porque a cada país cabe uma fatia bem definida.

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No mecanismo de pedido de empréstimos, que é a base para este fundo, “as garantias dos países europeus são dadas na mesma proporção [das verbas] que cada estado-membro dá percentualmente para o orçamento europeu”, sublinha Ursula von der Leyen.

Além disso, “o facto de as verbas serem canalizadas através do orçamento europeu” — com programas em que os estados-membros confiam — e de os pagamentos seguirem “a chave [de distribuição] existente” nesse orçamento, são a prova, para a presidente do executivo comunitário, de que as preocupações dos países “frugais” estão acauteladas.

Ursula von der Leyen diz estar confiante nesta proposta, porque, assentando no orçamento comunitário, “é um conceito completamente novo e um passo em frente”.

“Estamos convencidos de que este é o melhor instrumento que poderíamos escolher para nos vermos livres do velho preconceito e das velhas divisões”, defendeu a presidente da Comissão. “Todos confiam no orçamento europeu, é muito transparente, tem regras bem claras e está cheio de programas que provaram a sua qualidade ao longo do tempo”.

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Estados-membros têm de apresentar planos de recuperação

Ursula von der Leyen lembra ainda que os estados-membros não vão poder fazer o que lhes apetece às verbas atribuídas, tendo em conta que há uma ligação ao Semestre Europeu — em que os governos alinham políticas económicas e orçamentais com as regras europeias. Como os países têm de “apresentar planos de recuperação”, a presidente da Comissão diz estar confiante de que serão executadas as políticas comuns.

Mais: a alocação de dinheiro aos estados-membros, através desses planos de recuperação, “vão ser decididos em conjunto com um grupo de trabalho do Conselho Europeu”.

Von der Leyen diz ainda que partilha com os países “frugais” a ideia de que a despesa seja proporcional às prioridades estratégicas da UE.

Em todo o caso, também salienta que ainda não está fechado se os 750 mil milhões (ou outro valor que seja a ser acertado pelos Governos) serão à base de “subvenções e empréstimos”, como propõe a Comissão, ou só através de um dos mecanismos (“subvenções ou empréstimos”)

E como é que vai ser paga a dívida gerada? A presidente da Comissão adiantou que, entre as opções disponíveis para pagar os empréstimos, prefere “aumentar os recursos próprios” da UE. Estão em causa um novo imposto digital e novos impostos ambientais. “Creio que é do interesse comum na UE criar novos recursos próprios de uma forma que nos permita devolver o dinheiro de forma estável”.

Outra possibilidade passa por devolver o dinheiro através do orçamento comunitário ao longo das próximas quatro décadas, aproximadamente.