O mês de junho marcou o regresso faseado às empresas de muitos dos portugueses em teletrabalho devido à pandemia, mas vários permanecem ainda em casa e as companhias ganharam “novas perspetivas” sobre as vantagens do trabalho remoto.

“Enquanto organização, sem dúvida que o nosso olhar sobre o teletrabalho ganhou novas perspetivas. Tem vindo a ser provado que é possível criar-se novos hábitos de trabalho e que devemos encará-los como uma nova oportunidade”, disse à agência Lusa a ‘Head of HR Business Strategy’ do grupo Jerónimo Martins que, a partir da segunda quinzena de maio, iniciou o regresso faseado aos escritórios centrais dos cerca de 1.000 colaboradores que colocou em teletrabalho.

Segundo Ana Cristina Silva, o grupo pretende agora “dar continuidade a esta reflexão e estabilizar o que vão ser os cenários de teletrabalho fora do âmbito de uma pandemia”, mas está “convicto de que o futuro irá passar por um maior equilíbrio entre trabalho remoto e presencial”.

Atualmente com a capacidade dos seus escritórios ocupada em cerca de 25%, o dono dos supermercados Pingo Doce diz ser “muito provável” a manutenção, “até final do ano”, de “um regime misto (remoto e presencial), com equipas em rotação”.

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Também a Galp, que durante o estado de emergência manteve no terreno – em instalações industriais, postos de abastecimento ou escritórios — “cerca de metade” dos seus trabalhadores, “para garantir a continuidade da operação de infraestruturas críticas para o país”, iniciou em 8 de junho o regresso dos restantes 2.300 colaboradores às instalações da empresa.

Segundo adiantou à Lusa fonte oficial da empresa petrolífera, este regresso está a acontecer “num sistema de três escalas rotativas, de 15 dias cada, implementado nas diversas equipas e direções de todas as áreas de negócio”, de forma que “apenas um terço dos colaboradores esteja fisicamente nas instalações da empresa em cada turno”, mantendo-se os restantes dois terços, rotativamente, em regime de teletrabalho.

Tal como nas diversas outras empresas contactadas pela Lusa, os primeiros grupos a regressar às instalações da Galp foram “os colaboradores sem problemas de saúde, que não têm membros do agregado familiar pertencentes a grupos de risco, que se desloquem em viatura própria ou da empresa e que não tenham crianças com idades inferiores a 12 anos em casa”.

E se o teletrabalho era, já antes da pandemia, “uma possibilidade real e usufruída” para vários dos seus colaboradores, a petrolífera admite que a experiência do confinamento “demonstrou de forma clara que, em determinadas funções, o teletrabalho é uma opção viável e que pode fazer todo o sentido quer para o trabalhador, quer para a empresa”.

A mesma perceção é assumida pela Associação Mutualista Montepio e pelo Banco Montepio, onde decorrem atualmente estudos “para avaliação comparativa das diferentes formas de flexibilizar o trabalho”, com o objetivo de “garantir a motivação” dos trabalhadores e “com ganhos óbvios para as duas partes”.

No Banco Montepio, tal como no Santander e na banca em geral, a rede de balcões manteve-se sempre em funcionamento durante o estado de emergência, embora com novas regras no atendimento presencial, pelo que o teletrabalho se aplicou apenas aos funcionários dos edifícios centrais.

No caso do Montepio, o regresso iniciou-se “em junho, de forma faseada e até um máximo de 25% dos colaboradores no escritório, num sistema de rotatividade”, enquanto no Santander o processo também está a ser progressivo, “em função da evolução da pandemia”, sendo que “até final de junho cerca de 60% dos trabalhadores estarão em regime presencial ou rotativo e os restantes em teletrabalho”.

Fonte oficial da Tabaqueira, uma das maiores exportadoras portuguesas, que tinha colocado a sua equipa do escritório em teletrabalho, adiantou à Lusa que, nesta fase, alguns trabalhadores começarão a regressar às instalações da empresa, mas assume que “o trabalho remoto veio para ficar e que ficou demonstrado que a sua continuidade permitirá um melhor equilíbrio entre o trabalho e a vida privada”.

A capacidade máxima de pessoas no escritório da Tabaqueira é de 30% relativamente à situação pré-covid-19″, acrescentou a mesma fonte, salientando que “os trabalhadores pertencentes a grupos de risco ou com crianças em idade escolar continuarão em teletrabalho por tempo indeterminado”.

Também a Sonae, apesar de ter iniciado “um retorno faseado aos escritórios” em várias empresas do grupo, optou por “uma taxa de ocupação muito baixa nesta fase inicial, mantendo-se a maioria dos colaboradores em trabalho remoto”.

Segundo disse à Lusa a ‘Head of People & Leadership’ da Sonae, Ana Vicente, “já antes desta pandemia o grupo e as suas participadas tinha implementado programas de trabalho flexível” que previam, por exemplo, a possibilidade de trabalhar remotamente quatro dias por mês em semanas diferentes (para funções coadunáveis) ou a redução do horário laboral, sendo o trabalho remoto precisamente “a iniciativa mais solicitada” pelos colaboradores.

Dado o seu perfil industrial, o grupo Altri e a Corticeira Amorim mantiveram a generalidade dos trabalhadores no ‘chão de fábrica’ durante o período de confinamento, apostando fortemente num conjunto de medidas de prevenção, controlo e vigilância da infeção.

Em teletrabalho ficaram apenas os “colaboradores não essenciais ao processo produtivo”, no caso da Corticeira Amorim num total de cerca de três centenas, que gradualmente têm vindo a regressar nas últimas semanas, a partir de maio no caso da Amorim Cork e de junho na Amorim Cork Composites.

Neste momento ainda temos situações de teletrabalho a tempo parcial, seja por questões de segurança, conveniência da empresa ou apoio à família”, disse à Lusa fonte oficial da corticeira, acrescentando que “o ‘terminus’ desse regime ocorrerá em função do evoluir da pandemia”.

Também para a Corticeira Amorim o regime de teletrabalho “demonstrou-se uma ferramenta interessante, útil em determinados contextos e com resultados bastante positivos”, que a empresa “não privilegiará” devido à natureza da sua atividade, mas que admite ter em conta “de uma forma pontual, específica e direcionada”.

O grupo de Mozelos, Santa Maria da Feira, avisa contudo que “o teletrabalho poderá levar muitas empresas – o que nunca será o caso da Corticeira Amorim – a recrutar funções que possam ser asseguradas remotamente em geografias mais competitivas”.

A percorrer as ruas do país mesmo durante o estado de emergência continuaram sempre os carteiros dos CTT, cujas redes de lojas e centros de tratamento e distribuição postal também nunca encerraram portas. O teletrabalho aplicou-se apenas a “cerca de 1.900 colaboradores” dos correios, alguns dos quais se mantêm nesse regime.

Fonte oficial da empresa adiantou à Lusa que “o plano de regresso à normalidade está pensado até setembro para os três grandes universos de trabalhadores — rede de retalho (pessoas que trabalham em lojas), operações (que incluem os carteiros) e serviços centrais e de apoio (que incluem pessoas afetas à sede e a outras instalações no país e que, na sua maioria, foram capazes de realizar o seu trabalho a partir de casa).

Partilhada por todas as empresas ouvidas pela agência Lusa foi a decisão de proibir ou restringir apenas “aos casos de estrita necessidade” a realização de viagens ao estrangeiro pelos colaboradores.

As viagens ao estrangeiro continuam a não ser autorizadas, a não sem em casos excecionais a avaliar previamente”, diz o Banco Montepio, enquanto na Sonae “restrições como a proibição da realização de viagens e participação em eventos apenas serão levantadas quando as avaliações regulares apontarem para que estão reunidas as condições para o efeito”.

Na Corticeira Amorim, “a política de viagens está cancelada até ao período de férias”, sendo que, a partir de setembro, poderão ser retomadas as deslocações “estritamente necessárias”, mas previsivelmente apenas a “15%/20% do ritmo habitual”.

Quanto aos trabalhadores que já regressaram aos seus postos de trabalho nas empresas, estão na generalidade sujeitos a medidas semelhantes de segurança e prevenção do risco de contágio: entrada e saída faseadas das instalações, lotação máxima em elevadores e refeitórios, distribuição de máscaras, luvas e solução alcoólica, distanciamento entre postos de trabalho, separação de espaços com acrílicos, adoção de horários desencontrados e medição de temperatura (nalguns casos obrigatória, noutros facultativa).

Também “desencorajado” por várias das empresas ouvidas pela Lusa é o uso de transportes públicos pelos seus funcionários, assim como as deslocações entre pisos/edifícios, tendo-lhes também sido solicitada a monitorização diária de eventuais sintomas, reforçada a higienização das instalações e, nalguns casos, disponibilizada uma equipa médica e a possibilidade de realização de testes de despiste da covid-19.

Operadoras de telecomunicações cautelosas adotam vários modelos para regresso de trabalhadores

Também as operadoras de telecomunicações estão cautelosas no regresso ao escritório, devido às incertezas da pandemia, adotando modelos distintos, desde regime de teletrabalho até setembro, equipas rotativas ou processo de retorno às instalações faseado, segundo as empresas.

À semelhança do que aconteceu no setor tecnológico, as empresas de telecomunicações foram das primeiras a avançar com o teletrabalho na sequência da pandemia de covid-19, que colocou Portugal em estado de emergência em meados de março.

Agora, no processo do regresso total dos seus trabalhadores ao escritório, são mais cautelosas, até porque não se sabe se haverá uma nova vaga da pandemia.

Para já, os colaboradores da Vodafone Portugal só regressarão às instalações em setembro, altura para a qual a Altice Portugal adiou a quarta fase do seu plano de regresso ao escritório. A NOS avançou em meados de junho com um modelo híbrido de trabalho, enquanto a Nowo/Oni tem os seus colaboradores em teletrabalho e não tem pressa no seu regresso ao escritório.

Contactada pela Lusa, fonte oficial da Vodafone Portugal recordou que, “ainda antes de ter sido decretado o estado de emergência no país”, a operadora tinha implementado, “por tempo indeterminado, o regime de Trabalho em Mobilidade Excecional, abrangendo 96% dos colaboradores, que desde o dia 13 de março passaram a trabalhar a partir das suas casas”, política que “estará em vigor até dia 01 de setembro”.

A mesma fonte acrescentou que, “seguindo as recomendações da Direção-Geral da Saúde, a Vodafone Portugal continua a ter como prioridade máxima garantir a segurança das suas pessoas e evitar a disseminação do vírus”.

O plano de regresso às instalações “resulta de um trabalho minucioso e complexo, o qual envolveu várias áreas da empresa e a auscultação de todos os colaboradores, de forma a garantir que todas as questões de segurança são acauteladas”, sendo que os colaboradores continuarão a exercer as funções em regime de teletrabalho até setembro, com exceção de algumas situações, como por exemplo “as funções críticas operacionais que só podem ser desempenhas ‘in-loco’ [no local]”, aponta.

“Nestes casos, a Vodafone Portugal instituiu a utilização obrigatória e permanente de máscara”, referiu a mesma fonte.

No caso da Altice Portugal, o regresso foi planeado em quatro fases: a primeira, em 18 de maio, com 7% dos colaboradores; a segunda, em 01 de junho, com 25%; e a terceira, em 15 de junho, com “até 50%, mas em regime de rotatividade, traduzindo, na realidade, numa taxa de ocupação média dos edifícios não superior a 30%”, disse à Lusa fonte oficial.

Era expectável que a partir do dia 1 de julho regressassem, potencialmente, todos os colaboradores, mantendo-se o regime de rotatividade e cumprindo o distanciamento de dois metros entre cada posição”, prosseguiu a mesma fonte.

No entanto, “dada a evolução recente da pandemia, optámos por manter a taxa média de 30% de ocupação por edifício e adiar para setembro a quarta fase de regressos”, acrescentou.

A dona da Meo referiu ainda que “continua a ser privilegiada a manutenção no regime de teletrabalho nas seguintes situações: colaboradores com filhos até 12 anos; colaboradores que se enquadrem em grupos de risco — grávidas, doenças cardíacas, oncológicas, respiratórias, entre outros -, e cuja residência se insere numa das 19 freguesias da área metropolitana de Lisboa para as quais foi determinado dever de recolhimento”.

Por sua vez, fonte oficial da NOS recorda que a operadora colocou, “no espaço de uma semana e ainda antes de ser declarado o estado de emergência, praticamente a totalidade dos seus colaboradores em trabalho remoto, ficando no escritório apenas as funções consideradas críticas para dar resposta à continuidade de negócio com os desafios acrescidos colocados pelo contexto”.

O modelo de regresso implementado na NOS é “híbrido”, compatibilizando “o trabalho remoto com o exercício das funções nas estruturas físicas, ou seja, os colaboradores vão regressando, gradualmente, em regime rotativo semanal (uma semana em regime remoto e uma semana nos escritórios)”, adiantou.

Este regresso gradual será implementado ao longo de seis semanas, tendo tido início a 15 de junho, e pressupõe que a taxa máxima de ocupação dos edifícios será sempre inferior a 50%, pois sendo um modelo rotativo nunca estará presente nos edifícios a totalidade dos nossos colaboradores”, acrescentou a operadora de telecomunicações, salientando que os grupos de risco “ficarão em regime de teletrabalho”.

Na Nowo e Oni, todas as equipas que operam nos seus escritórios foram colocadas em teletrabalho “desde o início do estado de emergência, mantendo-se assim até à data”, disse fonte oficial.

“Esta foi uma adaptação que decorreu de uma forma muito positiva e natural não afetando a operação. Dado a forma eficiente como nos adaptámos ao teletrabalho, não é para nós uma urgência o regresso aos escritórios”, acrescentou.

“Estamos a acompanhar de perto a evolução epidemiológica no país, existindo da nossa parte uma preocupação em garantir um regresso aos escritórios da forma mais segura possível, através de um plano flexível, cauteloso e sobretudo bem estruturado. Está em curso uma avaliação dos perfis de risco dos nossos colaboradores em parceria com a Workcare, no âmbito da Segurança e Saúde do Trabalho, e com a finalidade da proteção e segurança do trabalhador e terceiros”, explicou.

“O mesmo será avaliado pelos profissionais de saúde, que irão emitir uma decisão sobre o regresso, ou não, do colaborador às instalações da empresa. Em simultâneo, estão a ser avaliados os meios de transporte e localizações de cada colaborador permitindo-nos igualmente identificar soluções adequadas para cada um dos casos de forma a garantir uma movimentação segura no dia-a-dia de cada um”, concluiu.

Por exemplo, a área de consumo da Huawei em Portugal — que conta com pouco mais de 30 pessoas –, tinha o regresso ao escritório previsto para final de junho e, face aos últimos desenvolvimentos, adiou para 31 de julho.