Começou por ser um processo com oito arguidos, mas, nesta primeira sessão no Campus de Justiça, avançou apenas com dois, sentados lado a lado sob apertadas medidas de segurança (mesmo que um deles esteja em liberdade). O coletivo de juízes responsável por julgar o grupo de portugueses acusado de ter aderido a Estado Islâmico decidiu considerar os restantes seis arguidos contumazes e seguir com o processo em frente.
Cassimo Ture, o arguido que vive no Reino Unido e que trabalha nas limpezas, está em Portugal para o julgamento, mas disse, esta terça-feira, que só vai prestar declarações no final. Já Rómulo Costa disse que queria esclarecer tudo, com o seu advogado a anunciar que o arguido se limitou a ter conversas com os irmãos e que eles sim lutaram na Síria.
No entanto, os esclarecimentos de Rómulo parecem confusos, com o juiz a chamá-lo várias vezes à atenção para ser mais direto no que está a dizer. O arguido nega qualquer apoio, moral ou logístico, a qualquer grupo terrorista, lembrando que teve apenas conversas casuais. E quando um dos irmãos lhe descreve que participou numa batalha em que eram 40 contra 500, Rómulo diz que pensou ser uma “ficção”.
— Estou aqui para dizer toda a verdade, disse a certa altura Rómulo Costa
— Não interessa se está a mentir, mas, de acordo com o que está no processo, há coisas que têm lógica e que não têm lógica, diz o juiz.
O advogado, Lopes Guerreiro, lembra que as escutas que constam no processo e com as quais o coletivo está a confrontar o arguido têm sete anos, pelo que pode haver maior dificuldade em recordar-se das conversas que manteve com o irmão Edgar Costa, um outro arguido no processo cujo paradeiro é desconhecido e foi, por isso, declarado contumaz.
Além das escutas, o juiz confrontou o arguido com o material recolhido na sua casa, entre o qual várias letras de música em que se refere à Jihad. “Jihad significa desenvolvimento pessoal, não tem nada a ver com guerra santa”, justifica o arguido, começando por dizer que nada teve a ver com as letras, para depois admitir que interveio nalgumas delas. Para esse desenvolvimento pessoal, justifica também, é preciso passar por três fases: “a fase astral, a fase biológica e a fase física”, disse, dando uma ideia completamente contrária à que o Ministério Público teceu no despacho de acusação.
Numa outra conversa telefónica com o irmão, após o homicídio de um militar britânico ocorrido, dois dias antes, em Woolwtch, Londres, e que foi reivindicado por uma organização terrorista, Rómulo respondeu: “caiu e hão-de cair mais”. “Peço desculpa, foi um comentário imaturo e irresponsável”, disse numa justificação que não convenceu o juiz. Para depois justificar que é público que estes soldados andam a cometer crimes de violação “ao invés de garantirem a segurança das pessoas”.
O julgamento decorre no mesmo dia da segunda sessão de julgamento do alegado pirata informático, Rui Pinto — um processo que tem medidas de segurança ainda mais elevadas e que restringe o número de pessoas presente no tribunal. Por questões de segurança, o julgamento dos portugueses do Daesh só tem quatro pessoas na assistência, três dos quais jornalistas.
Portugueses no Daesh. Guia rápido para o julgamento que começa esta terça-feira